Título: G-20 faz contraproposta e pede corte de 54%
Autor: Assis Moreira De Salamanca
Fonte: Valor Econômico, 13/10/2005, Brasil, p. A4

Relações Externas Ministros de Brasil, EUA, UE, Índia e Austrália fazem reunião extra para discutir agricultura

O G-20 aumentou a pressão para Estados Unidos e União Européia (UE) fazerem cortes reais de subsídios e tarifas, com duas propostas na Organização Mundial de Comércio (OMC). Os principais atores da negociação agrícola - Brasil, EUA, UE, Índia e Austrália - marcaram reunião ministerial extraordinária para a semana que vem em Genebra, para bater o martelo sobre acordo ou não em Hong Kong, no fim do ano. Na busca de "resultados ambiciosos e realísticos", o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, informou ontem que o grupo defenderá hoje na OMC um corte médio de 54% nas tarifas de importação de produtos agrícolas dos países industrializados e de 36% para as nações em desenvolvimento. Para alcançar esse objetivo, o G-20 defende uma fórmula com quatro bandas. Os cortes dentro das bandas variam de 45% a 75% nos países ricos e de 25% a 40% nos países em desenvolvimento, conforme o Valor antecipou. Na área de subsídios internos, o grupo focaliza seu ataque no total dos gastos agrícolas e não apenas nas subvenções que mais distorcem o comércio (caixa amarela). O G-20 propõe que a UE aceite reduzir seus gastos em 80% ao invés dos 70% que até agora os europeus colocaram na mesa. Para os EUA, quer corte de 75%, comparados aos 60% oferecidos por Washington no começo da semana. Para os outros ricos, o corte seria de 70%. Os ministros do G-20 advertiram em entrevista que só dá para fechar um acordo agrícola que assegure cortes efetivos nos gastos dos que mais subsidiam. Pelos cálculos do Brasil, a proposta levaria a UE a baixar suas subvenções dos US$ 110 bilhões atuais para US$ 22 bilhões. Nos EUA, esse montante diminuiria de US$ 47,7 bilhões para US$ 11 bilhões. Amorim destacou que o grupo está pedindo o dobro do corte efetuado na Rodada Uruguai. Dos três pilares da negociação - subsídios domésticos, subsídios a exportação e acesso ao mercado -, é o ultimo que geraria 92% dos ganhos futuros para os exportadores agrícolas, conforme estudo do Banco Mundial. O negociador comercial-chefe dos EUA, Rob Portman, voltou ontem para Washington declarando-se "desapontado" com a recusa da UE em cortar mais as tarifas. E deixou claro que se os europeus não se moverem, não é só a conferencia de Hong Kong que está ameaçada, mas toda a Rodada Doha. Segundo Portman, o que os europeus oferecem é menos ainda do que foi alcançado no último acordo agrícola, da Rodada Uruguai. Naquela negociação, o corte médio de tarifas foi de 36%. Mas ontem a UE insistiu em fazer corte médio de 24,5%. A ministra de comércio exterior da França, Cristine Lagarde, foi a Genebra ontem cedo para dizer que isso ainda é muito e acusou o comissário europeu Peter Mandelson de estar indo bem além do mandato recebido dos 25 países membros. Sob pressão, a UE anunciou ontem uma "concessão": a percentagem dos produtos sensíveis, sujeitos a menor corte de tarifas, seria reduzido de 10% para 8% das linhas tarifárias, comparado a proposta dos EUA de se limitar esses produtos a 1%. No entanto, o que Bruxelas quer significa manter altas barreiras para 160 produtos, que são os de maior interesse agrícola do Brasil, como carnes e frutas. A coreografia da negociação mudou esta semana: antes eram os EUA que estavam na corda, sob pressão para se mover em subsídios. Agora são os europeus que têm dificuldades para apresentar algo aceitável em tarifas. Rob Portman insistiu que os EUA fizeram sua parte para reativar a negociação. Ele garantiu que, ao contrário do que diz o G-20, Washington está oferecendo redução real de subsídios, "cortando nos músculos e nos ossos". O que o G-20 colocou na mesa, ontem a noite, vai na linha do que o diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, chegou a propor informalmente. É uma posição intermediária entre EUA e UE. Celso Amorim avalia que as propostas em reação aos EUA, esta semana, representam um "momento histórico" para o G-20, considerando as sensibilidades políticas internas de um grupo bastante diversificado.