Título: Está na hora da reforma política?
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 16/09/2005, EU & FIM DE SEMANA, p. 3

Conexão Os cientistas políticos Leôncio Martins Rodrigues (à esquerda), autor de 13 livros sobre sindicalismo e partidos políticos, e Rogério Schmitt, analista da Tendências Consultoria Integrada, discutem a possibilidade de uma nova legislação para campanhas po

Valor: Até que ponto a crise política pode adiantar a prometida reforma? Leôncio Martins Rodrigues: Entendo que a crise política, por um lado, traz para o palco a discussão sobre a necessidade de uma reforma política. Mas, por outro, torna mais difícil a sua aprovação, pois a atenção da Câmara está voltada para as CPIs e os partidos que formam a base mais sólida de apoio ao governo (PL, PTB, PP) estão carentes de liderança. Rogério Schmitt: A crise tem contribuído para suscitar, como poucas vezes no passado, o debate sobre a reforma política. Mas, ironicamente, a principal conseqüência da crise até agora é a completa paralisia do governo e do Legislativo. Não há, hoje, condições políticas para aprovar nenhum projeto de reforma a tempo de vigorar nas eleições de 2006. Foto: Fabiano Cerchiari/Valor

Valor: O que não pode ficar de fora da pauta de discussão da reforma política? Rodrigues: Entendo que deveríamos reservar essa designação apenas para medidas que alterem profundamente o que temos atualmente, o fim do sistema proporcional - voto em listas partidárias, por exemplo - e não se limite a uma simples maquiagem, redução do tempo do horário gratuito, por exemplo, do que existe hoje. Entre esses dois extremos, cabe muita coisa. Entendo que, no momento, é melhor não mudar nada e tentar fazer com que a legislação existente seja efetivamente aplicada. Schmitt: A agenda de propostas de mudanças nas leis partidárias e eleitorais, e que se encontra em diferentes estágios de tramitação no Congresso Nacional, abrange cerca de dez itens. São mínimas as chances de que qualquer desses projetos venha a ser aprovado. A meu ver, a maior prioridade da reforma política deveria ser o estabelecimento de mecanismos que estimulassem graus maiores de fidelidade dos políticos eleitos ao voto dos eleitores e também aos seus partidos. Valor: O financiamento público de campanha é um dos pontos polêmicos da reforma. Políticos e analistas dizem que a medida não dará fim às doações privadas. Rodrigues: Provavelmente, têm razão. Mas o financiamento público tem também outros problemas. Um deles é que, se todos os demais fatores forem iguais, tende a favorecer os grandes partidos e a congelar o status quo partidário. Pelo projeto 2679/2003, 85% do total do fundo destinado exclusivamente a campanhas devem ser divididos proporcionalmente ao número de cadeiras ganhas pelos partidos na eleição anterior para a Câmara dos Deputados. Nesse período, o eleitorado pode ter mudado sua orientação de voto, mas a distribuição dos recursos não leva em conta essa mudança. Aliás, não poderia ser de outro modo, porque não se podem conhecer resultados futuros. Um exemplo muito atual: na eleição passada, o PT foi o partido que elegeu mais deputados (91). É provável que fração importante dos eleitores tenha mudado de opinião sobre partido de Lula. Mas o PT continuará ficando com a maior parcela do fundo. Schmitt: O financiamento exclusivamente público das campanhas eleitorais é uma aberração. Em termos simples, deseja-se acabar com o caixa 2, extinguindo-se o caixa 1. A idéia de proibir as contribuições feitas por pessoas físicas e jurídicas às campanhas eleitorais seria certamente inócua, e de fiscalização claramente inexeqüível.