Título: Abrapa espera retaliação de 'bilhões' contra EUA
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 05/10/2005, Agronegócios, p. B12

A nova demanda de retaliação do Brasil contra os Estados Unidos na briga do algodão chega amanhã à Organização Mundial do Comércio (OMC). O presidente da Associação Brasileira de Produtores de Algodão (Abrapa), Jorge Maeda, acredita que Brasília pedirá o direito de retaliar os Estados Unidos no equivalente a cerca de US$ 3 bilhões. "Estou muito contente", disse Maeda, após receber ontem em Zurique telefonema do chefe da divisão de contenciosos do Itamaraty, conselheiro Roberto Azevedo, falando sobre a cifra. Mas o diplomata disse em Brasília que o cálculo não tinha sido fechado. Antes do telefonema, Maeda endurecera o discurso: "Celso Amorim (ministro das Relações Exteriores e o negociador comercial chefe) tem que ouvir mais o setor privado. Está faltando às autoridades serem mais brasileiras. O Brasil não deve aceitar acordo agrícola algum em Hong Kong se os EUA não retirarem os subsídios ao algodão". Também presente em Zurique para apoiar uma apresentação do algodão brasileiro a investidores e importadores europeus, o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, considerou que será "estúpido" ir à conferência da OMC, em dezembro em Hong Honk, debater abertura dos mercados agrícolas, se os Estados Unidos não implementarem até lá o que já foi determinado pela OMC no caso do algodão. Para evitar a "desmoralização" da OMC, Rodrigues espera um "cronograma claro e aceitável" dos EUA para retirar os subsídios que afetam os produtores brasileiros, ainda mais num ano em que os preços estão particularmente baixos. A cotação está, há doze meses, 12% abaixo do preço mínimo. A área plantada pode cair mais de 20% no Brasil. "É por isso que não podemos fazer um acordo agrícola medíocre", afirmou. Para o especialista em comércio internacional, Pedro Camargo Neto, que foi central na abertura do caso do algodão, "uma má reação brasileira no caso do algodão detona nossa posição agrícola em Hong Kong. Não podemos entregar ". A nova demanda de retaliação surgiu porque os EUA não retiraram até o dia 21 de setembro os subsídios domésticos, condenados pela OMC, que afetam os produtores brasileiros. No caso de subsídios proibidos à exportação, Brasília já tinha solicitado direito de retaliar em US$ 3 bilhões, mas a demanda está congelada na OMC até o fim do acordo entre os dois países. Em Zurique, o humor do ministro Roberto Rodrigues oscilou do entusiasmo à frustração em poucas horas. Numa palestra para investidores e banqueiros, destacou o potencial da agricultura brasileira, dizendo que o país é "campeão" mesmo reconhecendo "que é difícil ser agricultor" no Brasil "com um terço do faturamento indo para impostos e outro terço aos bancos". Mais tarde, em entrevista, não escondeu o desânimo com a valorização do real, as altas taxas de juros, falta de dinheiro no ministério para pesquisa e investimentos. Reconheceu que pedir demissão já lhe passou pela cabeça, mas que "a esperança é maior". Para o ministro, a crise agrícola atual, que reduziu em R$ 17 bilhões a renda do setor este ano, é maior que a crise política no governo. "Com o câmbio em que está, não há ação que resolva", queixou-se. Disse que pede dinheiro adicional desde o ano passado ao governo. "Fico frustrado, mas entendo porque o cobertor é curto". Rodrigues calcula que a área plantada de grãos este ano no Brasil cairá 5% porque os custos de produção subiram, os preços caíram, a dívida aumentou e a seca derrubou a produção. A estimativa de Rodrigues é de que a produção chegue a 120 milhões de toneladas em 2005/06, quase 8 milhões acima do ciclo anterior.