Título: Ranking revela baixo gasto com P&D no país
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 11/10/2005, Empresas &, p. B

Inovação Petrobras é exceção em lista global com mil companhias

No ranking das mil empresas que mais investem em pesquisa e desenvolvimento (P&D) no mundo, elaborado pela consultoria internacional Booz Allen Hamilton, o Brasil tem apenas um representante isolado: a Petrobras. Destinando US$ 238 milhões para esta finalidade em 2004, a estatal ocupa a posição de número 277. A lista é amplamente dominada por empresas dos Estados Unidos. A liderança é de uma americana - a Microsoft -, assim como a segunda e terceira posições, ocupadas por Pfizer e Ford Motor, respectivamente. Origem de 43,9% dos investimentos corporativos em pesquisa e desenvolvimento, a América do Norte é seguida de longe pela Europa, com 28,9%, e pelo Japão, com 24%. É preciso ter cuidado, no entanto, antes de fazer prognósticos pessimistas baseados na quase-ausência de representantes nacionais. Letícia Costa, presidente da Booz Allen no Brasil, alerta para o fato de que o trabalho é baseado em informações apenas de companhias com capital aberto, o que elimina alguns representantes do país que poderiam figurar no levantamento. O número limitado de empresas nacionais de grande porte também atrapalha, já que há correlação entre faturamento e gastos em P&D. Além disso, algumas das maiores corporações brasileiras estão em setores que investem pouco em pesquisa, como mineração e commodities agrícolas. Por fim, vale a comparação de que nenhum outro país da América Latina está na lista. E, em termos de crescimento, os atores trocam de papel: o destaque vai para o grupo composto por Coréia do Sul, Austrália, Brasil, África do Sul, Taiwan e Cingapura, com 36,7% de expansão nos gastos em P&D entre 1999 e 2004. Índia e China, juntos, cresceram 21,1% no período. Já a América do Norte ficou com 6,6%, a Europa registrou 6,2% e o Japão 4,8%. "Tudo isso precisa ser considerado, mas as empresas nacionais realmente investem pouco em pesquisa", afirma Letícia. Em entrevista ao Valor, o ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, atribuiu a baixa representatividade do país no ranking a fatores históricos e culturais. Rezende lembra que o Brasil sempre teve tradição agrária e que no século XVIII Portugal mandou fechar as fábricas da colônia que concorriam com seus produtos. A retomada só veio no século XIX, com atraso em relação a outras nações. A partir da segunda metade do século XX, as iniciativas do governo de apoiar o desenvolvimento industrial foram feitas sem conexão com a política científica e tecnológica. "Na Lei de informática de 1982, o artigo que condicionava a reserva de mercado ao investimento em pesquisa e desenvolvimento das empresas brasileiras foi vetado pelo presidente Figueiredo", lembra o ministro. "Nunca tivemos política industrial que incentivasse as companhias a investir em P&D." Rezende cita a lei da inovação e a "MP do Bem", que incentiva a contratação de mestres e doutores, como esforços recentes para mudar o quadro. Mas reconhece que as corporações nacionais que investem valores significativos em pesquisa ainda são casos isolados. Até que ponto isso é prejudicial à competitividade das companhias nacionais? O trabalho da Booz Allen mostra que não há relação direta entre gastos em pesquisa e desenvolvimento e diversas formas de medir o sucesso de uma empresa, como crescimento, lucratividade e retorno aos acionistas. "Quem desenvolveu a tecnologia de DVD foi a Philips, mas quem ganhou dinheiro foi a Sony. Não adianta apenas ter um bom produto, porque isso não vai garantir resultados", afirma Letícia. O estudo também concluiu que gastar bem é mais importante do que gastar muito. Exemplo disso é a americana Apple, que investe apenas 5,9% do faturamento em P&D - abaixo da média de 7,6% do setor de computação -, com um orçamento total de US$ 489 milhões para a área em 2004, muito abaixo de seus principais competidores. No entanto, a empresa colocou no mercado produtos inovadores como o iPod e o iTunes. "É importante ter um portfólio bem focado de investimentos e, depois de desenvolvido, o produto precisa ser trabalhado por toda a empresa para ter sucesso de mercado." Só há um indicador direto entre investimento em P&D e resultados: a margem bruta. A explicação da consultoria é que, ao criar produtos com benefícios adicionais, as companhias podem cobrar um prêmio por eles. Em outros casos, o investimento em pesquisa tem como finalidade reduzir o custo da produção, por meio, por exemplo, da substituição de materiais, o que também melhora as margens. Além disso, embora gastar mais em P&D não seja garantia de sucesso, gastar menos parece ser um erro: as empresas que estão entre as 10% que investem uma porcentagem menor do faturamento em pesquisa estão atrás de suas concorrentes em margem bruta, receita bruta, lucro operacional e retorno aos acionistas. Talvez por isso o trabalho da Booz Allen mostre que o investimento médio de seu ranking subiu anualmente 6,5% desde 1999. E o ritmo está acelerando: se contado a partir de 2002, a taxa de crescimento é de 11% ao ano. Em 2004, as mil empresas avaliadas gastaram, em conjunto, US$ 384 bilhões em pesquisa e desenvolvimento. Outra constatação é que os esforços nessa área são extremamente concentrados. As companhias que estão imediatamente fora da lista principal - as que ocupam as posições de 1001 a 2000 - investiram, juntas, US$ 26 bilhões para esta finalidade em 2004. Trata-se do equivalente a apenas 6,8% das mil primeiras.