Título: Marinho apresenta dossiê dos Correios
Autor: Mauro Zanatta
Fonte: Valor Econômico, 30/09/2005, Política, p. A10

Crise Ex-chefe de departamento diz que corrupção começou no governo anterior e ainda existe

O pivô das denúncias de corrupção nos Correios, o ex-chefe de departamento Maurício Marinho, voltou ontem à CPI para apresentar aos parlamentares um dossiê de 300 páginas com detalhes de irregularidades nos contratos e licitações da estatal, um organograma dos comandantes do esquema de arrecadação de dinheiro de empresas para partidos políticos e das minúcias dos jogos de poder e influência na empresa. Em sessão secreta, Marinho disse que tinha 200 contratos sob sua gestão. E citou alguns casos de favorecimento a fornecedores, superfaturamentos, corrupção, desvio de recursos e tráfico de influência de funcionários e diretores da estatal. Segundo ele, esses casos resultariam em prejuízos anuais de R$ 4 bilhões aos cofres públicos. Apenas nas franqueadas, o prejuízo somaria R$ 1 bilhão por ano. Marinho afirmou, segundo parlamentares, que o esquema de corrupção nos Correios ainda não foi desmontado com a substituição dos diretores. "Ele insinuou que o esquema continua e que a atual direção faz parte do mesmo grupo, seria subordinado à diretoria afastada", afirmou o relator da CPI, Osmar Serraglio (PMDB-PR). O ex-funcionário dos Correios reafirmou declarações feitas ao Ministério Público Federal entre fim de junho e meados de julho. Segundo o senador Alvaro Dias (PSDB-PR), Marinho revelou a existência de um "esquema de agrado" a diretores e ocupantes de postos-chave na estatal. O pagamento de propinas seria usado para alimentar as campanhas eleitorais do PT, PTB e PMDB. Marinho admitiu ter recebido R$ 20 mil de "agrados" e acusou o empresário Arthur Waschek Neto, que teria mandado gravá-lo ao embolsar R$ 3 mil de propina, de "dar" R$ 300 mil para livrar-se de uma multa de R$ 1 milhão. Ele teria prometido R$ 40 mil ao Marinho pela "ajuda". Ele admitiu ter recebido dinheiro das empresas Polycart, Incomir, ELC/Starlock e Multiforma para ajudar a "vender" seus produtos na empresa. No jogo de versões e interesses, a oposição também saiu chamuscada. Serraglio e a senadora Ideli Salvatti (PT-SC) afirmaram que Marinho disse que a corrupção nos Correios surgiu no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), sobretudo na gestão do ex-presidente Hassan Gebrim, que assumiu os Correios em 2000. Nesse período, segundo ele, a empresa passou por drásticas mudanças tecnológicas e de procedimentos internos que "abriram as portas" a favorecimentos, especialmente de empresas multinacionais. Gebrim, muito ligado aos ex-ministros Pimenta da Veiga e Sérgio Motta (já falecido), ocupou outros cargos no governo FHC, como a presidência da Brasilcap. Nos Correios, sucedeu Egydio Bianchi. Ao sair, Bianchi acusou Pimenta da Veiga de favorecer empresas de transporte de cargas nos Correios e de dirigir verbas publicitárias para empresas de Minas Gerais. O atual escândalo político atingiu empresas aéreas Skymaster Airlines e Beta e as agências de publicidade do mineiro Marcos Valério de Souza, acusado de operar o pagamento do mensalão no Congresso. Marinho enumerou licitações dirigidas para a aquisição de furgões aos Correios. A Fiat teria sido, segundo disse, favorecida numa licitação de R$ 34,02 milhões para a compra de 1.050 furgões de 600 kg em 2004. O preço de referência de cada veículo seria de R$ 31,776 mil e a Fiat teria ganho com R$ 32,4 mil - antes, havia ofertado R$ 34,9 mil. "Isso foi apresentado no dossiê", disse o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR). Em outro certame, para 117 furgões de 1,5 tonelada, a Fiat teria ganho da proposta da Renault por apenas R$ 50 de diferença unitária num valor de R$ 62,6 mil por veículo. Em outro caso, segundo a senadora Heloisa Helena (PSol-AL), Marinho teria afirmado que um edital exigiria uma diferença de dois centímetros no tamanho do carro para privilegiar outra empresa. Em seu depoimento, que durou cerca de quatro horas, Marinho citou irregularidades na Politec, que teria conseguido de forma irregular a prorrogação e o aditamento de 25% nos contratos da empresa. Marinho acusou um ex-assessor de Hassan Gebrim de ser dono da Politec. Na sessão de ontem, o ex-funcionário apontou a Novadata e o Positivo, vencedores de licitações em 2002, de terem sido beneficiadas por superfaturamento de 30% sobre os preços de referência. Também acusou a Xerox do Brasil de ter sido beneficiada por uma licitação com preços 35% superiores aos oferecidos pelo mercado para serviços de reprografia. Marinho apontou uma redução irregular de uma multa aplicada à IBM de R$ 1,54 milhão para apenas R$ 6 mil por influência do ex-diretor de Tecnologia dos Correios, Eduardo Medeiros, indicado pelo PT. Ele também acusou a Contax, que comandava a central de atendimento aos clientes, de favorecimento. O depoimento de Marinho também inclui a Raicom Uniformes, que teria prometido pagar propina, e as empresas CTIS e Policentro, que teriam sido beneficiadas por "acertos" com Medeiros e o ex-presidente Airton Dipp.