Título: FMI teme supercrescimento
Autor: Nunes, Vicente; Verdini, Liana
Fonte: Correio Braziliense, 22/04/2010, Economia, p. 14

Fundo pede agilidade ao Brasil para cortar os benefícios fiscais e aumentar as taxas de juros de forma a conter a inflação. A instituição prevê elevação de 5,5% no PIB neste ano, mas analistas falam em até 7%

Diante dos evidentes sinais de aquecimento da economia, o Fundo Monetário Internacional (FMI) revisou, para cima, as projeções de crescimento para o Brasil neste ano, de 4,7% para 5,5%. O organismo fez, porém, uma importante ressalva: para evitar os problemas inflacionários que já atormentam o Banco Central, será preciso pôr fim rapidamente aos estímulos dados pelo governo no auge da crise mundial, no fim de 2008 e início do ano passado. Ou seja, o Ministério da Fazenda terá de reverter as isenções fiscais concedidas a vários setores produtivos ¿ parte delas, por sinal, já foi retirada ¿ e o Comitê de Política Monetária (Copom, elevar a taxa básica de juros (Selic) a partir da próxima semana, como espera todo o mercado.

No entender do FMI, não se pode dar espaço para que o supercrescimento do Brasil neste ano (analistas falam em taxas acima de 7%) se transforme em problemas. A instituição ressaltou que os atuais índices de preços, bem acima do centro da meta perseguida pelo BC, de 4,5%, são preocupantes, exigindo uma política monetária ¿ágil¿ e pronta para a reação. Como bem deixou claro o presidente do BC, Henrique Meirelles, o aumento da Selic é certo. Os economistas só se debatem sobre o tamanho: há os que pregam o início da alta em 0,5 ponto, os que defendem 0,75 ponto a partir deste mês e os mais pessimistas, que dizem ser necessário um arrocho inicial de um ponto. Com essa esperada elevação dos juros, o FMI estimou um avanço menor para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2011: 4,1%.

Para Olivier Blanchard, diretor do Departamento de Pesquisa do FMI, o supercrescimento projetado para o Brasil neste ano é decorrência da saída mais rápida dos países emergentes da crise. ¿Os desafios para esses países são como e quando abandonar as políticas macroeconômicas complacentes¿, destacou. O problema se torna maior porque, com as economias fortalecidas, essas nações estão atraindo fluxos crescentes de capitais, que podem desequilibrar as contas correntes (com o exterior). A seu ver, várias países já mostram dificuldades para acomodar o movimento de recursos e o resultado tem sido valorizações expressivas de suas moedas(1) frente ao dólar.

O mundo se recupera O conjunto da América Latina também terá um bom desempenho neste ano e em 2011, com expansão média de 4,1%. Segundo o FMI, a região é uma das que demonstra melhor recuperação da pior crise econômica desde a II Guerra Mundial. Nos cálculos da instituição, somente o Peru, com alta de 6,3% neste ano, crescerá mais do que o Brasil (isso, caso o Fundo esteja certo e não os analistas que preveem incremento de 7% do PIB). No ano que vem, o país será superado novamente pelo Peru (6%) e pelo Chile (6%). Os piores desempenhos serão registrados pela Argentina (+3,5% neste ano e +0,7% em 2011) e pela Venezuela, que encolherá 2,6% em 2010 e avançará minguado 0,4% no próximo ano.

O FMI também elevou a previsão de crescimento mundial, de 3,9% para 4,2% neste ano. Mas alertou para os riscos que ainda pesam sobre a recuperação global, sobretudo em relação à dívida pública dos países desenvolvidos e aos desequilíbrios nos fluxos de capital (leia mais na página 15). Em 2009, pagando o preço do estouro da bolha imobiliária americana, a economia do mundo retrocedeu 0,6%. ¿A atividade se desenvolve a ritmos diferentes, timidamente nos países desenvolvidos, mas vigorosamente na maior parte dos emergentes e dos países em desenvolvimento¿, afirmou Blanchard. A Zona do Euro terá avanço de 1% e a Ásia de 8,7%, puxada pela China, com 10%. Os Estados Unidos devem crescer 3,5%.

1 - Desvalorização do yuan O Fundo Monetário Internacional (FMI) ressaltou ser ¿essencial¿ que a China deixe a sua moeda, o yuan, se valorizar em relação ao dólar. Segundo a instituição, a divisa está ¿claramente¿ desvalorizada e a sua correção é importante para se dinamizar o comércio internacional, com o aumento das importações do país de maior população do planeta, que disputa com o Japão o posto de segunda economia mundial.

Trimestre de recordes

Deco Bancillon

Ainda que o governo tenha retirado parte dos estímulos fiscais dados à época da crise, o Brasil está avançando a um ritmo semelhante ao de máquinas de crescer, como a China e a Índia. Pelas contas do economista Aurélio Bicalho, do Itaú Unibanco, o país registrou expansão entre 2,5% e 3% no primeiro trimestre deste ano em relação aos últimos três meses de 2009. Anualizadas, essas taxas correspondem a altas entre 10% e 12,5%, o que levanta a possibilidade de o Brasil ter dado um salto maior do que os 11,9% registrados pelo Produto Interno Bruto (PIB) chinês no mesmo período.

Os dois primeiros meses do ano foram particularmente bons para o Brasil, combinando aumento da produção com incremento do consumo. Estimativas do Itaú Unibanco dão conta que o país cresceu 1,3% em janeiro e 1,2% em fevereiro, na comparação com o mês anterior. Bicalho acredita que março não fugiu à regra. ¿A produção de veículos avançou mais de 7%, a expedição de papelão ondulado aumentou 2,1% e o movimento de veículos pesados elevou-se em 2,4%, tudo em relação a fevereiro e após ajustes sazonais¿, afirmou. Além disso, houve a contribuição do mercado de trabalho. Foram criados cerca de 250 mil empregos formais em março.

¿Esses dados projetam continuidade da queda da taxa de desemprego, para níveis abaixo de 7% nos próximos meses. Ou seja, o recorde de baixa alcançado com os 7,2% em fevereiro deve ser batido rapidamente já nas próximas divulgações¿, afirmou Bicalho. Não é à toa, no entender do economista-chefe da Corretora Convenção, Fernando Montero, que se caminha para taxas de crescimento do PIB e da indústria recordes em 25anos. Ele calculou que a economia tenha se expandido 8,2% no primeiro trimestre, ante igual período de 2009 e 2,2% sobre os últimos três meses do ano passado. Ele disse acreditar em uma desaceleração nos próximos meses, mas não a ponto de impedir um crescimento chinês para o Brasil. ¿Essa trajetória nos dá um impressionante PIB de 7,1% no ano¿, disse.

Montero reforçou que o resultado deste ano é consistente porque leva em conta uma alta de 12,2% da indústria, a mais elevada desde 1991. Para Bicalho, somente uma desaceleração muito forte da atividade econômica nos próximos meses evitaria um crescimento do PIB em 2010 menor que 6,5%.