Título: Oposição faz romaria a bispo em greve de fome contra transposição
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 03/10/2005, Política, p. A6

A capela no sertão pernambucano escolhida pelo bispo de Barra (BA), frei Luiz Flávio Cappio, 58, para cumprir sua promessa de greve de fome contra a transposição das águas do rio São Francisco tornou-se ponto de romaria não apenas de fiéis em busca de benção, mas também de políticos de oposição ao governo. Em oito dias de jejum, Cappio já abraçou e apertou as mãos dos senadores Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), César Borges (PFL-BA) e Heloísa Helena (PSOL-AL), do governador baiano Paulo Souto (PFL), além de deputados federais, estaduais, prefeitos e vereadores. Terça-feira, aniversário do religioso, do rio São Francisco e também dia do santo, está prevista a chegada a Cabrobó (600 km de Recife), onde fica a capela, de uma caravana com 30 ônibus, comandada pelo governador de Sergipe, João Alves (PFL). Cappio, que sempre fez campanha para o PT, disse que sua decisão "não tem colorido partidário". "Eu quero acolher todos e fazer com que lutem por essa causa (oposição ao projeto de transposição). Se estão se aproveitando, é problema deles", declarou. Para o arcebispo de Feira de Santana (BA), Itamar Vian, representante da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), que visitou Cappio, "isso sempre aconteceu e sempre acontecerá", afirma. "O Evangelho diz que o trigo anda sempre junto com o joio." Em jejum desde o dia 26 de setembro, Cappio afirmou que não viajará a Brasília para conversar com Lula, conforme sugeriu o presidente em carta entregue ontem ao religioso. Ele reafirmou a disposição de só voltar a comer com a revogação do projeto do governo. Os fiéis, na maioria mulheres e crianças, aguardam em fila, sob o sol forte do sertão. O bispo os recebe sentado em uma cadeira branca, de plástico. Encostados na parede, homens e mulheres, com terços nas mãos, cantam hinos religiosos enquanto as bênçãos são distribuídas. Pessoas simples com muletas nos braços e bebês de colo beijam as mãos do frei. "Vou ficar brilhando de tanto afago", brinca. Do lado de fora, fiéis choram de emoção. "É triste pensar que em pouco tempo o bispo e o rio podem deixar de existir", diz, com lágrimas nos olhos, a professora Simoneide Rodrigues, 29. O frei registrou em cartório sua disposição de manter a greve de fome até a morte, caso a transposição não seja arquivada. Hoje ele foi submetido pela a um exame clínico. Sua pressão arterial estava normal.