Título: Grandes projetos chineses ainda estão no papel
Autor: Vera Saavedra Durão e Chico Santos
Fonte: Valor Econômico, 15/09/2005, Brasil, p. A4

Investimentos Visita presidencial a Pequim em 2004 gerou expectativa que não se traduziu em negócios

A expectativa provocada pela visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Pequim, no ano passado, de que a aproximação com a China pudesse tornar viável uma grande parceria nos projetos de infra-estrutura do país em setores estratégicos como petróleo, gás, minério e soja, está se frustrando. Até agora, nenhum dos acordos de grandes projetos firmados nos últimos 12 meses se viabilizou e a lista de investimentos chineses realizados no Brasil é pequena, admite ao Valor Renato Amorim, secretário-executivo do Conselho Empresarial Brasil-China. Os grandes projetos com parcerias articuladas e que, em muitos casos, tiveram acordos assinados na visita presidencial, ainda não saíram do papel. Só os quatro maiores somam investimentos de US$ 7,9 bilhões. Um deles, de US$ 1,5 bilhão, é a parceria da Sinopec com a Petrobras para fazer o Gasoduto do Nordeste que, segundo Amorim, "está sendo reestudada devido ao preço do aço, que encarece muito o investimento". Marcelo Restum, gerente da Petrobras para a implantação do Gasene, disse que as reavaliações não significam "um recomeço total" e sustenta que o gasoduto ligando o Sudeste ao Nordeste do país estará pronto em julho de 2008. Mas um analista que esteve envolvido com o assunto considera difícil que o projeto caminhe com a rapidez desejada, especialmente pela falta de experiência dos chineses. A mesma Petrobras já praticamente sepultou a idéia de fazer associação com os chineses da mesma Sinopec para o ambicioso projeto de construir uma refinaria petroquímica à base de óleos pesados no Estado do Rio de Janeiro. Nesse projeto o desencanto veio da área tecnológica. Os observadores da estatal brasileira que foram conhecer as instalações chinesas voltaram com a impressão que nessa área o Brasil tem mais a ensinar do que a aprender. Outro projeto ainda na gaveta é o da Baosteel, a siderúrgica a ser construída em São Luís, no Maranhão, em sociedade com a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). "A Baosteel está conversando com a Vale, mas o que houve foi mesmo bastante atraso no cumprimento de promessas feitas aos empreendedores pelo Estado do Maranhão", disse Amorim. A construção de uma refinaria de alumina em Barcarena, no Pará, associação da Vale com a Aluminum Corporation of China Limited (Chalco), está em fase de estudo de viabilidade, porém o diretor-executivo de novos negócios da mineradora, Murilo Ferreira, através de assessoria, informou que não sabia precisar quando o estudo ficará pronto, pois os chineses são muito lentos em suas decisões de negócios. Está previsto no acordo entre as partes que o projeto deve entrar em operação em 2007. O mesmo argumento foi usado pela Vale em relação a MinMetals, mineradora chinesa, que assinou com a companhia brasileira um memorando de intenções em 2004 para tocar conjuntamente negócios na área e até agora não se manifestou a respeito do investimento. A Vale considera que o memorando continua válido. O economista brasileiro Maurício Mesquita Moreira, funcionário do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), hoje trabalhando no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), se especializou em estudar as perspectivas dos negócios entre a América Latina e a China. Ele recomenda cautela. "O desafio é ir além de exportar insumos e importar manufaturados." Quanto aos negócios em infra-estrutura com o Brasil, Moreira disse que a China "ainda está aprendendo essa coisa da internacionalização". Segundo ele, os chineses começaram confundindo a América Latina com a África e propondo até o envio de operários para a execução de obras. Amorim, do Conselho Brasil-China, também acha que as perspectivas vão melhorar com o tempo. Ele admite que a morosidade de decisão por parte dos chineses tem gerado um certo clima de pessimismo da parte de analistas que acompanham o comércio entre os dois países. "Há temores de que a China perdeu o interesse pelo Brasil." O executivo procura explicar o fenômeno. De acordo com seu relato, a primeira onda de investidores chineses que aportaram por aqui, no ano passado, estava mal informada sobre o país. A seu ver, porém, houve entusiasmo demais da parte dos brasileiros e um excesso de exposição sobre as possibilidades dos negócios da China no Brasil. "É preciso ter serenidade com relação à China." Amorim, que viveu dois anos em Pequim, adianta que os chineses têm muitos tipos de interesses no comércio com o Brasil e a prioridade é assegurar fornecimento de longo prazo de matérias-primas e alimentos. Por enquanto, segundo ele, "o que se tem de concreto é a entrada de empresas chinesas em segmentos industriais de maior tecnologia, além da abertura de vários escritórios de bancos e empresas chinesas". Recentemente, conta, a Lenovo comprou a divisão de PCs da IBM Brasil. A Huawei abriu uma fábrica em São Paulo. "Seus planos são de aplicar US$ 650 milhões".