Título: Gtech apresenta à CPI lobistas que defenderam contrato da CEF no governo
Autor: Daniel Rittner
Fonte: Valor Econômico, 06/10/2005, Política, p. A10

O advogado Enrico Gianelli, contratado pela Gtech para fazer a costura jurídica do contrato de R$ 650 milhões com a Caixa Econômica Federal, entregou ontem à CPI dos Bingos um mapa detalhado que a multinacional americana desenhou, no início de fevereiro de 2003, para organizar ações de lobby junto ao primeiro escalão do governo Lula. A planilha, em forma de organograma, foi preparada pelos principais executivos da Gtech no Brasil e citava o nome de cinco ministros, do ex-subchefe da Casa Civil Waldomiro Diniz, de diretores da CEF e do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Encabeçavam o mapa o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o então presidente do Senado, José Sarney. Ao lado de cada um dos ministros, estavam os nomes de lobistas que poderiam ajudar em uma tentativa de aproximação, grafados em vermelho. O lobista aventado para chegar a Lula e Sarney foi Afrânio Nabuco, um nome que surgiu pela primeira vez ontem, no caso Gtech. Contratado pela empresa, Nabuco obteve sucesso em aproximar os executivos da multinacional com o presidente da CEF, Jorge Mattoso. A revelação, feita por Gianelli, foi confirmada por Marcelo Rovai, ex-diretor comercial da Gtech, em acareação na CPI com os principais suspeitos no episódio de renovação do contrato, em abril de 2003. Não há registros de contatos da Gtech com Lula ou com Sarney. Tudo indica que a multinacional optou por cercar ministros influentes. Nas primeiras semanas de 2003, conseguiu encontros com os ministros José Graziano da Silva (Segurança Alimentar) e Gilberto Gil (Cultura). Para a aproximação com Graziano, foi contratada uma advogada americana chamada Kelly, que trabalha no escritório de lobby mantido nos Estados Unidos pelo ex-secretário de Estado Henry Kissinger. Ela conhecia funcionários do ministério ocupado por Graziano, segundo Gianelli. O ex-diretor comercial da Gtech, Marcelo Rovai, confirmou a informação durante acareação ontem, na CPI, entre os principais envolvidos no escândalo. Rovai disse que a empresa teve uma audiência com Graziano, em janeiro de 2003, para fazer uma contribuição ao Fome Zero. Também falou com Gilberto Gil, com a intermediação de Leonardo Brant, diretor do Instituto Gtech. "O objetivo era falar com ele sobre loterias", reconheceu, afirmando que eram conversas para mostrar ao governo a importância do contrato com a CEF. Dois ministros ocupam lugar de destaque na planilha: José Dirceu (Casa Civil) e Antonio Palocci (Fazenda). Dirceu era apontado no mapa como padrinho político de Mattoso, que, por sua vez, responde formalmente a Palocci. A Gtech acusa Waldomiro e o advogado Rogério Buratti de terem achacado a empresa na renovação do contrato, em abril de 2003. Waldomiro é mostrado no organograma como um meio de chegar a Dirceu, mas não há referência a Buratti. "Sabemos que a Gtech pagou propina. Só não sabemos se foi para um, dois ou até três setores diferentes do governo", afirmou o relator da CPI, Garibaldi Alves (PMDB-RN). Rovai vem dizendo em seus depoimentos, e repetiu ontem, que Waldomiro havia ligado "quatro vezes" à Gtech sem dar seu sobrenome, nas primeiras semanas de 2003, e apresentando-se apenas como "representante do governo brasileiro". Segundo ele, a empresa não retornou as ligações porque não sabia de quem se tratava. A acareação marcou uma importante contradição. Waldomiro já era mostrado no mapa feito pela Gtech, e executivos da empresa se encontraram com ele em um hotel de Brasília, em 13 de fevereiro. Todos afirmam que, naquela ocasião, o contrato com a CEF não foi tratado. O intermediador do encontro foi o empresário Carlos Cachoeira - que, no organograma, estava como o possível contato com Waldomiro. O motivo que fez Waldomiro aceitar reunir-se com a Gtech, não ficou claro. Rovai disse que recebeu o pedido de encontro por meio de Cachoeira. Waldomiro sustentou a versão de que pediu a Cachoeira que intermediasse a reunião porque foi advertido pelo próprio empresário de jogos de que a Gtech estava usando indevidamente o nome dele em iniciativas de lobby. Cachoeira desmentiu Waldomiro. "Que desfaçatez!", disse, antes de partir para o ataque. Ao ser questionado pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) sobre qual teria sido a intenção da conversa com a Gtech, Cachoeira debochou: "Achacar. Que ele sempre pedia propina para um e outro, isso pedia".