Título: Cresce interesse pelo mercado de créditos de carbono
Autor: Rodrigo Bittar
Fonte: Valor Econômico, 05/11/2004, Brasil, p. A-5

Consultoras e certificadoras que atuam no âmbito do Protocolo de Kyoto percebem um aumento na demanda por serviços após a decisão da Rússia de ratificar o tratado internacional, no mês passado. Elas estão sendo procuradas por empresas dispostas a entrar no mercado internacional de crédito de carbono e disputar um mercado que pode chegar, só no caso do Brasil, a US$ 1 bilhão anual entre 2008 e 2012, período de vigência da primeira fase do protocolo. Para disputar os recursos, as empresas precisam comprovar, por meio de certificado reconhecido internacionalmente, que reduziram a emissão de gases poluentes. As consultorias são procuradas para prospectar negócios e orientar a implantação de projetos "limpos". O mercado de crédito de carbono começa a pressionar o Banco Central e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para que regulamentem um título brasileiro - espécie de Ecobond - que poderá ser comercializado mundialmente. A "commodity ambiental" também não está formatada internacionalmente, mas o governo já sofre críticas pela lentidão no processo interno. "Até hoje não existe um estudo do governo sobre a quantidade de recursos que poderá entrar no país e ninguém se movimenta para estruturar o mercado local", reclama um ambientalista. O Banco Central informou que não houve demanda pela criação do novo papel. Já Suli Fontaine, superintendente de Desenvolvimento de Mercado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), informou que há um acompanhamento direto do assunto. Ele salientou, no entanto, que "não se cria um mercado por decreto" e a CVM espera uma maior clareza interna e externa das necessidades para a estruturação desse mecanismo. José Gonsales Miguez, coordenador-geral da área de Mudanças Globais do Clima no Ministério da Ciência e Tecnologia, não arrisca um potencial de mercado, mas considera a Índia e a China os dois principais concorrentes do Brasil pelos dólares que serão movimentados pelo Protocolo de Kyoto. Ambos, destaca o técnico, têm base energética estruturada na queima do carvão, muito mais poluente do que as hidrelétricas brasileiras. São, portanto, mais atraentes para o mercado que visa a despoluição ambiental. Miguez é o representante do Grupo da América Latina e Caribe no Conselho Executivo do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), instrumento que prevê que países desenvolvidos possam comprar reduções certificadas de emissões de países em desenvolvimento financiando projetos "limpos". Caio Silva, presidente da TÜV Rheinland do Brasil - certificadora com matriz na Alemanha - diz que há uma série de regras que ainda precisam ser estabelecidas entre os países para os procedimentos de certificação, mas cobra do governo a regulamentação "fiscal e tributária do certificado para que o papel possa ser negociado em bolsa". Independentemente do Protocolo de Kyoto, Adriano Ferreira de Sousa, gerente da área de Finança Corporativa da consultora Deloitte, lembra que os principais países da União Européia já assumiram o compromisso de colocar o MDL em prática a partir de 1º de janeiro do ano que vem. "O mercado de novos projetos ambientalmente corretos deverá crescer muito, no Brasil e no mundo", atestou. Prova disso, considera a diretoria da Deloitte Touche Tohmatsu, foi a aprovação, por parte do governo brasileiro dos dois primeiros projetos de MDL desenvolvidos no País. Ambos são relacionados a melhorias em aterros sanitários: Projeto Nova Gerar e Projeto Vega. Os dois deverão reduzir, em 20 anos, suas emissões em 30 milhões de toneladas equivalentes de gás carbônico, podendo representar no mercado de créditos de carbono um valor de cerca de US$ 150 milhões. Embora o Protocolo de Kyoto não tenha entrado em vigor, nos cinco primeiros meses de 2004 foram negociados 64 milhões de toneladas de carbono em todo o mundo, montante próximo aos 78 milhões de todo o ano passado.