Título: CPI vai pedir indiciamento de 5 pessoas e 2 bancos
Autor: Mauro Zanatta
Fonte: Valor Econômico, 16/09/2005, Política, p. A10

Crise Fruet diz que há provas contra Valério, Delúbio, Genoino, Silvinho e Duda

A CPI Mista dos Correios decidiu pedir ao Ministério Público e à Polícia Federal o indiciamento dos principais personagens envolvidos nas denúncias de pagamento de mensalão no Congresso. O deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), sub-relator de movimentações financeiras da CPI, informou ontem que há indícios contra Marcos Valério de Souza, acusado de operar o pagamento do mensalão; os ex-dirigentes do PT, José Genoino, Delúbio Soares e Silvio Pereira; o publicitário Duda Mendonça e os bancos Rural e BMG. "Há provas de crimes como falsidade ideológica, corrupção passiva e ativa, tráfico de influência e crimes contra a ordem tributária e o sistema financeiro", afirmou Fruet. "Estão todos tipificados". Segundo ele, também estão sujeitos à denúncia todos os beneficiários dos saques nas contas das empresas de Valério que não comprovarem o destino dos recursos, inclusive deputados, assessores e seus parentes, além das empresas que contrataram os serviços das agências publicitárias DNA e SMP&B sem a devida contrapartida de efetivos serviços prestados. A CPI deve contratar uma empresa de auditoria para devassar os contratos das oito agências de Valério com empresas privadas, segundo Fruet. Na lista dos principais clientes privados até agora identificados estão Amazônia Celular, Telemig Celular, Brasil Telecom, Visanet, Usiminas, Fiat, Banco Rural, Norberto Odebrecht, Dinamo Petróleo, Aliança Seguros, Companhia de Seguros Minas Brasil, Riclan, F/Nazca e RS Empreendimentos. Elas alimentaram as contas de Valério com R$ 354 milhões. A CPI também quer investigar as transações das empresas de Valério com as agências de publicidade Ogilvy Brasil, Grottera, Giovanni FCB, Link/Bagg e Giacometti & Associados. No total, elas depositaram R$ 2,9 milhões. Pelas 75 contas das empresas de Valério em nove bancos, passaram R$ 4,938 bilhões em cinco anos, segundo um relatório parcial apresentado ontem. Até aqui, DNA e SMP&B foram as maiores receptoras. Valério e sua esposa, Renilda, movimentaram R$ 73,867 milhões desde 2000. Em 40 mil operações analisadas, a CPI concluiu que não há comprovação para a entrada dessa montanha de dinheiro. "É uma movimentação extraordinária", disse o relator da CPI, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR). A tese dos empréstimos bancários do Rural e do BMG para Valério e Delúbio pagarem dívidas de campanha do PT e de partidos aliados começou a ruir. A análise dos dados preliminares mostra, segundo Fruet, que as garantias desses financiamento foram insuficientes, houve renovações sucessivas e uma movimentação muito superior aos R$ 55,9 milhões alegados por Valério em seus depoimentos. "Não existe empréstimos para o PT ou para Delúbio", afirmou Fruet. "Os empréstimos foram feitos para não ser pagos". A principal conta da SMP&B no Banco Rural pagou os sacadores dos recursos levantados com os empréstimos com 536 cheques, mas ainda falta identificar saques de R$ 5,8 milhões. Por esta conta, foram pagos R$ 260,5 milhões. O sub-relator da CPI afirmou que os financiamentos podem ter tido recursos no exterior como contrapartida. "As operações de ´dólar cabo´ podem significar o pagamento de recursos no exterior por adiantamentos feitos aqui". E deu um exemplo: a conta Dusseldorf, aberta por Duda Mendonça nas Bahamas para receber R$ 10,5 milhões de Valério, recebeu 40 depósitos de diversas contas e bancos. O objetivo, segundo a CPI, era apagar o rastro do dinheiro. A coordenadora-geral do Departamento de Recuperação de Ativos do Ministério da Justiça, Wannine Lima, admitiu dificuldades para investigar a conta. Ao mesmo tempo, a análise de quase três milhões de ligações telefônicas pela CPI dos Correios nos últimos cinco anos revelou uma proximidade entre os principais personagens do atual escândalo do mensalão e seus contatos com a Presidência da República, diversos ministérios, estatais e até mesmo prefeituras. A quebra do sigilo de 3.181 linhas telefônicas indica uma extensa rede de contatos entre 36 pessoas sob investigação. O cruzamento preliminar de dados mostra que partiram 222 lilgações das empresas de Marcos Valério de Souza, acusado de operar o pagamento do mensalão no Congresso, para a Presidência. De lá, a SMP&B Comunicação e a DNA Propaganda receberam 118 ligações no período. "Sem dúvida, eles tinham muito assunto para tratar", ironiza Fruet. Os dados, apresentados ontem, mostram que as empresas fizeram 715 chamadas para diversos ministérios e receberam o retorno de 319 ligações. "Pode ser pelas relações publicitárias, mas chama a atenção", diz Fruet. O ex-deputado Roberto Jefferson recebeu 355 ligações dos ministérios. O ex-funcionário dos Correios Maurício Marinho, pivô original da crise flagrado em vídeo clandestino ao receber propina de R$ 3 mil, fez 22 ligações e recebeu 41. Nas prefeituras, porém, aparece relações muito próximas. A SMP&B, por exemplo, fez 6.779 contatos com os municípios, recebendo outras 3.075 ligações. Valério é acusado na CPI de montar "caixa dois" em campanhas no interior de Minas Gerais. O deputado Geraldo Thadeu (PPS-MG) contou seu caso pessoal envolvendo Valério nesses esquema durante uma das primeiras sessões da comissão. Os dados mostram que a cúpula dirigente do PT e o ex-ministro José Dirceu também tinham ligações com o exterior. O ex-tesoureiro Delúbio Soares fez quatro chamadas e recebeu 17 ligações de fora. O ex-presidente José Genoino ligou 18 vezes e foi contactado do exterior em outras 18 ocasiões. Marcos Valério, suas empresas e sócios também tinham bastante interesse no exterior. Eles fizeram 1.120 chamadas e receberam outras 210 ligações. "Isso é só o começo. Temos outras 108 mil linhas para analisar", anima-se Fruet. Em Belo Horizonte, o empresário Marcos Valério distribuiu ontem à noite nota para contestar as declarações de Fruet. Mais uma vez, Marcos Valério afirmou que fez empréstimos a pedido do PT num total de R$ 55,9 milhões e ressaltou que a quebra dos sigilos bancários demonstram claramente a entrada dos valores relativos aos empréstimos bancários. "Divulgar informações incompletas ou incorretas, baseadas em interpretações subjetivas e fantasiosas só confunde a opinião pública e em nada contribui para o esclarecimento dos fatos", disse, na nota. "Um exemplo disto é tomar valores referentes a movimentação financeira como sendo expressão do faturamento, levando o público a acreditar, equivocadamente, que Marcos Valério e as empresas das quais é sócio têm milhões de reais ilícitos em caixa, o que definitivamente não é verdade." Irônico, o empresário lamentou frustrar aqueles que buscam origens públicas para os empréstimos feitos a pedido do PT. "Os fatos reais se sobreporão às versões criadas por interesses meramente políticos." (Colaborou Ivana Moreira, de Belo Horizonte)