Título: A indústria informa melhor, mas não diz tudo
Autor: Alex Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 05/11/2004, EU &, p. 4
Outro dado econômico que o Banco Central acompanha de perto é o uso da capacidade instalada na indústria. Nessa área, o Brasil tem maior tradição: a série estatística do indicador, calculado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), começa em 1966. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) calcula um indicador semelhante, que atende aos padrões internacionais. Mesmo assim, os números não dizem tudo o que o BC gostaria de saber para tomar suas decisões de política monetária. Os dois levantamentos são feitos mais ou menos da mesma forma: em questionários enviados às empresas industriais, pede-se que informem, numericamente, quanto da capacidade instalada está sendo usado. Em outubro, pelo levantamento da FGV, o percentual atingiu 86,1%, maior valor para o mês desde 1976. "O problema desse tipo de levantamento é que produz números supostamente precisos para algo que é muito difícil de estimar", afirma o economista Júlio Sérgio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). O chefe do Departamento Econômico da CNI, Flávio Castelo Branco, reconhece que há um certo grau de subjetividade nas respostas dadas na pesquisa. "É claro que o encarregado de responder a esse tipo de questionário tem uma boa noção de quanto a empresa pode produzir", afirma. "Mas os critérios usados na resposta a esses questionários são diferentes em setores e em empresas." O indicador, segundo ele, tem sua importância, não em termos absolutos, mas para definir tendências. "Basicamente, a mesma pessoa responde às perguntas, por isso podemos ter uma idéia apurada da evolução do uso da capacidade." Além de aspectos metodológicos, há o fato de essas pesquisas não revelarem a possibilidade de expansão da capacidade produtiva - no curto ou no longo prazo. Gomes afirma que, em uma empresa que trabalha em turnos múltiplos - casos da siderurgia e da petroquímica, por exemplo - a possibilidade de haver expansão da produção no curto prazo é próxima de zero. O quadro é diferente, entretanto, em setores que trabalham em turno único, como acontece com vestuário e calçados. "Há sempre margem para ampliar a produção, seja por horas extras, turnos múltiplos ou uso mais intenso das máquinas", diz Gomes. A importação também é uma válvula de escape para as restrições de oferta. Num prazo mais longo, a capacidade de produção é, por definição, um pouco mais elástica, pois pode ser ampliada com investimentos. Esse é um dado importante, principalmente se for considerado que outubro marca o fim do pico sazonal do uso da capacidade instalada. Daqui por diante, a tendência é de queda sazonal no uso da capacidade instalada, o que dá um fôlego adicional para a maturação dos investimentos. Fatores como esses não são ignorados pelo BC em suas decisões de política monetária. O problema é que mecanismos para aumentar a oferta no curto prazo, como contratação de horas extras, têm custos mais elevados - o que leva à aceleração da inflação. O uso desses artifícios para ampliar a produção no curto prazo é um sinal de que se começa a superar o nível de utilização da capacidade instalada que não acelera a inflação. Ou seja: a indústria só produz mais com preços mais elevados. No longo prazo, o BC também admite a possibilidade de haver expansão. Entende, apenas, que o acréscimo está ocorrendo em um ritmo menos forte que o necessário para atender o nível de demanda corrente. (AR)