Título: Impasse adia votação da MP do Bem
Autor: Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 11/10/2005, Política, p. A6

Depois de superar um difícil obstáculo - a obtenção de quórum em plena segunda-feira, véspera de feriado nacional -, a Câmara dos Deputados enfrentava, no início da noite de ontem, um impasse que impediu a votação da MP do Bem, que reduz impostos em vários setores da economia. O motivo da discórdia foi a insistência do governo em incluir no texto da MP emenda que permite ao Executivo adiar, por mais de um ano, o pagamento de decisões judiciais de pequeno valor. Até o fechamento desta edição, não havia acordo na Câmara. A oposição, que não concorda com a emenda, reconheceu que cochilou na semana passada, quando a emenda foi incluída pelo relator da MP no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). O líder da minoria, José Carlos Aleluia (PFL-BA), disse que a emenda é "perversa" porque pretende deixar para o próximo governo um passivo de aproximadamente R$ 6 bilhões em sentenças de pequeno valor. "Não vamos aprovar uma emenda que prejudica os mais pobres e deixa R$ 6 bilhões em caixa para o Lula", avisou Aleluia. O deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ) disse que, durante as negociações, o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), percebeu que nem mesmo sua base de apoio estava do seu lado de forma incondicional. Chinaglia, segundo Paes, consultou o Ministério da Fazenda para saber se poderia suprimir a emenda da MP do Bem, mas recebeu instruções para insistir com o texto. Aliado do governo, o líder do PSB, Renato Casagrande (ES), confirmou a informação de Paes. Antes da reunião convocada pelo presidente da Câmara, Aldo Rebelo, para viabilizar a votação da MP, o deputado capixaba reconheceu que, sem negociar a emenda, a medida não poderia ser votada. Para piorar o quadro para o governo, o relator da MP do Bem na Câmara, Custódio Mattos (PSDB-MG), informou que seu parecer seria contrário à emenda. Isso obrigaria o governo a pedir votação nominal, em destaque. Outra alternativa do governo, segundo Mattos, seria obstruir a votação, aumentando o risco de toda a MP do Bem perder validade na quinta-feira, dia 13, quando expira o prazo constitucional para a medida ser apreciada pelo Congresso. Paes acredita que, na verdade, o governo está trabalhando para derrubar a MP. Para o deputado tucano, seria possível até mesmo aceitar a inclusão da emenda em outra MP, mas essa saída teria sido vetada pela Fazenda. Se o impasse prevalecer, a oposição teme que o Executivo atribua à Câmara a responsabilidade pelo fracasso de um pacote de desoneração de tributos, esperado ansiosamente pelos empresários. O líder do PT na Câmara, Henrique Fontana (RS), negou que a insistência com a emenda tenha o objetivo de inviabilizar um acordo na Casa. Explicou que a emenda pretende resolver um problema de Estado e não do governo. Fontana disse que é "exponencial" o crescimento do total das condenações judiciais de pequeno porte. Esse tipo de despesa tem de ser paga 60 dias após o trânsito em julgado da decisão e dispensa a expedição de precatórios. "A emenda disciplina a execução orçamentária. Tanto é assim que os senadores da oposição não fizeram essa acusação", afirmou. Uma nota técnica do Ministério do Planejamento informa que a Lei 10.259, de 12 de julho de 2001, determina que as condenações inferiores a 60 salários mínimos (R$ 18 mil) devem ser quitadas até 60 dias contados da entrega da requisição judicial. Com esse objetivo, o governo faz uma reserva no orçamento do Fundo do Regime Geral da Previdência Social (FRGPS). Essas sentenças, em sua maioria, beneficiam pessoas que moveram ações contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para obter o reajuste ou a concessão de seus benefícios. Segundo o Planejamento, até agosto, foram executados R$ 2,29 bilhões. Em 2004, foram gastos R$ 2,62 bilhões. O Conselho de Justiça Federal (CJF) projetou para o período setembro-dezembro mais R$ 1,51 bilhão. Para a proposta orçamentária de 2006, o CJF solicitou R$ 5,71 bilhões as despesas com essas sentenças. A MP do Bem foi publicada pelo governo em junho e previa, originalmente, uma série de desonerações tributárias calculadas em R$ 3,32 bilhões pelo Ministério da Fazenda. O Congresso elevou a renúncia para R$ 5,12 bilhões.