Título: Timidez marca propostas da UE e dos EUA para diminuir tarifas agrícolas
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 26/09/2005, Brasil, p. A2

A União Européia (UE) só aceita reduzir suas tarifas agrícolas em 36,4% em média, e desde que possa manter barreiras elevadas para a entrada de 238 produtos considerados "sensíveis". Proposta apresentada pelos Estados Unidos defende cortes mais ambiciosos para haver efetiva abertura de mercados, entre 45% e 90%, dependendo do tamanho da alíquota em vigor. Representantes da UE indicaram também que "podem aceitar" um teto de 100% para as tarifas agrícolas nos países industrializados e de 150% nas nações em desenvolvimento, conforme proposta do G-20, grupo de países em desenvolvimento coordenado pelo Brasil. Mas o Japão já avisou que não aceita isso de jeito nenhum. Esses "esboços de propostas" foram apresentados pela primeira vez numa reunião entre ministros do Brasil, dos EUA, da UE e da Índia na sexta-feira em Paris. As propostas foram consideradas insuficientes para destravar as negociações entre os membros da Organização Mundial do Comércio (OMC). Além da timidez no tamanho dos cortes de tarifas, faltam sinais mais consistentes da disposição dos EUA para reduzir os subsídios internos que distorcem os preços dos produtos agrícolas americanos no mercado mundial. Na falta de entendimentos entre os dois elefantes do comércio mundial, a negociação agrícola continua deslizando para zona de alto risco na OMC. Resumindo os resultados da reunião, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, disse: "Concordamos que continuamos engajados." Outra rodada de reuniões ditas "cruciais" está marcada para ocorrer entre 10 e 13 de outubro, na Suíça. Se depois dessas reuniões EUA e UE não se comprometerem com "algo substancial e ambicioso em agricultura", países exportadores agrícolas querem "bater o martelo" num pacote minimalista para produtos industriais e serviços na reunião ministerial marcada para dezembro, em Hong Kong. O Brasil é dos países que mais buscam um sucesso em Hong Kong. Um acordo agrícola importante ajudaria o fragilizado governo Luiz Inácio Lula da Silva, cuja política comercial também vem sendo alvejada por críticas. Se o lobby pró-liberalização está cada vez mais difícil de ser ouvido, de outro lado aumenta a pressão nos EUA e na UE para não desmantelarem a alta proteção que dão a seus agricultores. França, Espanha e até Chipre mostram-se particularmente irritadas com os acenos de liberalização que têm sido feitos pelo comissário europeu de comércio, Peter Mandelson. Nos EUA, o governo e o Congresso relutam em fazer concessões antes de discutir ano que vem a nova Farm Bill, a lei agrícola americana para 2007-2012. Cada vez mais isolado na negociação agrícola, os EUA reagem cobrando a UE e o Japão para que façam os maiores cortes nas subvenções internas. Na reunião de Paris, a UE indicou que sua oferta mais "ambiciosa", de redução média de 36,4%, é "o que podemos oferecer pelo nosso mandato". Bruxelas admite reduzir sua lista de mercadorias sensíveis de 238 para 153 produtos. Mas nesse caso só aceitaria redução tarifária média de 24,5%. Para o Brasil e os EUA, a lista deveria ser quatro a cinco vezes menor. O G-20 tem na mesa um esqueleto de fórmula tarifária com cinco bandas de cortes. Agora, precisa definir o tamanho da redução em cada banda. A Índia indicou que não aceita fortes reduções nas alíquotas mais altas: é que quase todas as suas alíquotas consolidadas estão acima de 100%. "Estamos aqui negociando o que é possível", disse Amorim quando indagado sobre a demanda do setor privado brasileiro de só fechar acordo com corte tarifário de no mínimo 65%. Enquanto as atenções estavam concentradas na agricultura, o que saiu mesmo de concreto foi no setor de serviços, de interesse especial para os países industrializados. Foi criado um grupo de 15 países para tentar acelerar também essa negociação, sob a coordenação dos EUA e da Índia. O Brasil conseguiu incluir a Argentina no grupo, contra a oposição de americanos e europeus. Brasil e Argentina querem frear novas formas de negociar abertura no setor. Até os EUA mostram-se prudentes com o nível de ambição da UE na área de serviços. O Japão já propôs que os países ricos se comprometam em abrir 60% dos 160 subsetores (que vão de bancos a serviços de limpeza), enquanto as nações em desenvolvimento abririam 40% no mínimo.