Título: Senado dá prazo para 'farra' do IR
Autor: Josette Goulart
Fonte: Valor Econômico, 07/10/2005, Legislação & Tributos, p. E1

MP do Bem Emenda estabelece que planejamento tributário pode ser feito até conversão em lei

A expressão "efetivada a partir da entrada em vigor desta lei", que aparece na última emenda proposta pelo Senado para a Medida Provisória nº 252 - a MP do Bem - não aparenta importância se for levado em consideração que a norma vai alterar mais de 30 leis. Mas a expressão, inserida no artigo 37 do projeto de lei de conversão da MP, vai significar uma perda de arrecadação em imposto de renda estimada em pelo menos R$ 5 bilhões. E grande parte desse imposto deixará de ser pago por empresas que teriam plenas condições de caixa para suportar a carga tributária. O artigo 37 da MP diz respeito ao artigo 36 da Lei nº 10.637, de 2002, que permite um planejamento tributário fabuloso para as empresas. O governo fez uma tentativa, no projeto de lei de conversão da MP aprovado pela Câmara dos Deputados, de não só revogar o dispositivo como também tributar as empresas que se aproveitaram da brecha aberta pelo então secretário da Receita Federal, Everardo Maciel. Pelo texto que chegou ao Senado, quem havia feito o planejamento pagaria o imposto a partir do ano que vem em até cinco anos. Mas o Senado alterou o artigo 37 da MP incluindo a expressão, o que significa que as empresas que já fizeram o planejamento ou o fizerem até a entrada em vigor da lei ficam isentas do pagamento. A alteração trouxe trabalho para o fim de semana dos advogados tributaristas, que vão correr para terminar planejamentos já em curso. O advogado Alessandro Amadeu da Fonseca, do escritório Mattos Filho, diz que tudo tem que estar pronto até o dia 13 de outubro, quinta-feira, prazo final para a medida virar lei. Mas as empresas ainda terão o benefício da retroatividade do ato societário, ou seja, mais 30 dias para registrar as incorporações na junta comercial. Basicamente, o artigo 36 da Lei nº 10.637 permite que as empresas façam reavaliação de capital, sem pagar imposto de renda sobre os ganhos auferidos com essa valorização. Basta criar uma nova empresa para isso. Depois, faz-se uma incorporação dentro do mesmo grupo e o ágio criado pela reavaliação pode ser deduzido do imposto de renda. De acordo com o advogado Eduardo Fleury, do Monteiro, Neves e Fleury, o texto que chegou ao Senado afetava as empresas que já tinham feito o planejamento amparadas pela lei, e que agora foi feita apenas uma correção. Mas Fleury diz que o dispositivo da Lei nº 10.637 reduziu a zero o imposto de renda a pagar de muitas empresas donas de caixas muito bem abastecidos. O imposto economizado fica diferido no balanço das empresas e, segundo a lei, só é cobrado quando da alienação ou venda. Além de impedir que as empresas que usaram o artifício tenham que pagar o imposto de renda, a mudança feita pelo Senado também permitirá que outras empresas façam a reavaliação de seus ativos e paguem o imposto em cinco anos. Isso porque a revogação do artigo 36 da lei do Everardo Maciel só será efetivada a partir de janeiro de 2006, como lembra o advogado Rafael Malheiro, do Braga & Marafon. Tudo isso ainda depende de aprovação da Câmara dos Deputados e depois da sanção do presidente da República. As divergências em torno da MP do bem geraram momentos de tensão ontem à noite no plenário da Câmara. Por pouco, os deputados Arlindo Chinaglia (PT-SP), líder do governo, e Inocêncio Oliveira (PL-PE), primeiro secretário da mesa, não trocaram socos. O conflito começou depois que Inocêncio criticou o texto aprovado pelo Senado, dizendo que, se aquilo não era "MP do mal" era, no máximo, "MP do mais ou menos", referindo-se a um artigo introduzido pelo substitutivo do relator, o senador governista Romero Jucá, do PMDB-RO (leia matéria abaixo). Em discurso, Inocêncio disse que o atual governo "não gosta de aposentados". Indignado, Chinaglia defendeu a MP dizendo que ela promove desoneração tributária. E acrescentou que Inocêncio deveria assumir que na verdade não queria votar a MP, que perde validade se não for aprovada até o dia 13. Diante da falta de acordo em torno dos destaques para suprimir parte da alterações feitas pelo Senado, a votação da MP ficou para segunda-feira. (Colaborou Mônica Izaguirre, de Brasília)