Título: Cláusula de barreira trava reforma política
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 30/09/2005, Política, p. A8

Uma nova queda-de-braço entre governo e oposição em torno da reforma política deverá marcar a gestão de Aldo Rebelo (PCdoB-SP) na presidência da Câmara. O ponto central do embate é a cláusula de barreira, que obriga os partidos a conseguir no mínimo 5% dos votos apurados na eleição para deputados, distribuídos em pelo menos nove Estados. O partido de Aldo, o PCdoB, é um dos maiores interessados em acabar com a cláusula de barreira. O tema é de fundamental importância a aliados que apoiaram Aldo na eleição - PDT, PL, PTB e PP. Se não conseguirem atingir a cláusula de barreira, os pequenos partidos perdem a representação na Câmara. A oposição não tem interesse em abrandar a cláusula de barreira. Com a Casa dividida, a briga pode ter como conseqüência a paralisia no plenário. Hoje seria o último dia para alterar a legislação eleitoral e estabelecer novas regras para o pleito de 2006. Nada foi votado na Câmara, nem mesmo a proposta de reforma eleitoral elaborada às pressas no Senado, de autoria do senador Jorge Bornhausen (PFL-SC). Os governistas começaram ontem a se articular para tentar aprovar uma proposta de emenda constitucional (PEC) que permitiria a modificação das regras eleitorais até 31 de dezembro. Com isso, abririam a possibilidade de amenizar, em novo projeto de lei, a cláusula de barreira. O assunto veio à tona na primeira reunião do colégio de líderes, ontem, conduzida por Aldo. O PFL assumiu ontem uma posição radical contra a votação da PEC, apesar de a proposta ser de autoria de um pefelista, o deputado Ney Lopes (PFL-RN). Não foi possível fechar nenhum acordo e muito menos prever votações a longo prazo sobre a reforma política. Nova reunião será realizada na próxima terça-feira. "No fundo, o que eles querem é só acabar com a cláusula de barreira. Isso é descabido. Não vamos aprovar essa PEC. É abrir a porteira, e não vamos cair nessa armadilha", disse o líder da minoria, José Carlos Aleluia (PFL-BA). A Executiva Nacional do PFL fechou questão ontem contra a votação da proposta de Lopes. O PSDB informou a Aldo que só concorda com a votação da PEC se houver uma negociação bem transparente sobre quais temas da reforma política seriam votados no futuro. O PT, que na essência é a favor da cláusula de barreira por ser um grande partido, fica na berlinda por depender de pequenos aliados. Sobre a proposta de reforma eleitoral de Bornhausen, os líderes concluíram ontem que os ânimos estavam ainda exaltados demais por conta da eleição que dividiu a Câmara - que delimitou claramente o território do governo e da oposição -, o que inviabilizaria qualquer sessão ontem e hoje. Além disso, nem PT nem PSDB tinham interesse na aprovação da proposta, que veda o uso de cenas externas na propaganda eleitoral na TV. O deputado Maurício Rands (PT-PE), sintetizou bem o dilema: "Qualquer Executivo quer apresentar suas obras. Essa proposta suprime o direito de informações essenciais ao eleitor sobre a gestão". O fato é que Lula pretende mostrar obras, estradas, a construção da refinaria no Nordeste, as obras de transposição do São Francisco, as ações do Bolsa Família. Já a oposição que mostrar cenas das CPIs na TV. Além de parecer impossível prosperar qualquer votação referente à reforma política, Aldo também terá dificuldades de unificar os partidos de governo e oposição em torno de uma agenda positiva comum para a Câmara. O PFL avisou que vai exigir a inclusão do projeto que prevê a autonomia do Banco Central nesta lista de prioridades. O tema fragmenta ainda mais uma base aliada já destroçada. O presidente da Câmara, que precisou dos votos do PL, PP e PTB para ser eleito, sentirá na pele as dificuldades de negociar com a oposição. "Ficamos na mão desses partidos. Negociar uma aliança com o PMDB e com o PSDB é coisa para longo prazo", definiu um petista, reconhecendo erros de estratégia do governo Lula nos últimos dois anos e meio ao não viabilizar uma aproximação política estratégica com os tucanos. Agora, com 2006 na pauta, parece ser tarde demais.