Título: Decretos prevêem proteção temporária
Autor: Raquel Landim
Fonte: Valor Econômico, 07/10/2005, Brasil, p. A6

Os dois decretos publicados ontem pelo governo regulamentando a adoção de salvaguardas para a indústria brasileira contra a importação de produtos chineses prevêem tanto um prazo de negociação com o governo chinês como a adoção de proteção temporária, para têxteis e demais produtos. No caso dos têxteis, as consultas ao governo chinês dependem da imediata limitação das vendas para o Brasil. O crescimento das exportações chinesas não pode passar de 7,5% da quantidade importada durante os primeiros doze meses dentro dos quatorze meses que precedem as consultas. Nos demais produtos, uma proteção temporária pode durar até 200 dias, mas será precedida de conversas com os chineses. O ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, acredita que as pressões de alguns setores da indústria reivindicando proteção contra as importações chinesas vão aumentar a partir de agora. Na sua previsão, os processos devem levar, no mínimo, 60 dias. O processo de investigação só começa a partir de um pedido de salvaguardas. A partir da petição inicial, o Departamento de Defesa Comercial (Decom) do Ministério do Desenvolvimento vai iniciar uma investigação, observando, em cada caso, a participação das importações chinesas no mercado brasileiro e a velocidade do crescimento dessa participação. A decisão final cabe aos ministros que integram a Câmara de Comércio Exterior (Camex). O governo publicou, ontem, os decretos 5.556 e 5.558. O primeiro regulamenta os pedidos de proteção para qualquer setor que se sentir prejudicado por importações oriundas da China e os pedidos podem ser feitos até 2013. O segundo (5.558) trata especificamente do setor têxtil e expira em 2008. Para os demais produtos, o processo de investigação pode durar até oito meses. Para os têxteis, o prazo é de quatro meses. Para ambos, as salvaguardas, se adotadas, virão na forma de cotas ou aumento da tarifa de importação. Segundo o ministro do Desenvolvimento, as minutas dos dois decretos foram preparadas antes da sua viagem à China e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou que, antes, Furlan deveria para tentar um acordo. Se não fosse possível um consenso, os decretos seriam publicados. No final de maio, os sete ministros da Camex decidiram, por unanimidade, que o país deveria regulamentar as salvaguardas para, em determinadas condições, permitir a proteção dos produtores nacionais contra as importações da China. Nos próximos 45 dias, Furlan espera reunir-se novamente com o ministro do comércio da China, Bo Xilai. Ele acredita que os decretos não abalam a relação Brasil-China e não faz sentido qualquer tipo de retaliação por parte dos chineses. Na viagem que Furlan fez recentemente à China, as negociações do setor têxtil foram as que contaram com mais boa vontade da parte dos governantes. Quanto ao restante, os chineses foram mais reticentes. Produtores de calçados, brinquedos, alguns segmentos eletro-eletrônicos e determinados bens de capital reclamam das conseqüências das importações chinesas. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, não acredita que a China irá retaliar o Brasil por conta da regulamentação das salvaguardas. "Estamos nos valendo de um direito que é assegurado na OMC. Fizemos a mesma coisa que os Estados Unidos e a União Européia", disse Amorim. "Ninguém pode retaliar pode exercer um direito. Seria um absurdo, voltaríamos a lei da selva", completou o ministro, em entrevista coletiva em São Paulo após participar de seminário na associação comercial do Estado. Amorim descartou a possibilidade de a regulamentação das salvaguardas provocar atritos entre Brasil e China e prejudicar a parceira dos dois países às vésperas da reunião ministerial de Hong Kong, que acontece em dezembro. Esse encontro é crucial para a Rodada Doha, da OMC. Brasil e China são parceiros no G-20, grupos de países em desenvolvimento que pede o fim dos subsídios agrícolas. "Não é só do interesse do Brasil que a China esteja no Brasil. Também é interesse da China", disse. Em entrevista coletiva concedida ontem em Brasília, Furlan criticou a pressão que o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, fez pela publicação dos decretos. O ministro disse que as associações setoriais nacionais têm mais capacidade técnica para lidar com fatos e dados de cada mercado. "Não precisamos de interlocutores", avisou. Procurado pelo Valor, Skaf disse que a Fiesp vem pressionando técnica e politicamente desde que o governo brasileiro anunciou que reconheceria a China como economia de mercado. Essa decisão, na sua opinião, foi equivocada. (colaborou RL, de São Paulo)