Título: Balança comercial pode ser afetada em
Autor: Tatiana Bautzer
Fonte: Valor Econômico, 27/09/2005, Finanças, p. C1

A valorização do real não vai afetar o desempenho positivo da balança comercial neste ano. O risco existe a partir de 2006. Como muitas empresas estão trabalhando com margens de rentabilidade extremamente apertadas, novos investimentos podem ser postergados (ou mesmo cancelados) tanto pela dificuldade em acumular caixa para bancar novos projetos como pelo próprio retorno do negócio. Pelos cálculos da Fundação Centros de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), as exportações brasileiras ficaram 14,1% menos rentáveis no primeiro semestre deste ano. Neste período, a valorização da taxa média de câmbio nominal em relação à média do mesmo período em 2004 foi de 15,5%. Até ontem, essa valorização já estava em 19%, o que indica que a queda de rentabilidade já supera os 14%. Dos 27 setores de atividade pesquisados pela Funcex, apenas três deles apresentam desempenho positivo no índice de rentabilidade: siderurgia, refino de petróleo e petroquímicos e café. São setores beneficiados pelo aumento de preços no mercado externo. Para Carlos Cavalcanti, diretor do departamento de comércio exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), o governo está míope e tem pensado apenas no curto prazo. "Para este ano o saldo da balança está assegurado em torno de US$ 40 bilhões. O problema é saber até quando as empresas serão capazes de suportar essa taxa de câmbio", ressalta. O diretor ilustra essa observação com o caso de uma empresa têxtil que só tem conseguido manter contratos com compradores europeus às custas de muito esforço. A companhia está criando produtos diferenciados, como toalhas com estampas da fauna brasileira, para conseguir espaço no mercado, já que os produtos similares fabricados pelos chineses custam 40% menos. "O câmbio tem atrapalhado muito. Nem com um algodão mais barato e custo de energia competitivo o Brasil tem conseguido se sair bem", reclama. Sergio Vale, economista da MB Associados, afirma, no entanto, que o fator que mais pesa para o bom desempenho das exportações é a demanda externa e, em segundo lugar, o câmbio. A expectativa da consultoria para a balança comercial em 2006 está entre US$ 35 bilhões e US$ 37 bilhões, abaixo da projeção de US$ 41 bilhões para este ano. Esses números contam com um câmbio de R$ 2,45 no final de 2005 e de R$ 2,6 no próximo. Vale acredita que a demanda externa estará mais fraca, o que derrubará os preços tanto dos manufaturados quanto dos agrícolas. A avaliação do diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Júlio Sérgio Gomes de Almeida, é a de que com o real valorizado ante o dólar dessa maneira a tendência para os próximos dois a três anos é de retração nos investimentos voltados à produção para exportação. "Com esse câmbio (na casa de R$ 2,3), acho que muita gente que escolheu o Brasil como plataforma para exportar já está repensando a decisão", diz Almeida. Ele teme que os bens de capital, aqueles relacionados a investimentos em aumento de capacidade produtiva, sofram ainda mais com a valorização do real. Ele lembra que "o Brasil tem atrativos como juros internos altos que fazem com que o investimento em produção seja deixado de lado em troca de ganhos em aplicações financeiras".