Título: Intervenções da Susep se arrastam por até 40 anos
Autor: Janes Rocha
Fonte: Valor Econômico, 13/10/2005, Finanças, p. C1
Seguros Quebra da Interbrazil expõe a fragilidade da supervisão
A quebra da Interbrazil Seguradora expôs a extrema fragilidade da Superintendência de Seguros Privados (Susep) como órgão supervisor e fiscalizador. A empresa vinha acumulando irregularidades desde o ano 2000, com conhecimento da Susep que, no entanto, só decretou a liquidação extrajudicial da companhia em agosto passado, em meio a denúncias do envolvimento da Interbrazil no escândalo do "mensalão". O Superintendente da Susep, René Garcia, descarta influência política no processo e culpa a legislação, que favorece os empresários com amplos direitos de defesa em detrimento do órgão regulador, que não dispõe de instrumentos básicos para agir, como acesso a sigilo bancário e fiscal. Segundo Garcia, a Susep mantinha fiscalização sistemática sobre a Interbrazil há dois anos. Algumas das irregularidades da Interbrazil estão sendo apontadas pelos advogados de Luis Antonio de Carvalho, um ex-sócio da seguradora, que tentava na Justiça reaver o controle acionário da empresa, mas não conseguiu. "Com a liquidação da seguradora, o processo de retomada do controle acionário ficou, em tese, prejudicado", afirmou Ricardo Nacle, da Nacle e Serra Advogados, que representa Carvalho. O escritório estuda a possibilidade de ajuizar uma ação de indenização contra a Susep e os administradores da empresa, sob o argumento de que o órgão sabia da atuação irregular da companhia e não tomou nenhuma atitude. Há seguradoras sob intervenção da Susep desde 1966 e 1970 (Urano e Cia. Interestadual) e outras como a Interunion Capitalização (do empresário Arthur Falk) e a Internacional (do investidor Naji Nahas) são processos que se arrastam desde o fim dos anos 90. A dúvida que fica é: Se não consegue fiscalizar e punir as seguradoras, como a Susep vai dar conta da fiscalização do mercado ressegurador, como prevê o projeto de lei da quebra do monopólio do IRB e abertura do mercado? René Garcia responde que tem trabalhado para agilizar processos e explica que os casos mais antigos, como o da Urano, são "complexos" porque a Lei de Falências não previa critérios de intervenção e liquidação de empresas sem fins lucrativos - é também o caso do Montepio da Família Militar, do Montevan e do Clube dos Oriundos da Reserva e Reformados das Forças Armadas (Corrfa), entidades de previdência de contribuintes com vínculos militares. "A lei brasileira estabelece critérios muito rígidos para o processo. Os casos mais antigos são os mais difíceis. Nos casos mais novos nós já conseguimos reduzir esse prazo, entre decretar a liquidação e levá-la à falência, para um ano e pouco", afirmou Garcia em entrevista ao Valor. Segundo ele, alguns casos estão próximos de uma solução. Por exemplo, a liquidação extrajudicial da Internacional de Seguros em breve se transformará em liquidação ordinária, um processo em que os credores entram em acordo para resolver as pendências e nomeiam um administrador da massa falida, que pode até se recuperar e se tornar uma nova empresa. No caso da Interunion, a história é mais complicada devido a ações judiciais em curso. Segundo Garcia, o grupo Interunion tem três empresas: a de títulos de capitalização (que vendia o "Papa Tudo"), uma empresa de participações ("holding") e uma de comércio exterior ("trading"). A holding tinha 40% da capitalização e 100% da trading que, por sua vez tem uma ação judicial por não recolhimento de impostos. De acordo com o superintendente da Susep, um juiz desconsiderou a personalidade jurídica da holding e passou as pendências tributárias da trading para a capitalização, bloqueando a venda do Hotel Nacional, no Rio, que pertence à capitalização e que serviria para pagar os credores. Paralelamente, contou Garcia, "correu uma ação em Juiz de Fora (MG) de pessoas que tinham o Papa Tudo, no valor de R$ 160 mil. O juiz desconsiderou o quadro de credores e a ordem de preferência desses credores e determinou que a Interunion pagasse os R$ 160 mil, e bloqueou a venda do hotel para pagar essa conta. Depois determinou a prisão do liquidante." A procuradoria da Susep conseguiu reverter as demandas e finalmente, diz Garcia, "depois de 10 anos, vamos conseguir publicar o quadro de credores, que é o início do fim do processo". A legislação que regulamenta a intervenção em companhias de seguros, previdência e capitalização é muito semelhante à dos bancos. Derivada da atual Lei de Falências, a lei para liquidar instituições financeiras e de seguros depende ainda de uma regulamentação, que está em fase de elaboração pelos órgãos e empresas ligados a ambos os setores e depende de aprovação do Congresso Nacional. Porém, o Banco Central, que supervisiona e fiscaliza o sistema bancário, conseguiu ao longo do tempo prerrogativas que a Susep não obteve. Um exemplo é o acesso - na fase de supervisão - à movimentação bancária e fiscal das instituições financeiras, inclusive a supervisão de recursos que transitem entre empresas do mesmo grupo empresarial (o que é proibido no caso de bancos). A Susep só consegue acesso à movimentação de ativos entre empresas do mesmo grupo na fase de liquidação, ou seja, não tem uma ação preventiva. Em apenas uma das empresas em liquidação, a Geplan, a Susep conseguiu estender a liquidação da empresa para todas as coligadas e controladas do grupo. "Entendemos que estava havendo um problema de 'comunicação' entre eles, então estendemos o regime de liquidação para as outras empresas", disse. Um processo mais recente que pode ser solucionado em questão de poucos meses é o da Santos Seguros. Controlada pelo Banco Santos - liquidado pelo BC e falido pela Justiça em setembro -, a Santos Seguros está sob direção fiscal da Susep. Segundo Garcia, há um grupo empresarial interessado em adquirir a companhia e a Susep está no momento analisando o projeto apresentado pelo grupo. Garcia disse que não pode revelar o nome do interessado.