Título: Editoras trocam conteúdo por mais lucro
Autor: Sérgio Bueno e Daniela D'Ambrosio
Fonte: Valor Econômico, 04/11/2004, Empresas, p. B-4

Livros Produtos mais baratos e diversificação de pontos-de-venda são estratégias para ganhar mercado O mote "livro bom é livro que vende" virou regra no mercado editorial brasileiro. Títulos com excelentes conteúdos, mas que não trazem receita, estão sendo descartados pelas editoras. O preciosismo perde lugar para a realidade imposta pelos números - a venda de exemplares saiu de 410 milhões de exemplares, em 1998, para 255 milhões no ano passado, uma queda próxima a 40% em cinco anos. "Não temos mais margem para errar com livros que dão prejuízo", diz Bernardo Gurbanov, vice-presidente da Câmara Brasileira do Livro (CBL). Com a expectativa de manutenção das vendas neste ano e pressionadas pelo interesse crescente das companhias internacionais no mercado local, as editoras estão buscando caminhos alternativos para ficar acima da média do setor e crescer. As estratégias incluem desde a oferta de produtos mais baratos para quebrar a mais reconhecida barreira ao acesso à leitura no país - a falta de renda dos consumidores -, até investimentos mais pesados em propaganda e diversificação dos pontos de venda. A gaúcha L&PM, por exemplo, prevê um crescimento de 30% nas vendas de livros de bolso neste ano, para 1 milhão de exemplares, graças à utilização de pontos de venda pouco convencionais, explica o diretor Paulo de Almeida Lima. São 2,5 mil espalhados pelo país -10 novos a cada semana -, desde as livrarias, que representam 60% do total, mas também bancas de revistas, farmácias, lojas de conveniência em postos de gasolina e até padarias e açougues. O preço também ajuda. Os chamados "pockets" são menores, custam até 70% menos do que os livros convencionais e representam 77% das vendas da editora, que coloca no mercado de cinco a seis novos títulos por mês. Lima e representantes de outras editoras como Sextante, Ediouro, Melhoramentos e Bertrand Brasil reuniram-se na semana passada, em Porto Alegre, antes da abertura da 50ª Feira do Livro, para discutir formas de alavancar o mercado do setor no 32º Encontro Nacional de Editores e Livreiros. Para a Câmara Brasileira do Livro, responsável pelo congresso, as vendas em 2004 devem interromper o ciclo de queda e se equiparar às do ano passado, na faixa de 255,8 milhões de exemplares. Mesmo assim, já é um bom resultado pois, em 2003, o volume comercializado havia recuado 20% em relação a 2002, avalia a entidade. No ano passado, o faturamento das editoras brasileiras chegou a R$ 2,3 bilhões (ante R$ 2,1 bilhões no anterior), e o das livrarias, a cerca de R$ 1 bilhão, calcula a Câmara. Do total, as compras governamentais de livros didáticos responderam por 110,8 milhões de unidades e uma receita de R$ 455,5 milhões, com queda de 32% e crescimento de 19%, respectivamente, sobre os números de 2002. "O livro sofre efeitos do fator estrutural, que é a pequena quantidade de livrarias e bibliotecas, do fator cultural, com o baixo acesso à leitura, e do fator econômico", afirma Marino Lobello, vice-presidente da CBL. A carioca Sextante, focada nos segmentos de espiritualidade e auto-ajuda, emplacou o fenômeno de vendas do ano, "O Código Da Vinci", com 250 mil exemplares comercializados desde março e agora está trabalhando para manter o novo patamar com outros lançamentos. O principal é "Anjos e Demônios", do mesmo autor do "Código" (Dan Brown), que saiu na última semana com uma primeira edição de 160 mil exemplares. "Tentamos nos posicionar no mercado como uma editora de livros acessíveis no preço e no conteúdo e um pouco mais agressiva em marketing do que a média do mercado", explica o diretor executivo Marcos da Veiga Pereira. Ele espera um incremento de até 20% este ano nas vendas. A paulista Ediouro, que trabalha no segmento de "interesse geral", prevê um crescimento de 15% a 20% este ano e, para 2005, já planeja aumentar o número de lançamentos de oito para 14 por mês, adianta o diretor editorial e de marketing, Heitor Paixão. Embora não tenha trabalhado com nenhum "best seller" neste ano, as vendas médias têm garantido o alcance "rápido" do ponto de equilíbrio de cada edição, explica o executivo. Em novembro, a Ediouro também fará o relançamento da editora Agir, adquirida em 2002, com uma linha de novos autores mesclada com nomes tradicionais como Ariano Suassuna e Lima Barreto e clássicos como "O Pequeno Príncipe". A editora Melhoramentos, especializada em livros infantis, ilustrados e dicionários, prevê uma expansão de 12% nas vendas este ano, para cerca de 8 milhões de exemplares, informa o presidente do conselho de administração, Alfredo Weiszflog. De acordo com ele, a empresa optou pelos livros de "baixo custo" e não deixou de crescer nos últimos cinco anos. As livrarias, que há dez anos concentravam 80% das vendas totais da empresa, hoje respondem por uma parcela de 50% e o restante divide-se entre supermercados, que trabalham com as linhas mais baratas, e o segmento "porta a porta", explica o empresário. Para 2005, a Melhoramentos espera uma expansão de mais 5% a 6% porque o mercado não deve manter o mesmo ritmo deste ano e as próprias compras governamentais, que respondem por menos de 20% dos negócios da empresa, devem entrar no ciclo de baixa. Na Bertrand Brasil, que pertence ao grupo Record, uma das estratégias é aumentar a participação de autores nacionais no catálogo de livros de ficção e não-ficção. "Começamos a reverter os resultados negativos no segundo semestre deste ano e, em 2005, pretendemos alcançar o equilíbrio", explica a diretora editorial Rosemary Alves. Com oito novos títulos por mês no mercado, a editora lançou recentemente o "Decifrando o Código da Vinci", de Simon Cox, com uma tiragem inicial de 10 mil exemplares e, desde lá, já saíram mais duas edições de 5 mil cada. Segundo Rosemary, neste ano as vendas da empresa devem ser "bem maiores" do que em 2003.