Título: Espírito Santo não autoriza reajuste do gás e inicia polêmica com Petrobras
Autor: Chico Santos
Fonte: Valor Econômico, 21/09/2005, Brasil, p. A2

O governo do Estado do Espírito Santos decidiu unilateralmente não homologar o reajuste de 6,5% do preço do gás natural definido pela Petrobras e que deveria estar em vigor desde o dia 1º deste mês. A decisão é válida também para o aumento de 5% previsto para vigorar a partir de 1º de novembro. A Agência de Serviços Públicos de Energia do Espírito Santo (Aspe) usou como justificativa o fato de que o aumento está em desacordo com a legislação, mas há um forte componente político na medida. O Estado quer negociar com a estatal uma fórmula que lhe assegure um projeto de desenvolvimento a partir da crescente produção de gás no seu território. A briga pode ir parar na Justiça. Hoje o Espírito Santos produz 1,2 milhão de metros cúbicos de gás por dia, totalmente consumidos no próprio Estado. No próximo ano, com a entrada em operação dos campos de Peroá-Cangoá e Golfinho, a expectativa das autoridades estaduais é de que a produção alcance 6 milhões de metros cúbicos por dia, chegando a pelos menos 12 milhões em 2010. "A gente não quer brigar com a Petrobras, mas queremos discutir uma política de desenvolvimento regional a partir do gás", disse Julio Cesar Bueno, secretário de Desenvolvimento Econômico do Estado, que foi presidente da BR Distribuidora no governo anterior. Ele quer, por exemplo, que sejam instaladas no Estado uma planta de fertilizantes e uma de ferro esponja (ferro produzido sem necessidade de alto-forno) usando a disponibilidade de gás do Espírito Santo. De acordo com Bueno, o preço do gás é uma variável importante e pode inviabilizar as negociações para a instalação de uma planta de ferro esponja pela Companhia Vale do Rio Doce. No dia 19 de agosto a Petrobras decidiu aumentar o gás importado da Bolívia em 13% a partir de 1º de setembro e em mais 10% em 1º de novembro. Para o gás nacional o reajuste foi exatamente a metade, 6,5% em setembro e 5% em novembro. No Espírito Santo, a distribuidora do gás é a BR Distribuidora, subsidiária integral da Petrobras. Como a distribuição é uma concessão pública estadual, o repasse do reajuste no Estado depende da homologação da Aspe. A diretora-geral da agência, Maria Paula de Souza Martins, disse que a decisão da Petrobras de aumentar o preço contraria a resolução nº 6 do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), datada de 2003 e ainda em vigor. Segundo ela, a resolução diz que enquanto não houver efetiva concorrência no mercado de gás cabe ao Ministério da Fazenda e ao Ministério de Minas e Energia fixar o preço do gás. Hoje o gás no Brasil é basicamente produzido pela Petrobras que também é a controladora do trecho brasileiro do gasoduto Bolívia-Brasil, pelo qual é importado o gás boliviano consumido em território brasileiro. Maria Paula disse que o Espírito Santos foi o único Estado a não homologar integralmente o reajuste, embora haja informações de que em outros Estados houve repasse parcial por parte das distribuidoras. A diretora-geral da Aspe disse que o Espírito Santo reconhece que o contrato de concessão da BR, assinado em 1993 (quando o Espírito Santo ainda não produzia gás), está defasado da realidade e que poderia ser repactuado para lhe dar atualidade. Na repactuação poderia ser encontrada uma outra forma para resolver o problema do preço e também para outras falhas, como os níveis de investimento "muito tímidos" estipulados para a distribuidora fazer no Estado. A assessoria de imprensa da BR informou que a empresa não iria se pronunciar sobre o assunto. Há a expectativa de que a BR vá à Justiça contestar a decisão do governo capixaba. O secretário Bueno defende que o preço do gás natural não pode ser livre porque o mercado consumidor não tem, como no caso dos derivados de petróleo, a opção de importar livremente.