Título: Lula decide interferir em sucessão na Câmara
Autor: Maria Lúcia Delgado e Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 22/09/2005, Política, p. A7

Crise Planalto tende a apoiar Aldo Rebelo, mas PT decide lançar Arlindo Chinaglia e pode reeditar cisma

A crescente articulação oposicionista para tomar a presidência da Câmara despertou uma reação - aparentemente tardia - de governistas ontem. Ao contrário da eleição de 15 de fevereiro deste ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu interferir diretamente no processo eleitoral, ao avaliar que a escolha refletirá a queda de braço entre os principais protagonistas da sucessão presidencial de 2006. A negociação caminhava para a formalização de uma candidatura que agrade à base aliada e possa atrair os votos do PMDB. A principal alternativa é a do ex-ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo (PCdoB-SP). O maior obstáculo para o acerto da costura governista é exatamente o PT. O partido decidiu ontem apresentar o nome do líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (SP). O fato é que, hoje, todas as candidaturas serão postas à mesa para negociação coletiva. O primeiro passo do governo foi tentar a retirada da candidatura do deputado Michel Temer (SP), presidente nacional do PMDB. Para tanto, o Planalto recorreu ao presidente do Senado, Renan Calheiros. Em almoço com Temer, ontem, Calheiros analisou o cenário e ambos concluíram que seria necessário juntar forças para evitar a vitória do PFL e PSDB na Câmara. Temer avisou que só leva adiante a candidatura se vier a contar com o aval do governo e do PT. Com isso, espera atrair parte da oposição que não estaria tão monoliticamente fechada com José Thomaz Nonô (PFL-AL), candidato do bloco PFL/PSDB. Sem tais garantias, Temer desiste. Para entrar no jogo, o PMDB lançou ontem a candidatura de seu presidente. "O ideal é que tenhamos um candidato com ampla maioria da Casa e com um perfil institucional, de serenidade e equilíbrio", disse Renan. O presidente do Senado desenha um perfil que se encaixaria perfeitamente na candidatura de Aldo Rebelo, assim como na de Temer. A avaliação, no governo, é que uma candidatura só sairá vitoriosa se tiver o apoio do PMDB. O ex-ministro seria o candidato da base de melhor trânsito com o partido. Os laços com os pemedebistas, especialmente com Renan Calheiros, se estreitaram quando Aldo era o coordenador político do governo. Já na condição anterior de líder do governo na Câmara, o comunista era um dos principais defensores da necessidade de ampliação de espaço do PMDB no governo. O pulo do gato para consumar a candidatura Aldo, planejavam os governistas, seria no momento em que o nome escolhido pelo PT procurar o apoio da base. É praticamente consenso na Casa que um nome petista não sairá vitorioso e, provavelmente, espantará os votos pemedebistas. A apreensão do governo com uma vitória da oposição é compreensível. Na noite de terça-feira, alguns dos principais dirigentes tucanos - Aécio Neves, Geraldo Alckmin, Lúcio Alcântara, Tasso Jereissati, Alberto Goldman e Bismarck Maia - reuniram-se em Brasília para discutir com a bancada do PSDB o cenário político e as implicações do jogo sucessório na Câmara. Os governadores do partido avalizaram o apoio a Nonô, apesar de o PP ter apresentado a candidatura do ex-ministro Francisco Dornelles (RJ). O deputado é tio-avô de Aécio Neves. O mineiro elogiou a candidatura de Dornelles durante o jantar, mas deixou claro que seguiria uma posição majoritária da legenda. Já a turma paulista, liderada por Alckmin, rejeitou a candidatura por considerar que a oposição deve aproveitar as fragilidades políticas do momento para controlar a Câmara. O nome de Dornelles chegou a ser levado a Lula pelo ex-presidente da Câmara Severino Cavalcanti. O PP avalia que a vitória de Dornelles seria possível com um aval do governo e os votos do PT - a mesma lógica de Temer. Além disso, Dornelles poderia dividir o PSDB, uma vez que foi ministro de Fernando Henrique Cardoso. A oposição também conta com a candidatura de Dornelles. Numa intrincada estratégia, o PFL acredita que o ex-ministro racha os votos do PP, impedindo que a sigla apóie, em peso, o líder do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP). A candidatura do petista ganhou força ao longo do dia com o auxílio do líder do PP, José Janene (PR) e de deputados do PL, personagens do suposto esquema do mensalão, investigado pelas CPIs. Enquanto novas candidaturas apareciam na Casa, o PT insistia na tese de que não apresentar um nome próprio seria uma espécie de "capitulação", ou seja, um sinal claro de derrota antecipada da maior bancada da Casa. Além disso, o partido fez de tudo para retirar Aldo do Palácio do Planalto e herdar o posto de "articulador político" com vistas à eleição de 2006. Em reunião, à noite, decidiu-se pelo lançamento de Chinaglia. A cúpula petista acredita que, num quadro fragmentado da eleição, teria chances de disputar um segundo turno com a oposição. A falha da teoria, brincavam ontem deputados na Casa, é que Chinaglia poderia se transformar numa espécie de "Greenhalgh 2". O deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), disputou o segundo turno com Severino Cavalcanti e teve uma derrota acachapante. Mesmo que a base caminhe para um consenso em torno de Aldo Rebelo - o que até ontem parecia improvável -, os parlamentares já trabalham com um inevitável segundo turno. O PTB, por exemplo, já mandou avisar aos principais líderes políticos da Casa que não há chance de retirar a candidatura de Luiz Antônio Fleury Filho (SP). "A nossa decisão é de independência. Se apoiássemos um candidato da base ou da oposição, deixaríamos de ser independentes", argumentou Fleury. Já no PSB, o candidato de maior visibilidade, o ex-ministro Eduardo Campos (PE), disse ontem a Aldo Rebelo que ele é quem tem mais condições de vencer a batalha com a oposição. "Eu vou disputar uma eleição majoritária em Pernambuco e assumo a presidência do PSB em dezembro", teria dito ele, segundo deputados, demonstrando que Aldo executaria melhor a tarefa, além de ter uma interlocução privilegiada com o PMDB.