Título: Edemar ataca BC durante depoimento
Autor: Josette Goulart
Fonte: Valor Econômico, 19/10/2005, Legislação & Tributos, p. E1

Falências Estratégia foi a de levantar suspeitas sobre caso do Banco Rural

Vestido com um terno simples e portando uma curiosa maleta (case) de plástico em mãos, o ex-banqueiro Edemar Cid Ferreira chegou ontem para depor na 2ª Vara de Falências da Justiça paulista sorridente, simpático e muito à vontade. Na mala, uma série de documentos para apresentar ao juiz Caio Mendes de Oliveira. No repertório, os mesmos argumentos de que o Banco Central (BC) foi o grande responsável pela quebra do Banco Santos. No discurso, a novidade foram as acusações de uma suposta benevolência do BC com o Banco Rural. Enquanto Edemar seguia sua estratégia de atacar para se defender, o promotor Alberto Camiña e o administrador judicial do banco Vânio Aguiar tentaram extrair algum elemento novo para ajudar na investigação e na função de recuperar créditos, respectivamente. O promotor tentou ligar a casa e as obras de arte a Edemar com o objetivo de incluir esses elementos na massa falida, mas o ex-banqueiro estava muito bem preparado para não dar passos em falso. Negou veemente possuir quaisquer bens em seu nome. Vânio Aguiar, por sua vez, tentou descobrir de quem cobrar dívidas milionárias que foram deixadas para trás por clientes do Banco Santos. O caso mais sintomático apontado pelo ex-banqueiro é o do grupo Caoa. Segundo Edemar, a empresa possui uma dívida de "centenas de milhões de reais" com o Banco Santos. A empresa, por sua vez, alega ter feito uma espécie de compensação com o Banco Santos e que a dívida estaria quitada. Aguiar disse que enviou a Edemar uma carta da Caoa em que consta a quitação da dívida. Mas Edemar disse que não conhece as duas pessoas que assinaram a carta e que a dívida ainda existe e deve ser cobrada por Aguiar. O administrador judicial e ex-interventor e liquidante, chegou a perguntar porque então o próprio banco não executou a dívida da Caoa, e o ex-banqueiro disse não saber, mas que provavelmente foi por razões comerciais. Em depoimentos prestados na vara criminal, ex-diretores do banco disseram que havia um acordo com a Caoa e que a dívida era renovada constantemente. O "não sei" foi uma constante no depoimento de Edemar. Ele afirma que estava afastado do banco nos últimos anos e que participava apenas da estratégia da instituição, delegando as responsabilidades para seus diretores. Sem meias palavras, Edemar disse que seu banco incomodava outras instituições financeiras por seu forte crescimento e tecnologia que dispunha, e que assustou ainda mais a concorrência quando, em 2003, contratou o ex-presidente da Visa do Brasil, Ricardo Gribel, e mais uma equipe de 60 pessoas para focar no público de pessoas físicas. E que a fiscalização em seu banco foi exagerada, a partir de 2002, ainda no governo Fernando Henrique. O BC, segundo Edemar, obrigou o banco a fazer provisionamentos com classificação H, ou seja, sem possibilidade de recuperação, de empresas ainda vivas, como Hering, Eletropaulo, Light e Caoa, entre outros. Esse provisionamento comprometeu o balanço em R$ 700 milhões, gerando um déficit de caixa de R$ 100 milhões. Com isso, o Santos foi ao BC pedir para entrar no redesconto, com uma espécie de empréstimo de R$ 700 milhões que teria como garantia sua carteira de crédito de R$ 3 bilhões. Edemar diz que não só o redesconto foi negado como o diretor de fiscalização, Paulo Cavalheiro, exigiu que o ex-banqueiro vendesse o banco num curto prazo. Em seguida, o banco foi colocado sob intervenção. "Três dias depois da intervenção o BC liberou o compulsório dos bancos que nos teria dado uma folga de R$ 300 milhões", disse Edemar. As acusações contra o BC não pararam por aí. "Se o BC tivesse feito pelo Santos um décimo do que fez pelo Rural não teríamos tido problemas", afirmou. "Os personagens mineiros freqüentavam constantemente a diretoria do Paulo Cavalheiro." O Banco Central, por sua vez, mantém sua política de não comentar as acusações feitas por Edemar Cid Ferreira.