Título: Troca de partido prejudica base governista
Autor: Maria Lúcia Delgado e Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 19/09/2005, Política, p. A6

Crise Na Câmara, PT pode perder condição de maior bancada para o PMDB e, no Senado, só conta com 30 votos

O Palácio do Planalto, que já tinha dificuldades para aprovar projetos polêmicos no Senado, passou à posição definitiva de minoria ao longo da crise política, e talvez já na nesta semana o PT perca a condição de bancada majoritária na Câmara para o PMDB. Entre os 81 senadores, o governo só conta, com segurança, com 30 votos. Para ultrapassar esse placar, precisa negociar exaustivamente na própria base e com a oposição. Cenário semelhante ocorre na Câmara. Na última votação importante do Senado, a do salário mínimo, os oposicionistas conseguiram derrotar o governo por 30 votos a 27, e cinco abstenções, elevando-o de R$ 260 para R$ 384. Os senadores observam que nos últimos dois meses o governo tem obtido, em média, só 28 votos. Em contrapartida, a ala dos oposicionistas, independentes e insatisfeitos com o governo pode chegar a 47 senadores. Na Câmara, o governo só conseguiu derrubar o aumento dado pelo Senado com a ajuda da oposição. Em compensação, derrotou o Palácio do Planalto ao ampliar a faixa das empresas que podem aderir ao Simples - o que diminuirá a arrecadação -, na votação da chamada MP do Bem. Na sexta-feira, oito medidas provisórias trancavam a pauta. Pior: é real a possibilidade de o governo sair derrotado na eleição do novo presidente da Câmara, na hipótese provável da renúncia de Severino Cavalcanti. A falta de articulação política do governo somada ao desgaste de várias legendas - especialmente do PT - com a crise política explica o crescimento oposicionista no Senado. "O Senado sempre foi uma Casa que exigiu negociações. Conseguimos aprovar projetos ao longo de dois anos e meio com muita conversa. Agora a coisa pode complicar muito com as migrações partidárias. Dependendo desses movimentos, o governo terá uma situação muito mais difícil para aprovar temas importantes", avaliou o líder do PT, Delcídio Amaral (MS), que também deve deixar o partido. Amaral já recebeu convites do PSDB, PFL e PDT. Pode tomar a decisão nesta semana. Atualmente, PFL e PSDB, juntos, têm 30 parlamentares. Os tucanos esperam elevar a bancada para 16 integrantes até o dia 30, quando termina o prazo de mudança partidária para quem pretende disputar o próximo pleito. O PFL, já com uma bancada de 16 integrantes, volta a ter 17 com o fim da licença médica da senadora Roseana Sarney (MA). Os adversários do governo não estão somente nos dois maiores partidos da oposição. A bancada do PDT pode chegar a 5 senadores; há ainda os 2 do PSOL e 8 independentes do PMDB. No PSB, os dois senadores - Antônio Carlos Valadares (SE) e João Capiberibe (AP) - começam a se rebelar isoladamente em votações, questionando posturas do governo. No PT, os senadores Serys Slhessarenko (MT) e Paulo Paim (RS) são os mais aguerridos. O senador Mozarildo Cavalcanti (sem partido -RR), abandonou a base governista e estuda a filiação ao PSDB. No PL, o governo perdeu os apoios de Magno Malta (ES) e Marcelo Crivella (RJ). O posto de maior bancada do PMDB - que pode saltar de 23 para 25 senadores - não dá conforto ao governo. O líder da legenda, Ney Suassuna (PB), confirma que o quadro é caótico. "E não é só por causa da crise política. A crise só expõe a vulnerabilidade do governo. Cada vez mais o governo deixa pendências com os parlamentares, destrata as pessoas. O que sustenta uma base aliada é a expectativa de poder e o bom trato", disse ele. Na Câmara, o PMDB ganha até o fim do mês pelo menos 10 deputados. Devem ingressar na legenda dois governadores: Paulo Hartung (Espírito Santo) e Eduardo Braga (Amazonas). Blairo Maggi (Mato Grosso) também conversa com a sigla, mas há dificuldades locais a ser superadas. Cada governador deve levar pelo menos um ou dois deputados federais. Os técnicos do PMDB fizeram um balanço do pagamento das emendas parlamentares que deixou o partido ainda mais desgostoso. Do total de R$ 1,1 bilhão das emendas, o governo só empenhou 6% e pagou 0,36%. O PMDB recebeu menos que o PFL no Senado. Na Câmara, os pemedebistas ficaram em desvantagem em relação ao PCdoB, PTB e outros. "E aí vai ficando todo mundo magoado" explica Suassuna. "Na Câmara, a situação é muito pior para o governo, porque as forças estão vagando. Ninguém sabe quem manda em qual partido da base", ironizou o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM). Com 87 deputados, o PMDB deve se tornar a maior bancada pelo ingresso de novos parlamentares e com a provável defecção de deputados do PT desgostosos com o resultado da eleição de ontem para a renovação da cúpula partidária. Até 20 deputados podem sair. "O PMDB manterá a postura da governabilidade. Aprova os projetos de interesse do país e rejeita os que forem contrários", diz o presidente da legenda, Michel Temer (SP).