Título: Indústria brasileira perde espaço no mercado chinês, aponta a CNI
Autor: Arnaldo Galvão
Fonte: Valor Econômico, 28/09/2005, Especial, p. A12

O Brasil não conseguiu responder à mudança das necessidades da China e, desde os anos 80, vem perdendo espaço no setor de manufaturados naquele mercado. Em 2004, apenas 8,3% das quase 20 mil empresas exportadoras brasileiras venderam mercadorias àquele país. No ano passado, 62% das vendas para a China concentraram-se em soja, minério de ferro e celulose. Portanto, um maior peso das exportações de maior valor depende mais da competitividade da indústria brasileira do que das barreiras comerciais. Essa é uma das principais conclusões de um estudo realizado pela Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex) a pedido da Confederação Nacional da Indústria (CNI). O trabalho procurou verificar as implicações para o interesse nacional da entrada da China na Organização Mundial do Comércio (OMC). A coordenação é dos consultores Lia Valls Pereira e Galeno Tinoco Ferraz Filho.

A preocupação mais aguda dos industriais está em cinco segmentos: têxtil, calçados, brinquedos, máquinas injetoras de plástico e eletroeletrônicos. Segundo a coordenadora da Unidade de Negociações Internacionais da CNI, Soraya Rosar, as importações brasileiras da China cresceram 70% em 2004. Se em 2000 essas compras foram de US$ 1,2 bilhão, três anos depois chegaram a US$ 3,7 bilhões. De janeiro a agosto de 2005, elas já somaram US$ 3,3 bilhões. Do lado das oportunidades, as melhores perspectivas para os exportadores brasileiros estão nos segmentos de matérias-primas e agropecuário. Mas isso depende de uma maior transparência nas práticas comerciais chinesas, principalmente quanto ao uso de barreiras não-tarifárias. Segundo a CNI, o Brasil vem perdendo oportunidades de negociação comercial com a China. Exemplo recente seria a aceitação do acesso da China como membro da OMC, sem compensações relevantes. O estudo da Funcex reconhece que a adesão da China às normas da OMC tem impacto ainda nebuloso nos interesses brasileiros naquela organização. "O reconhecimento da China como economia de mercado tem um sentido mais político que prático (...). A possibilidade de continuar mantendo preços controlados pelo Estado não é vedada pela OMC." Nesse contexto, o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, desembarca na noite de hoje em Pequim e inicia amanhã os contatos com os ministros do Comércio, Bo Xilai, e do Planejamento, Ma Kai. O objetivo é coordenar as negociações para a restrição voluntária de exportações chinesas que estejam prejudicando setores da indústria brasileira. De acordo com o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, a negociação de um acordo de redução voluntária das exportações chinesas ao Brasil não significa que o governo brasileiro desistiu da adoção de salvaguardas contra produtos chineses. O decreto de salvaguardas continua na manga, segundo Amorim, para "ser usado se não houver acordo", afirmou ele, ontem, em Washington. O ex-embaixador do Brasil em Washington Rubens Barbosa, presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), disse que o decreto que regulamenta as salvaguardas continuará sendo "imprescindível" para as empresas nacionais mesmo se Furlan chegar a um acordo com os chineses. "O decreto já foi aprovado e o governo não pode abrir mão desse instrumento", disse Barbosa. Ele observou que o acordo em discussão com a China prevê restrições apenas para setores que se consideram mais atingidos pelo avanço chinês, como têxteis e calçados. "Para os demais setores, as salvaguardas continuarão necessárias." (Colaboraram Tatiana Bautzer, de Washington e Ricardo Balthazar, de São Paulo)