Título: Delfim reforça PMDB anti-Garotinho
Autor: César Felício
Fonte: Valor Econômico, 14/09/2005, Política, p. A5

Crise Tese do déficit nominal zero vai confrontar programa de governo elaborada por Carlos Lessa

O enfraquecimento da candidatura presidencial do ex-governador do Rio, Anthony Garotinho, dentro do PMDB, é o primeiro efeito da filiação do ex-ministro da Fazenda e deputado Delfim Netto no partido, oficializada ontem. Durante a cerimônia, tanto Delfim quanto o presidente estadual da sigla, o ex-governador Orestes Quércia, afirmaram que o parlamentar irá estruturar um programa de governo para o PMDB, frontalmente divergente do já elaborado pelo ex-presidente do BNDES Carlos Lessa, que está sendo usado por Garotinho como um instrumento para ganhar espaço entre as lideranças tradicionais do partido. Delfim elaborou uma proposta de zerar o déficit nominal das contas públicas, ou seja, fazer com que a arrecadação seja suficiente para o pagamento das despesas do governo e da conta de juros. Pela tese de Delfim, com o déficit nominal obrigatório, o governo seria compelido a fazer um brutal ajuste em suas despesas, abrindo caminho para a redução da taxa de juros. A proposta de Lessa, encampada por Garotinho, aumenta a intervenção do Estado sobre a economia. A presença de Delfim no partido abre caminho para uma candidatura com proposta alternativa à do ex-governador fluminense. "A proposta de Lessa é diferente do pensamento do Delfim e do meu também. Teremos agora outras propostas para conseguirmos uma equação", disse Quércia, ao lado do novo pemedebista. " Espero poder discutir a proposta do déficit zero dentro do PMDB. Uma das coisas mais interessantes no partido é que ele não é sectário e permite várias visões. O PMDB tem que ter um programa inteligente, capaz de gerar desenvolvimento", disse Delfim. Ao ser perguntado sobre nomes que poderiam defender o programa a ser elaborado por Delfim, como candidato do PMDB à Presidência, Quércia citou o governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, o governador do Paraná, Roberto Requião e o próprio Garotinho, nesta ordem. A recepção do PMDB paulista a Delfim foi discreta: não estavam presentes lideranças locais expressivas, como o presidente nacional da sigla, Michel Temer, e o prefeito de Santos, José Papa. Mas hoje Delfim deverá ser homenageado durante a reunião do Diretório Nacional do partido em Brasília. No próximo dia 23, o novo pemedebista já participa de uma reunião em São Paulo para a discussão de programa de governo. Signatário do AI-5 em 1968, ministro da Fazenda nos governos Costa e Silva e Médici e ministro da Agricultura e do Planejamento no governo Figueiredo, Delfim Netto comandou a economia no esplendor e no ocaso do regime militar e teve no PMDB o seu principal opositor político. Nenhum dos economistas tradicionalmente ligados ao partido esteve presente no ato de ontem. Mas o passado de Delfim como adversário histórico do PMDB motivou vários dirigentes a dar satisfações públicas da filiação. "A marca do PMDB sempre foi ser uma grande frente política e social. Nunca fomos homogêneos", disse o ex-ministro do Trabalho no governo Goulart, Almino Affonso. "É importante ter o Delfim. Graças a ele, o País cresceu muito e nós precisamos crescer. Quando ele foi ministro, não discriminava os prefeitos da oposição", afirmou Quércia. "Divergimos no passado, mas nunca fomos inimigos. O Brasil fez a transição do autoritarismo para a democracia com a maior inteligência e com o menor custo possível. Mas enquanto outros países sem o mesmo sucesso no plano político crescem, o curioso é que o Brasil foi incapaz de crescer economicamente", disse Delfim. O deputado desmentiu que tenha trocado o PP pelo PMDB interessado em uma candidatura ao Senado ou ao governo de São Paulo. Garantiu que seu projeto é permanecer na Câmara e ser "soldado raso no PMDB".