Título: Câmara diverge da proposta de Bornhausen
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 26/09/2005, Política, p. A12

Crise Até deputados do PFL consideram que projeto aprovado no Senado enrijece demais as regras eleitorais

A decisão dos principais líderes do Congresso e do governo de eleger a reforma política como a panacéia para superar a crise pode até viabilizar a aprovação, nesta semana, de mudanças no sistema eleitoral, mas a pressa permitirá apenas alterações superficiais. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB AL), convocou para amanhã uma reunião de líderes das duas Casas - para a qual convidou o presidente interino da Câmara, José Thomaz Nonô (PFL BA) - em que serão discutidos os projetos em tramitação referentes à reforma político-eleitoral. Para que as alterações entrem em vigor nas próximas eleições, é preciso que a reforma seja votada até 30 de setembro, um ano antes do próximo pleito. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara deve aprovar, até quarta-feira, a proposta de reforma eleitoral elaborada pelo Senado. Como a resistência à redução do tempo de campanha de 90 para 60 dias e ao novo formato dos programas eleitorais (sem uso de cenas externas) é muito grande entre os deputados, a tendência é de que essas alterações sejam suprimidas do texto. A maioria dos deputados também não quer criminalizar a boca-de-urna, que pelo texto do Senado passaria a ser crime com punição de 1 a 5 anos de detenção. A relatora da proposta, deputada Iriny Lopes (PT-ES), admitiu abertamente em seu parecer que a CCJ está "sofrendo pressão para viabilizar a aprovação célere do projeto, abstendo-se de aprovar alterações que o façam retornar ao Senado". Exatamente por isso o parecer da petista, que deve ser aprovado esta semana, só traz emendas supressivas. Quando não há mudança de mérito, o texto não precisa retornar ã Casa de origem. Segundo a deputada, a proposta de criminalização da boca de urna é um retrocesso, pois o eleitor tem o direito de manifestar de forma pacífica suas preferências políticas. O presidente da CCJ, deputado Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ), concorda. "Isso não tem cabimento. É uma medida muito drástica, sem aplicação viável, e pode gerar muitos problemas", disse o petista, acrescentando que, como promotor eleitoral, já presenciou julgamentos completamente distintos sobre o tema. Biscaia afirma que, se não houver acordo político suprapartidário, o projeto não chega a plenário. Outro tema retirado da proposta é a proibição para que os programas eleitorais só possam ser gravados em estúdio, sem utilização de cenas externas. "Nos parece padecer de ranço autoritário, pois limita excessivamente as formas de comunicação dos partidos com os eleitores", diz o parecer da deputada Iriny Lopes. O líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ), explica que apesar de 90% dos parlamentares da legenda serem favoráveis à proposta - de autoria do presidente nacional do partido, senador Jorge Bornhausen (SC) -, esse aspecto precisa ser revisto. "O formato não pode ser assim tão rígido. Isso pode prejudicar candidaturas majoritárias que serão impedidas de mostrar cenas externas apontando problemas da gestão do adversário que concorre à reeleição", diz. Há também focos de resistência no PMDB e PL. Com as supressões propostas pela relatora petista, é provável que a maioria concorde com a aprovação do texto. Mesmo que aprovada nesta semana na CCJ, dificilmente a reforma chega ao plenário da Câmara para a votação definitiva. Está na pauta a Medida Provisória 258, que cria a Super Receita. O texto é polêmico. "Nós sequer recebemos o relatório para analisar a MP. Queremos contribuir para o andamento da pauta, mas não vamos aprovar isso de qualquer jeito", avisa Rodrigo Maia. Diante dos inúmeros obstáculos para votar a proposta, o presidente da CCJ já prepara outras saídas. O deputado Fernando Coruja (PPS-SC) fez uma consulta à Mesa Diretora da Câmara sobre a exigência da anualidade para mudar regras eleitorais. A Mesa encaminha a consulta à CCJ hoje. Pelo entendimento do deputado Biscaia, há alguns temas que podem ser alterados sem que seja observado o princípio da anualidade, como regras para realização de comícios, publicação de pesquisas eleitorais e até o tempo de campanha. "Se o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pode propor mudanças antes de um ano, então temos que analisar", argumentou o petista. De qualquer forma, também já está pronta para ser votada no plenário da Câmara a proposta de emenda constitucional (PEC) que altera o artigo 16 da Constituição e permite que as regras eleitorais possam ser alteradas até o dia 31 de dezembro deste ano. A dificuldade para votá-la é que, em se tratando de emenda constitucional, precisa ser apreciada em dois turnos, nas duas Casas. Como a Câmara está envolvida na sucessão da presidência, e ainda há medidas provisórias polêmicas na ordem do dia, os parlamentares não apostam na votação da PEC. No Senado, a PEC de autoria do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que também propõe a alteração da data para modificações eleitorais para dezembro, pode ser votada nesta semana na CCJ. A proposta, no entanto, engloba outros temas controversos, como novas regras para registro de domicílio eleitoral e divulgação de pesquisas. Líderes governistas admitem que há interesse na aprovação, mas é preciso negociar o texto.