Título: Para Meirelles, juro alto não valoriza o real e nem faz dívida pública subir
Autor: Alex Ribeiro
Fonte: Valor Econômico, 07/10/2005, Finanças, p. C2

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disse ontem em depoimento no Congresso que não há, por enquanto, limite para a compra de dólares no mercado de câmbio para reforçar as reservas internacionais. Questionado por parlamentares sobre a recente valorização do câmbio, ele sustentou que ela decorre do fluxo de dólares do comércio exterior, e não da atração de capitais de curto prazo. Também procurou minimizar o impacto negativo da taxa básica de juro sobre a dívida pública. Meirelles disse que, neste momento, o BC não pretende limitar o acúmulo de reservas, como fez o México em 2003. Mas sinalizou que isso poderá vir a ocorrer no futuro. "A boa prática diz que, quando um governo conclui que as reservas atingiram um volume adequado, isso seja comunicado a posteriori", afirmou. "No momento que isso acontecer, se acontecer, vai ser anunciado." Em 2003, o México anunciou mecanismos para reduzir o acúmulo de reservas (na época, elas se encontravam em US$ 50,8 bilhões). A justificativa apresentada na ocasião pela autoridade monetária daquele país (o Banco do México) era que o acúmulo de reservas tem um custo, representado pela emissão de títulos públicos para bancar a aquisição de moeda estrangeira. O presidente do BC prestou depoimento em sessão conjunta de várias comissões da Câmara e do Senado, para fazer a prestação semestral de contas sobre as políticas monetária, creditícia e cambial prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal. Também estava presente o diretor de Política Econômica, Afonso Bevilaqua, que não respondeu diretamente a nenhuma das perguntas dos parlamentares, mas municiou Meirelles com bilhetes. Meirelles apresentou aos parlamentares o balanço do BC do primeiro semestre, que registrou um prejuízo de R$ 11,617 bilhões. Segundo ele, o resultado decorre, sobretudo, da valorização cambial no primeiro semestre, que reduziu o valor das reservas internacionais, quando expressas em reais. Mas ele sustentou que, quando o resultado é visto de forma consolidada, incluindo o Tesouro Nacional, não houve perdas. De um lado, o BC registra um resultado positivo, pela queda das reservas expressas em reais; de outro, o Tesouro registra um ganho, pela redução de sua dívida externa, também quando convertida em reais. De qualquer forma, desde a crise das eleições presidenciais de 2002 não é registrada perda dessa magnitude. Naquele época, porém, o BC tinha mais passivos - títulos e swaps cambiais - do que ativos em dólares, por isso foi afetado pela desvalorização do câmbio. De lá para cá, o passivo em dólar do BC foi reduzido drasticamente. Meirelles levou gráficos para sustentar a tese de que a recente apreciação do câmbio se deve aos fluxos de dólares do comércio exterior, e não de capitais de curto prazo que entrariam no país atraídos pelos altos juros vigentes. "O principal fluxo de dólares ao país é o do comércio exterior, que aumentou US$ 3 bilhões no primeiro semestre, na comparação com (o mesmo trimestre) do ano passado", disse o presidente do BC. "O comércio é muito mais importante que a o fluxo financeiro, que é influenciado pelas taxas de juros." O presidente do BC procurou ainda minimizar o impacto da alta taxa de juros sobre a dívida pública. Para ele, a política monetária austera tem contribuído para garantir que a dívida líquida do setor público siga sua trajetória de queda. Seu argumento é que o débito depende não só do gasto com juros, mas também das expectativas dos agentes econômicos, da taxa de inflação, do câmbio e do crescimento sustentado da economia - que são beneficiados pela política monetária. "A política monetária contribui para formar expectativas favoráveis, que ajudam o Tesouro a vender títulos prefixados com taxas menores", disse Meirelles. Sobre a política creditícia, Meirelles foi questionado se, com o excesso de propaganda do empréstimo consignado, trabalhadores e aposentados não estariam sendo levados a uma situação de excesso de endividamento. "Boa parte do crédito consignado está sendo usado para quitar dívidas com taxas de juros mais altas, como cheque especial", disse. "De qualquer forma, é importante que não haja publicidade enganosa. O Congresso está analisando um projeto que dá ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) poderes para verificar se a publicidade dá a melhor informação aos consumidores." O presidente do BC foi cobrado por parlamentares pelo aumento da dívida bruta do governo geral (DBGG), que subiu de 64,4% para 74,2% do Produto Interno Bruto (PIB) de 2000 a 2005. Segundo ele, esse conceito de dívida bruta exclui o BC e as empresas estatais. Assim, na dívida bruta não é abatido o volume de títulos do Tesouro que são mantidos pelo BC e pelas empresas estatais. Também ficam de fora as reservas internacionais. "Se o Tesouro emite um título no exterior, o dinheiro vai para as reservas", diz Meirelles. "Do ponto de vista de dívida líquida, a operação tem efeito neutro. Mas leva ao aumento da dívida bruta."