Título: BC soube logo que o banco estava quebrado
Autor: Altamiro Silva Júnior
Fonte: Valor Econômico, 22/09/2005, Finanças, p. C3

Falência do Santos Vânio Aguiar conta os bastidores do trabalho de 10 meses à frente da instituição de Edemar

Quando chegou à sede do Banco Santos, às 21h30 do dia 12 de novembro do ano passado - dia em que o Banco Central anunciou a intervenção na instituição de Edemar Cid Ferreira -, o interventor Vânio Aguiar, 54 anos, funcionário de carreira do Banco Central desde 1984, encontrou um então diretor do Santos de plantão. O executivo pediu uma cópia do documento de intervenção para colocá-lo em um quadro. "Ele disse que se sentia aliviado. Havia passados noites sem dormir, à espera do dia da intervenção", disse Aguiar, que recebeu o Valor para uma conversa sobre os bastidores da intervenção. Aguiar, catarinense de nascimento, mas paranaense por opção, passou 10 meses e 8 dias à frente do Banco Santos, antes de ser nomeado seu administrador judicial anteontem, dia em que foi decretada a falência do Santos. Ele contou que sua equipe descobriu nos primeiros 20 dias uma planilha que mostrava as operações irregulares feitas por Edemar e que em 45 dias chegou à conclusão que o banco estava mesmo quebrado. Os momentos mais tensos foram nas reuniões com os cotistas dos fundos de investimento. "As pessoas compareceram em massa". Aguiar dividiu o tempo que passou em São Paulo entre Brasília e o Paraná, onde está sua mulher e três filhos - uma advogada, um oficial do Corpo de Bombeiros e uma estudante de administração. Aguiar conta que chegou a trabalhar 10 horas por dia, mas não dispensou um teatro e um cinema. Abaixo, os principais trechos da entrevista concedida na Santos Asset Management, onde ainda trabalham 100 funcionários do banco. Na sala de Aguiar, os móveis são de Edemar. Valor: : Como foram os primeiros dias no banco, logo após a intervenção ser anunciada? Vânio Aguiar Logo no dia 15, um feriado, fizemos uma reunião com 25 pessoas que vieram nos assessorar na primeira fase de intervenção, formada por funcionários do Banco Central, da ativa ou aposentados, alguns trabalharam em outras liquidações. Nesta reunião traçamos a estratégia. Valor: É verdade que o Sr precisou contratar até um engenheiro. Vânio Aguiar A contratação ocorreu porque, logo que entramos no banco, um engenheiro veio me dizer que o prédio (ao lado da sede, onde funciona o centro de tecnologia do banco) ia cair. Leigo no assunto, contratei um assistente que rapidamente entendeu a situação. Há uma ação solicitando a demolição do prédio pela precariedade da sua estrutura. Valor: Qual foi o trabalho mais complexo neste período? Aguiar Foi com a área de gestão de recursos, que nos demandou muito tempo de atenção porque era onde se concentrava o maior número de credores, sobretudo pessoas físicas. A partir de 20 de dezembro, começaram as assembléias, que foram de alto risco por causa do número de participantes, que estavam ansiosos em saber o que aconteceu com o seu dinheiro. Valor: E quando o Sr percebeu que a situação do banco estava realmente ruim? Aguiar O fato de localizarmos dentro do banco a planilha de reciprocidades foi uma fator decisivo. Isso foi logo nos primeiros 20 dias, conseguimos localizar esse tipo de controle interno, do caixa 2, das operações não contabilizadas. Até para se sonegar informações de terceiros você é obrigado a manter algum tipo de controle (risos). Valor: E o passivo? Quando se chegou ao número final? Aguiar Em 45 dias conseguimos levantar todo o passivo a descoberto. O motivo da intervenção foi a ausência de informações deste tipo. Foi quando entramos no banco que tivemos acesso ao modus operandi. Quando tivemos o passivo a descoberto fechado, apresentamos estes números ao BC e em seguida ao controlador, por meio da Valora (consultoria contratada pelo Banco Santos). A liquidação poderia ter vindo logo após. Mas, como havia um processo de recuperação proposto pelo controlador e em que os credores também tinham interesse, o processo de intervenção foi estendido. Valor: E qual foi a reação do controlador quando soube do tamanho do rombo? Aguiar Nesta apresentação ao controlador, não houve qualquer contestação em relação ao valor. Chegamos a falar em ajustes globais de até R$ 3,5 bilhões. Não houve aparentemente nenhuma surpresa do controlador por parte destes números. E foram estes números que foram usados pela Valora para negociar com os credores. É claro que o processo não foi para a frente porque os credores avaliaram que havia um risco muito elevado em alocar recursos novos. Valor: O que o Sr acha da crítica feita ao BC na época da intervenção de que o banco demorou muito para intervir no Santos. Aguiar Não há nenhum episódio de entrada do BC em uma instituição financeira que não seja considerada pelo controlador como cedo demais e pelos investidores como tarde demais. Valor: E as declarações de Edemar, que responsabilizou o BC pela quebra do banco? Aguiar Acho natural que as pessoas, quando pegas em situação do tipo, tentem deslocar a sua responsabilidade para terceiros. A impressão que se tem é que o fiscalizador é que é responsável pela solidez dos bancos. Os responsáveis são os próprios banqueiros. Posso dizer que os administradores que alegam que a ação do BC anterior à intervenção foi a responsável pela quebra poderiam ter colaborado com o BC informando das práticas que tinham conhecimento.