Título: Cemig tem problemas com o Luz Para Todos
Autor: Leila Coimbra
Fonte: Valor Econômico, 14/09/2005, Empresas &, p. B9

Energia Companhia tem custo de R$ 9,3 mil por ponto ligado, mas Eletrobrás contribui até o teto de R$ 4 mil

A Cemig, estatal mineira de energia, enfrenta sérios problemas para cumprir o seu cronograma de investimentos no programa Luz Para Todos, do governo federal, que prevê a ligação de de comunidades rurais à rede básica de energia até 2006. Esse projeto conta com dinheiro da União, repassado às distribuidoras estaduais pela Eletrobrás. Mas os valores contratados pela Cemig junto às construtoras Odebrecht, Andrade Gutierrez e Queiroz Galvão é duas vezes maior que a média do repasse feito pela Eletrobrás às outras concessionárias do país. As duas companhias travam uma renegociação dos valores. O presidente da Eletrobrás, Aloísio Vasconcelos, disse que o valor médio nacional utilizado pela Eletrobrás de repasse às distribuidoras é R$ 4 mil por ponto a ser ligado. No caso da Cemig, levando-se em conta as distâncias e o difícil acesso, pode ser aceita uma flexibilização de até R$ 6 mil para cada nova unidade ligada à rede. O presidente do conselho de administração da Cemig, Wilson Brumer, disse que recebeu R$ 3,6 mil por ponto novo na primeira tranche liberada pela Eletrobrás, e agora pede R$ 9,3 mil para cada unidade nos futuros repasses. Levando-se em consideração que o projeto prevê a ligação de pelo menos 140 mil novas unidades ligadas, a diferença dos valores globais é gritante: se o ponto custar R$ 4 mil, a obra sai a R$ 560 milhões; a R$ 6 mil, o total fica em R$ 840 milhões. E, se for de R$ 9,3 mil, a obra somará R$ 1,3 bilhão. Na licitação feita pela Cemig, o orçamento chegou a R$ 1,255 bilhão, o que dá uma média de R$ 8,9 mil cada unidade ligada à rede. "A Cemig é uma ótima parceira e estamos dispostos a flexibilizar e chegar a um consenso. Mas não podemos passar de R$ 6 mil o valor por unidade porque senão comprometeremos o equilíbrio econômico-financeiro da Eletrobrás. O que ultrapassar esse valor terá de ser coberto pela própria Cemig ou pelo governo de Minas Gerais", disse Vasconcelos. O imbróglio envolvendo os valores do Luz Para Todos na Cemig pode atrasar o cumprimento das metas impostas pelo Ministério de Minas e Energia. Caso isso ocorra, a penalidade prevista em lei é a retenção de 10 pontos percentuais do reajuste tarifário da Cemig, previsto para abril de 2006. E a empresa também não terá permissão para receber a segunda tranche dos recursos da Eletrobrás para o programa. Até agora, a União já repassou à concessionária mineira R$ 176 milhões, segundo o site do Ministério de Minas e Energia. Brumer, da Cemig, garante que até dezembro as metas serão cumpridas. "Até o fim do ano, teremos ligado 72 mil novas unidades à rede. Em 2006, outras 104 mil unidades serão conectadas", garantiu. Mas, por conta dos problemas envolvendo o Luz Para Todos, a Cemig já revisou o seu programa de investimentos de 2005. Dos R$ 2,085 bilhões previstos, houve um corte de 22,4%: o total caiu para R$ 1,618 bilhão. O programa receberia R$ 697 milhões da Eletrobrás, mas devido à não conclusão das negociações sobre preços do ponto a ser conectado, o volume passou para R$ 446,9 milhões. Até o momento, a empresa executou apenas 28% do orçamento revisado. A licitação da Cemig envolvendo o programa Luz Para Todos foi polêmica desde o início. Na publicação do primeiro edital, em janeiro deste ano, alguns grupos de menor porte questionaram a maneira como foi conduzido o processo, dizendo que o edital foi montado de forma a favorecer gigantes como Andrade Gutierrez, Odebrecht e Queiroz Galvão. As três acabaram vencendo a concorrência. O edital pedia que a empresa apresentasse receita três vezes superior ao contrato, o que eliminou grupos pequenos da disputa. No primeiro leilão saíram vitoriosas três empreiteiras: CBPO, do grupo Odebrecht, Andrade Gutierrez e Queiroz Galvão. O valor de referência estabelecido pela Cemig na licitação foi de de R$ 1,275 bilhão. Mas as primeiras propostas apresentadas tinham valores 10% acima do teto. A companhia, então, convocou as empresas para uma segunda rodada de apresentação de orçamentos com preços menores. Mas nessa segunda convocação a Cemig chamou apenas as quatro empresas qualificadas no início do processo - as três vitoriosas mais a Camargo Corrêa. Isso deu margem aos questionamentos do Ministério Público, que interpretou a atitude da Cemig como uma restrição à livre concorrência. Nessa segunda rodada, a grande vencedora do leilão foi a Odebrecht, que fechou dois contratos que ultrapassam, juntos, R$ 645 milhões. Além da Odebrecht, a Queiroz Galvão e a Andrade Gutierrez fecharam contratos de R$ 228 milhões e R$ 321 milhões, respectivamente. Quando a licitação iria ser refeita pela terceira vez, a CBPO, que ganhou dois dos quatro contratos oferecidos, conseguiu liminar judicial impedindo publicação de novo edital. A Cemig entrou com recurso contra a liminar, mas este foi negado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.