Título: BC promove corte tímido no juro
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 15/09/2005, Finanças, p. C1

Política Monetária Um ano após iniciar alta da Selic, Copom faz redução cosmética de 0,25

O processo de queda da taxa básica de juros, interrompido em maio de 2004, foi finalmente retomado pelo Banco Central. O Comitê de Política Monetária (Copom) da instituição decidiu ontem reduzir a meta de Taxa Selic para 19,50% ao ano. Desde 19 de maio último, quando foi novamente elevada, a taxa estava em 19,75% anuais. Na avaliação do comitê, a flexibilização da política monetária, pela primeira vez em mais de um ano, "não compromete as conquistas obtidas no combate à inflação". Assim, a decisão de retomar a trajetória de redução foi unânime. De junho de 2003 até abril de 2004, quando a meta de Selic caiu para 16% ao ano, o BC fez vários cortes nos juros básicos da economia. Nas reuniões que se seguiram a partir daí, ou a taxa subiu ou ficou no mesmo patamar. O corte de 0,25 ponto percentual reflete, entre outros fatores, a sensível melhora das expectativas de inflação nos últimos meses. As pesquisas do próprio BC mostram que a mediana das projeções de mercado para a variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em 2005, que chegou a passar de 6%, vem caindo há 18 semanas seguidas. Na última pesquisa, estava em 5,2%, muito próxima, portanto, da meta fixada pelo BC para o índice, que é de 5,1%. A opção do Copom pelo gradualismo - de iniciar o desaperto monetário no mesmo ritmo de 0,25 ponto com que, há um ano, desfechou o ciclo de arrocho -, já estava amplamente "precificado" pelos mercados. Por isso, a perspectiva é de que não devem ocorrer hoje nos vários segmentos ajustes mais drásticos à decisão. A curva futura de juros definida ontem na BM&F estabelecia corte de 0,25 ponto agora, outro no mesmo tamanho em outubro, com aceleração para 0,50 ponto apenas nos dois últimos meses do ano. Essa sinalização deve ser preservada hoje. Alguma mudança só deve acontecer se a ata da reunião de ontem, a ser divulgada no dia 22, indicar. Até lá os economistas irão debater a possibilidade de intensificação do movimento declinante. "Era o que o mercado esperava, mas não era o que o mercado desejava", diz o consultor Miguel Daoud, da Global Financial Advisor. Mas, a partir de hoje, os mercados irão trabalhar com o vislumbre de um futuro menos sombrio, o que abre a possibilidade de um ambiente mais favorável para os negócios. Para o economista-chefe do Banco Pátria, Luis Fernando Lopes, as indicações atuais são de que as quedas serão feitas a conta-gotas. É o que se colhe da última ata do Copom e também das reuniões mantidas pelo diretoria do BC com economistas de instituições no final de agosto. "O BC tende a proceder de forma gradual enquanto monitora a atividade industrial, a demanda e o preço do petróleo. Pode até ampliar a baixa, mas dependendo da conjuntura", diz Lopes. O superintendente do Banco Cruzeiro do Sul, Adolpho Nardy - integrante da corrente minoritária que defendia uma queda de 0,50 ponto percentual - diz que o BC tem "se pautado por uma prudência às vezes exasperante". Para ele, já existem condições para uma baixa mais acentuada, a inflação foi derrotada por uma política monetária correta e eficaz e a economia persiste saudável. "O único cancro econômico atual é esse juro alto", diz Nardy. Na opinião dele, não faz grande diferença uma Selic de 19,75% e outra de 19,50%. "Não sou contra uma política monetária firme quando ela se mostra necessária. Mas não é o caso agora. De qualquer forma, pelo menos o ciclo de baixa já começou, o que é uma boa notícia", diz Nardy. O Cruzeiro do Sul trabalha com Selic entre 18% e 18,5% no final do ano. O presidente do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV), Flávio Rocha, defendeu a reestruturação do Copom nos moldes do desenho praticado no Federal Reserve (Fed) americano. Do Comitê de Mercado Aberto (Fomc) do Fed participam representantes, sem direito a voto mas com influência, da agricultura e da indústria. "Precisamos mudar o mecanismo vicioso de definição do juro. Só assim será interrompido esse processo de transferência de renda da sociedade para o setor financeiro", diz Rocha.