Título: Estado contra o preconceito
Autor: Couto, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 26/04/2010, Brasil, p. 8

SEXUALIDADE

Seminário promovido pela Secretaria de Direitos Humanos discutirá políticas voltadas às comunidades gays em busca de unidade na implementação de ações

Amparado em estimativa segundo a qual cerca de 8% da população brasileira já manteve algum tipo de relação homossexual ¿ de acordo com pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde em 2008 ¿ e no aumento do número de pessoas que se reconhecem como lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBTT), o Estado tem proposto cada vez mais ações voltadas a minimizar o preconceito e a violência contra o segmento. Na tentativa de alinhar as tímidas políticas públicas à essa comunidade, a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República realiza, nos próximos dias 27, 28 e 29, o 1º Seminário Nacional de Gestores e Trabalhadores na Promoção dos Direitos LGBTT. A expectativa é reunir pelo menos 60 gerentes das esferas municipais, estaduais e distrital, além de 200 participantes que militam na causa.

A troca de experiências entre as cidades, os estados e o Distrito Federal é apontada pela coordenadora-geral de Promoção dos Direitos LGBTTs da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Mitchelle Meira, como um dos pilares do encontro. ¿É importante fazer um intercâmbio das ações em todas as esferas. Ver como andam o funcionamento dos centros de referência de atendimento psicológico e jurídico, além de destacar as regiões com maior número de políticas voltadas aos LGBTTs¿, afirma Mitchelle, ao citar o estado do Rio de Janeiro como um dos mais empenhados no tema entre todas as unidades da Federação.

A partir da troca de ideias, a intenção é criar uma rede nacional de gestores, segundo Mitchelle Meira. ¿Apesar de o governo federal ter implantado o programa Brasil Sem Homofobia e alguns estados terem elaborado planos específicos com esse mesmo objetivo, a questão LGBTT no país ainda é frágil. Sem contar que as ações do Executivo não são suficientes para resolver o problema. Precisamos de mais projetos do Legislativo para fortalecer nossa luta e diluir o preconceito¿, explica.

Indicados por prefeitos e governadores, os gestores nas áreas de segurança pública, de educação e de direitos humanos participarão de painéis, palestras e grupos de trabalho cujos temas visam unificar uma pauta na agenda de políticas públicas voltadas à população LGBTT no Brasil. A programação do seminário inclui três encontros: um para trabalhadores no combate à homofobia, outro de gestores de políticas públicas para lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, e um terceiro de núcleos de pesquisa.

Atendimento Presidente da organização não governamental Ações Cidadãs em Orientação Sexual (Acos), com sede em Brasília, Sérgio Nascimento, 25 anos, vai participar do seminário nacional na condição de observador. Em sua opinião, os encontros são importantes na medida em que os gestores possam intervir e melhorar o atendimento dessa parcela da população em delegacias e em escolas, por exemplo.

¿Essa capacitação pode ajudar a diminuir a discriminação que sofremos diariamente em toda as repartições públicas que passamos¿, observa Nascimento. Homossexual assumido desde os 18 anos, o jovem conta que o preconceito é rotina em órgãos do Estado. ¿Os funcionários ficam cochichando sobre nosso comportamento enquanto aguardamos atendimento¿, diz. Morador de Sobradinho, o estudante de administração, que vive com o seu companheiro há quatro anos, já chegou a ser ignorado por vizinhos de seu bloco. ¿É muito ruim você cumprimentar uma pessoa e não receber um retorno por conta de sua orientação sexual.¿

As ações do Executivo não são suficientes para resolver o problema. Precisamos de mais projetos do Legislativo para fortalecer nossa luta e diluir o preconceito¿

Mitchelle Meira, coordenadora-geral de Promoção dos Direitos LGBTTs

Opção sexual quantificada

O 12º Censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), previsto para iniciar a coleta de dados em 1º de agosto, abordará, pela primeira vez, a orientação sexual dos entrevistados. ¿É muito importante para termos uma dimensão da população LGBTT no Brasil, pois os dados que os sexólogos utilizam até hoje têm como base uma pesquisa norte-americana realizada por Kinsey (Alfred Charles) em 1949¿, observa o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Toni Reis.

Apesar de reconhecer a importância da inclusão do assunto no questionário do censo, Mitchelle Meira, coordenadora-geral de Promoção dos Direitos LGBTTs da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, acredita que o resultado quantitativo pode não representar a realidade. ¿A sexualidade é muito subjetiva e, por isso, muitos não assumirão seu comportamento sexual¿, explica. O IBGE deve divulgar os resultados do Censo em dezembro deste ano. (RC)