Título: Governador atacará a crise nos hospitais
Autor: Campos, Ana Maria
Fonte: Correio Braziliense, 25/04/2010, Cidades, p. 33

NOVO GOVERNO

A oito meses do fim do mandato, Rogério Rosso chega ao Palácio do Buriti disposto a garantir a estabilidade política, a evitar descontinuidade das obras e a dar prioridade à saúde

Oito meses é um prazo curto para muitas realizações, mas pode ser longo para uma crise. Ciente de que tem pouco tempo para inovações e projetos mirabolantes e um erro poderá comprometer a sua gestão, o governador Rogério Rosso, eleito para tocar a máquina administrativa em meio a um momento de grande conflito político, tem como meta deixar a marca da estabilidade institucional. É um teste de fogo, para o político que sempre buscou chegar ao Palácio do Buriti, e agora realiza esse sonho, mas com pouca margem de manobra para grandes projetos.

Pela frente, há vários desafios. Enquanto discute o cumprimento de compromissos de campanha com deputados distritais, ele precisa dar continuidade às obras, gerir uma máquina com orçamento de R$ 22,6 bilhões e investimentos previstos da ordem de R$ 1,8 bilhão, recorde na história do DF. Tudo isso sem comprometer a imagem da atual administração que não pode ser abalada com novo escândalo, sob pena de sofrer uma rejeição que o impediria de governar e de decretação de intervenção federal, como se discute no Supremo Tribunal Federal (STF), a pedido do procurador-geral da República, Roberto Gurgel.

Depois da posse na última segunda-feira, Rosso concentrou-se em formar a equipe que, de fato comanda o governo, por onde passam todas as decisões políticas e liberações de recursos. Nomeou para o cargo de chefe de gabinete um amigo e parceiro já na Companhia de Planejamento (Codeplan), Luiz Fernando da Costa e Silva. No governo de José Roberto Arruda, ele foi o gerente do projeto da Parceria Público-Privada para a construção do Centro Administrativo de Taguatinga, que Rosso comandou como principal atribuição nos últimos três anos.

O novo governador colocou servidores técnicos também em outros postos-chave. Manteve o secretário de Fazenda, André Clemente, de carreira. Indicou Geraldo Lourenço de Almeida para a Secretaria de Governo e escolheu José Itamar Feitosa para a pasta de Planejamento, Orçamento e Gestão. Nenhum deles tem perfil político. ¿Meu maior desafio é entregar o governo ao meu sucessor em primeiro de janeiro de 2011 com o cumprimento integral da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). E vou superar esse desafio¿, assegura Rosso.

Prioridades Uma de suas prioridades será a saúde, setor que Arruda nunca conseguiu êxito. Para melhorar a imagem da pasta, o ex-governador escolheu o deputado Augusto Carvalho (PPS), tido como um fiscal da transparência dos gastos públicos. Augusto enfrentou muitas dificuldades no primeiro ano de gestão e começava a colher os primeiros frutos quando a Operação Caixa de Pandora foi deflagrada, em 27 de novembro, e desestabilizou todo o governo, inclusive a Secretaria de Saúde. ¿Nesta semana, vou despachar nos hospitais¿, promete Rosso.

O governador disse que vai tentar verificar pessoalmente os problemas dos pacientes da rede pública do DF. Mas terá de buscar uma parceria com o Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT) para evitar conflitos como os que Augusto Carvalho enfrentou ao trombar com o promotor de Justiça Jairo Bisol, da Promotoria dos Direitos da Saúde (ProSus). Bisol foi o primeiro a denunciar que recursos federais transferidos pela União para a saúde ficavam retidos numa aplicação financeira no Banco de Brasília (BRB), enquanto havia atendimento ruim e falta de equipamentos e medicamentos nos hospitais. Augusto reclamava de perseguição. A denúncia foi confirmada em auditoria feita pela Controladoria-Geral da União (CGU).

Além de administrar a capital do país numa crise institucional, Rosso vai comandar o Distrito Federal durante a campanha política para a escolha do futuro governador. Ele foi eleito por um aliança entre o PT e o PMDB, que teve o aval do Palácio do Planalto e do presidente da Câmara Federal, Michel Temer (SP), cotado para ser o vice da candidata petista à Presidência da República Dilma Rousseff. Rosso precisa atravessar esse momento de embates eleitorais sem chamar a atenção dos políticos. Por isso, ele não deve comparecer a grandes solenidades públicas que provoquem ciúmes entre os candidatos. Na última sexta-feira, o novo governador evitou participar da inauguração do novo restaurante comunitário do DF, no Gama, base eleitoral de distritais que o apoiaram como Pedro do Ovo (PRP), Cabo Patrício (PT) e do adversário naeleição indireta, o atual presidente da Câmara Legislativa, Wilson Lima (PR).

Está em curso uma negociação, defendida em entrevista concedida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Correio, publicada em 21 de abril, para formação de aliança entre PT e PMDB também para as eleições de outubro. Essa composição teria o petista Agnelo Queiroz como candidato ao governo e o presidente regional do PMDB, Tadeu Filippelli, como vice. O problema para Rosso é governar oito meses como oposição ao ex-governador Joaquim Roriz (PSC), que deverá disputar a eleição contra Agnelo, sem o apoio entusiasmado dos petistas. Com uma base popular forte, Roriz e seus líderes comunitários podem provocar manifestações contrárias ao novo governador. Rosso teria, assim, dificuldades para administrar o DF. ¿Não haverá uso da máquina e não vou participar de nenhuma campanha. Esse é um compromisso¿, assegura o governador.

Desafios

Saúde É um dos setores mais criticados pela população e deve ser o tema da próxima campanha eleitoral, com dois médicos em chapas opostas, Agnelo Queiroz (PT) e Jofran Frejat (PR) ¿ provável vice de Joaquim Roriz (PSC). Uma auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) apontou que o governo Arruda manteve R$ 320 milhões destinados à saúde em aplicações financeiras do Banco de Brasília (BRB). Um dos principais pontos atacados pelo Ministério Público é a terceirização dos serviços de saúde.

Obras Era a grande marca do governo Arruda. Nos meses que antecederam a crise provocada pela Operação Caixa de Pandora, o GDF divulgava que havia 2 mil obras em execução. A nova gestão terá de dar prosseguimento aos principais empreendimentos iniciados, muitos dos quais no sistema viário, e ainda fazer um pente-fino para evitar pagamentos de obras com indícios de irregularidades.

Orçamento No segundo semestre, a Câmara Legislativa vai apreciar o projeto de lei orçamentária para o próximo ano, o primeiro do governo a ser eleito em outubro. O projeto deve incluir recursos para investimento em novos projetos e custeio de áreas prioritárias, para que o futuro governador tenha condições de tocar a administração. Além disso, o atual governo precisa entregar a máquina de acordo com o que estabelece a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Serviços públicos A máquina administrativa precisa ter continuidade mesmo com a turbulência política em decorrência da crise iniciada com a Operação Caixa de Pandora e possivelmente agravada com os jogos políticos da campanha. Houve e ainda continua ocorrendo muitas trocas de comando em todas as áreas do governo, o que pode provocar descontinuidade de projetos e da prestação dos serviços públicos.

Novos escândalos As denúncias feitas pelo ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa envolvem compra de deputados que continuam a desempenhar atividade parlamentar na Câmara Legislativa e empresas prestadoras de serviços que mantêm contratos com o GDF. Uma nova denúncia, envolvendo a atual gestão, dificilmente seria perdoada.

Operação Caixa de Pandora O Inquérito 650, em curso no Superior Tribunal de Justiça (STJ), ainda não foi chegou ao fim e deverá provocar muitas turbulências. A Polícia Federal vai concluir relatórios de perícias e de buscas e apreensões que poderão apontar envolvimentos de outros políticos ainda não citados. Nos próximos meses, a Procuradoria-Geral da República deve apresentar a denúncia do caso, contra o ex-governador José Roberto Arruda e outros envolvidos, entre os quais oito deputados distritais que ajudaram a eleger o novo governador.

Aposta para futuro Aos 41 anos, Rogério Rosso, tem uma longa vida política pela frente. Com ambições de chegar ao Palácio do Buriti, acalentadas como projeto a longo prazo, ele não vai se conformar em governar apenas oito meses. Rosso abriu mão de uma candidatura a deputado federal neste ano, mas não vai se aposentar da política. Fará o possível para deixar uma marca de sucesso a fim de registrar seu nome no primeiro time de políticos do DF e tentar voltar em um futuro ao governo por eleições diretas.

Pdot O Tribunal de Justiça do DF julga ação direta de inconstitucionalidade (Adin) proposta pelo procurador-geral de Justiça do DF, Leonardo Bandarra, que trata do Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot). No julgamento, iniciado na última terça-feira, mas suspenso, vários pontos do projetos foram suprimidos pelo voto de 10 dos 17 desembargadores do Conselho Especial do TJDF. A análise continua, mas já há votos para manutenção da decisão. O governo precisa estudar os dispositivos suspensos por vício de iniciativa que serão considerados relevantes e passíveis de serem tratados em novos projetos de lei a serem enviados à Câmara.

TCDF Existe um imbróglio relacionado à origem da próxima vaga do Tribunal de Contas do DF, aberta na última quinta-feira, com a aposentadoria do conselheiro Jorge Caetano. Há discussão sobre a origem da próxima nomeação porque o ministro Luiz Fux, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), considera que houve um erro na indicação da atual presidente do TCDF, Anilcéia Machado. A vaga pertenceria ao Ministério Público de Contas. O governador terá de decidir se vai ou não se envolver na escolha do próximo conselheiro, o que poderia em tese revolver a pendenga.

Compromissos com distritais Caberá ao novo governador controlar os limites dos deputados distritais para evitar que a Câmara Legislativa assuma o controle ou que haja barganhas, o que provocaria desgastes.

Decisão no STF O novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, que tomou posse na última sexta-feria, vai herdar o pedido de intervenção federal no DF feito pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que estava nas mãos do ministro Gilmar Mendes. Considerado técnico, Peluso que foi desembargador em São Paulo deve julgar com viés menos político do que o antecessor. O novo governador precisa demonstrar que não há mais necessidade de intervenção porque a eleição indireta restabeleceu a normalidade política e institucional no DF.