Título: Corrupção é entrave para realização de negócios em Moscou
Autor: Humberto Saccomandi
Fonte: Valor Econômico, 18/10/2005, Brasil, p. A4

Os presidentes do Luiz Inácio Lula da Silva e Vladimir Putin vão reiterar hoje, em Moscou, o objetivo de incrementar as relações econômicas entre Brasil e Rússia. Mas há um detalhe: personalidades na capital russa avisam que qualquer empresário interessado em fazer negócios na Rússia deve estar preparado para pagar suborno. "Aqui não dá para fazer negócio sem abrir a bolsa", disse ao Valor o líder do Partido liberal Yabloko e candidato derrotado a presidência da República, Gregory A. Yavlinsky. "Sem suborno a nível local, estadual e federal é quase impossível obter contratos ou fechar joint-ventures", acrescentou Elena Panfilova, diretora do Centro Para Pesquisa Anticorrupção e da Transparência Internacional. O tema da corrupção esteve no centro de debates que o Fórum Mundial de Economia organizou ontem sobre a pauta da Rússia na presidência do G-8 (grupo das maiores economias do mundo) no ano que vem. Quatorze anos depois do desmoronamento da União Soviética, a corrupção é generalizada na sociedade, no governo e no mundo empresarial russo. As estimativas sobre o custo da corrupção para a economia variam de US$ 40 bilhões a US$ 316 bilhões, equivalente a duas vezes e meia a coleta de impostos no país. Pesquisa do Banco Mundial mostra que 78% dos empresários russos são alvos de cobrança de propinas, segundo John Liwack, representante do banco em Moscou. Participantes do encontro avaliaram que a situação piorou na presidência de Vladimir Putin. A empresária Angelika Gembarskaya, diretora de uma pequena empresa, calcula que entre 5% e 10% do faturamento cobre a extorsão feita por variadas autoridades. Kiril Kabanov, responsável no Conselho de Segurança da Rússia pelo combate a corrupção, não escondia a dimensão do problema e a falta de meios para combatê-lo. O mediador do debate, Bernard Sucher, um empresário da área financeira em Moscou, considera o fenômeno na Rússia especialmente perigoso pela estreita relação entre o poder político e o mundo dos negócios. "Pode-se ficar preocupado até pela proliferação de armas", exemplificou Sucher. "Combater corrupção significa criar um Estado moderno e o regime autoritário atual não tem o menor interesse nisso", segundo Yavlinsky. Para ele, a elite russa tem interesse em "a médio e longo prazo" reforçar as relações políticas entre Brasil e Rússia. Para Sergei Karaganov, diretor do Instituto da Europa, na Academia de Ciências da Rússia, a relação com o Brasil é da maior importância estratégica "para reduzir nossa dependência econômica da Europa". Mikhail Kamynin, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, disse à agencia Novosti que Moscou tem interesse em cooperação na produção de equipamentos agrícolas, por exemplo. A Embraer estuda montar jatos ERJ-145 (de 50 assentos) na Rússia. Acima de tudo, para Alexei Pushkov, diretor da Center TV, de Moscou e um dos principais formadores de opinião no país, a Rússia quer o Brasil no Conselho de Segurança da ONU "para trabalhar juntos pelo mundo multipolar".