Título: Câmara: quase parando
Autor: Medeiros, Luísa
Fonte: Correio Braziliense, 26/04/2010, Cidades, p. 25

NOVO GOVERNO

Com a crise aberta pela Operação Caixa de Pandora, o Legislativo acumula mais de 500 projetos. A lentidão agrava-se com a mudança de comando no Buriti e a proximidade da campanha eleitoral

A dois meses do início oficial da campanha para as eleições de outubro, os deputados da Câmara Legislativa devem manter em plenário o mesmo ritmo lento de trabalho incorporado desde que estourou a Operação Caixa de Pandora, em novembro do ano passado. A tensão pré-eleitoral, que paira na Casa, pode emperrar mais ainda a extensa pauta de votações, que hoje acumula mais de 500 projetos parados.

Os assuntos prioritários que deverão ser tratados no próximo bimestre nem sequer foram definidos pelos líderes partidários. Um dos motivos da letargia é a nova troca de comando do Palácio do Buriti. A mudança trouxe uma indefinição nas correlações de forças na Câmara, que aguardam uma agenda do Executivo para se reposicionarem politicamente.

O atual Governo do Distrito Federal só pretende elaborar a agenda depois de concluída a análise de todos os projetos de autoria do Executivo em tramitação na Câmara. O governador Rogério Rosso (PMDB) determinou que uma equipe técnica da Secretária de Planejamento, Orçamento e Gestão tenha conhecimento e controle das proposições, principalmente daquelas que envolvem recursos públicos. Existem propostas do Executivo que tiveram seu valor inicial triplicado devido às emendas parlamentares.

¿Tirar (os projetos), não tem problema. Depois, se quiser, pode pedir para retornar à pauta. Mas acho que o governo tem que construir logo um apoio possível para votar os projetos dele. Mandar o time de choque para cá votar as matérias¿, disse o presidente da Câmara, Wilson Lima (PR), que até o último dia 16 era o governador interino do DF.

Para Lima, o ¿abacaxi mais grosso¿ foi descascado por ele, enquanto esteve à frente do Palácio do Buriti. ¿O aumento salarial (dos servidores) eu que enfrentei¿, lembrou, dizendo que agora Rosso tem que tocar as obras que estão em andamento e precisam ser inauguradas, como as Vilas Olímpicas. O deputado defende que a prioridade na Câmara, para os próximos dois meses de legislatura, seja a aprovação dos créditos orçamentários e das possíveis alterações que o Executivo poderá fazer na estrutura governamental.

O líder do DEM, Paulo Roriz, criticou a retirada dos projetos do Executivo da pauta. ¿São mais de 150 propostas¿, ponderou. O neo-oposicionista disse que a Câmara aguarda as decisões do GDF para poder andar. ¿Estamos preparados para executar todos os projetos que cabem a nós. Mas o Executivo tem que fazer a sua parte¿, disse. Pertencente à base aliada, o deputado Aylton Gomes (PR), líder do extinto bloco Republicano Progressista, aposta na retomada do funcionamento normal da Casa. ¿A crise está sendo espantada. A eleição indireta foi legítima. Os deputados têm disposição para retomar as votações¿, disse, sem revelar, no entanto, quais serão os assuntos prioritários para os próximos 60 dias. A reunião para decidir a manutenção do bloco deve ocorrer esta semana.

Sem liderança O governo ainda não tem um líder na Casa. A tarefa de representar o governador Rogério Rosso é considerada vulnerável, em ano eleitoral, para qualquer deputado da base de sustentação. Caso o novo comando tenha algum tipo de desgaste, o problema pode migrar para a imagem do distrital. Dependendo dos planos do parlamentar, a posição pode ser um tiro no pé. Durante as gestões de Wilson Lima e de Paulo Octavio (sem partido), o GDF não teve um líder na Câmara. Nenhum distrital queria o cargo.

A desarticulação da base e da oposição ao governo e ainda a indefinição dos blocos parlamentares também podem contribuir para um baixo desempenho do Legislativo distrital. Nas duas sessões ordinárias da semana passada, não houve votação por falta de quorum. A tendência é que a presença de deputados seja cada vez mais rarefeita. ¿Os trabalhos ficam estagnados até o novo governo se posicionar. Além disso, tem a ameaça do pedido de intervenção federal, que poderá ser julgado nas próximas semanas. A Câmara sofre influências internas e externas que refletem nas atividades parlamentares¿, ponderou o líder do PT, Paulo Tadeu. A tendência, segundo o distrital, é que a atuação parlamentar seja cada vez mais enxuta, e que a Câmara fique mesmo voltada para o ano eleitoral. ¿Só as prioridades do Executivo deverão ser votadas¿, prevê.

Nos bastidores, comenta-se que a crise política atrasou a preparação da campanha eleitoral deste ano, no âmbito do Legislativo. ¿A agenda deste ano em comparação a outros períodos eleitorais está atrasada. Em outra situação teria uma ação maior dos parlamentares. A crise acabou gerando uma série de indefinições¿, avaliou um assessor parlamentar da Câmara Legislativa. ¿Mas, depois das convenções em junho, ninguém segura os distritais. Eles vão estar concentrados na campanha¿, disse.

Nove projetos Desde o retorno aos trabalhos deste ano, os deputados aprovaram apenas nove projetos, todos de autoria do Executivo. As propostas concederam reajustes salariais a servidores de carreira, créditos suplementares ao orçamento, autorização de crédito no BNDES para o Veículo Leve sobre Pneus (VLP), liberação da bandeira dois para os táxis, nas corridas até o Aeroporto Internacional de Brasília, e a regulação do quiosques e dos puxadinhos.

Para o deputado José Antônio Reguffe (PDT), os projetos de autoria parlamentar deveriam ganhar prioridade na Casa nos próximos meses. ¿Não acho que tenhamos que aprovar os 500 projetos em tramitação. Quantidade não é qualidade. Mas a Casa deve priorizar os projetos ou fazê-los serem discutidos no plenário¿, defendeu.

Memória 570 projetos na prateleira

Desde o início da Operação Caixa de Pandora, iniciada em novembro do ano passado, os deputados da Câmara Legislativa estão mergulhados no escândalo que desestabilizou a classe política no DF. Parte deles na condição de protagonistas da crise e o outro grupo pressionado a punir os colegas citados no Inquérito nº 650, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Destes, apenas Eurides Brito (PMDB), flagrada colocando maços de dinheiro na bolsa, continua respondendo a um processo de quebra de decoro parlamentar. A defesa dela alegou que o dinheiro foi um pagamento de reuniões políticas, na campanha de 2006, realizadas em favor do então candidato ao Senado, o ex-governador Joaquim Roriz (PSC). Hoje, o Legislativo acumula uma pilha de 570 projetos de lei prontos para serem votados em plenário, mas que estão fora da pauta em função do escândalo. Em alguns casos, a demora pode causar prejuízos milionários ao andamento de projetos que interessam aos moradores da cidade, como as obras de integração do transporte público.