Título: Brasil pode perder mercado para os EUA na América Latina
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 04/11/2004, Brasil, p. A-3

Comércio Exterior Acordos bilaterais abrangentes dão vantagem à indústria americana As exportações brasileiras de manufaturados devem perder participação nos mercados da América Latina para os Estados Unidos nos próximos anos. Os países da região estão fechando acordos bilaterais mais abrangentes e concedendo maiores vantagens para a entrada dos produtos americanos do que para os brasileiros. Estudo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone) e da consultoria Rubens Barbosa & Associados analisou o impacto dos acordos fechados pelos Estados Unidos com Chile e México. Em ambos os casos, as preferências tarifárias conquistadas para os produtos brasileiros no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi) foram erodidas pelos acordos com os americanos. O Brasil possui margem média de preferência de 68,5% no Chile por meio de acordo da Aladi. Na prática, isso significa que os produtos brasileiros não pagam 68,5% da tarifa aplicada pelo país. Ao assinar um acordo de livre comércio com os EUA, o Chile concedeu preferência tarifária de 96,3%, bem superior à brasileira. No caso do México, a margem média de preferência do Brasil é de 72,2%, ficando abaixo dos 87,9% garantidos para os EUA pelo Nafta (Acordo de Livre Comércio da América do Norte). Os produtos manufaturados brasileiros estão aumentando sua presença no Chile. As exportações brasileiras totais para o país saltaram de US$ 998 milhões em 1994 para US$ 1,88 bilhão em 2003. A pauta é bastante diversificada: televisores, ônibus, calçados, tabaco e carne bovina, entre outros produtos. Ao contrário da maioria dos países da América Latina, a economia chilena é bastante aberta, com tarifa de importação de apenas 4%. Mesmo assim, a indústria brasileira teme o impacto das maiores e melhores preferências concedidas aos EUA. O acordo entre Estados Unidos e Chile entrou em vigor no início desse ano. "Em um mundo cada vez mais competitivo, qualquer benefício é importante", avalia Rubens Barbosa, presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Fiesp e diretor da consultoria. "O Chile é membro-associado do Mercosul. É estranho que ofereça condições mais favoráveis para os EUA do que para o Brasil", acrescenta. Segundo Barbosa, que já foi embaixador do Brasil nos EUA, a Fiesp insistirá para que o governo renegocie e intensifique os acordos fechados na Aladi, especialmente com o Chile. A entidade também defende a retomada da Alca (Acordo de Livre Comércio das Américas), desde que de forma "eqüitativa e equilibrada". As exportações brasileiras para o México também estão crescendo. Os embarques aumentaram de US$ 1,049 bilhão em 1994 para US$ 2,741 bilhões em 2003. Só que mais de 50% do valor exportado atualmente corresponde a automóveis e autopeças. Isso acontece por conta de um acordo específico para o setor automotivo fechado entre os dois países em 2002. Para automóveis e autopeças, a margem de preferência do Brasil no mercado mexicano chega a 96,6%, bem superior à margem média de 72,2%. Na avaliação de Marcos Jank, presidente do Icone, as exportações brasileiras para o México poderiam ser muito mais expressivas e diversificadas. "Há indícios de que o Brasil sofre desvios de comércio por conta do Nafta", diz Jank. Ele explica que os EUA ocupam fatias expressivas do mercado mexicano com produtos em que o Brasil é altamente competitivo, como açúcar, óleo de soja, alumínio e semimanufaturados de ferro e aço. O especialista lembra também que os Estados Unidos estão negociando um acordo de livre comércio com os países andinos. Resta saber se os resultados comerciais serão melhores que os alcançados pelo Mercosul no recém-celebrado acordo com a Comunidade Andina. Os países que fazem parte da Aladi (Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, México, Peru e Venezuela) compram hoje US$ 4,6 bilhões em produtos brasileiros. Esse valor equivale a 10,1% das exportações totais do Brasil. Os manufaturados predominam na pauta, respondendo por 91,5%.