Título: Efeito Vioxx faz cair vendas de antiinflamatórios
Autor: André Vieira
Fonte: Valor Econômico, 08/11/2004, Empresas, p. B-6

Um mês depois da retirada do Vioxx, da Merck, das prateleiras das farmácias em todo o mundo, o mercado brasileiro de medicamentos antiinflamatórios sofreu um enorme revés. Mais de um terço das vendas dos inibidores da Cox-2 - classe de drogas do Vioxx - desapareceu, segundo estimativas das redes de farmácias. Alguns medicamentos da mesma família, como o Arcoxia, da própria Merck, ou o Bextra e o Celebra, da Pfizer, obtiveram mercado, mas o avanço foi incapaz de ocupar o espaço deixado pelo líder. Nem mesmo os antiinflamatórios mais antigos, os diclofenacos, tiveram ganho. Mais do que um problema localizado, a saída do Vioxx parece ter provocado abalo na credibilidade dos medicamentos antiinflamatórios no público em geral. Mas os laboratórios apostam numa reação. "É natural que aconteça isso em um período de curto prazo, mas a maior parte da classe médica continua acreditando nos inibidores da Cox-2", diz João Sanches, diretor de comunicação da Merck Sharp & Dohme, a subsidiária brasileira da empresa americana. "Apenas uma pequena minoria deixará de prescrever o remédio", acredita ele.

O Vioxx era o antiinflamatórios mais vendido em todo o país, com cerca de US$ 30 milhões em receitas, representando 13% do mercado. Foi retirado das farmácias pela Merck no dia 30 de setembro depois de pesquisas relacionarem riscos cardíacos ao uso prolongado. No Brasil, a Merck apresenta hoje o balanço sobre o reembolso dos pacientes do Vioxx. As vendas de antiinflamatórios movimentaram US$ 282 milhões nas farmácias brasileiras nos 12 meses encerrados até setembro, segundo dados do IMS Health - alta de 27% sobre o período anterior. Os dados sobre outubro, que trarão o resultado consolidado do primeiro mês sem Vioxx, só serão conhecidos daqui a 15 dias. Um relatório elaborado pelo banco UBS estimou que, das vendas totais do Vioxx, que eram de US$ 2,5 bilhões anuais, cerca de 60% seriam destinadas às duas drogas da Pfizer. Os antiinflamatórios, de um modo geral, são vendidos sob receita médica, embora os produtos mais antigos foram desobrigados de prescrição tempos atrás. Isso daria uma vantagem aos remédios tradicionais, uma vez que eles podem ser divulgados em campanhas publicitárias. No entanto, as vendas do Flanax, antiinflamatório lançado pela Roche em meados dos anos 70, caíram 10% em outubro sobre os meses anteriores à retirada do Vioxx. Além da Merck, as farmácias também estão sentido a perda. As grandes redes afirmam estar com as mãos amarradas. "Não há nada para fazer", diz o vice-presidente da Droga Raia, Eugênio Zagottis, rede com 130 farmácias em todo o país, que prevê faturar neste ano 21% acima dos R$ 465 milhões em 2003. Depois do Viagra, o Vioxx era o remédio com o maior faturamento da rede. Zagottis aposta em mudanças a longo prazo. Depois da retirada do Vioxx, os laboratórios reafirmaram sua confiança nos estudos e pesquisas clínicas, atestando a segurança de suas drogas. A Pfizer do Brasil compilou os trabalhos sobre o Bextra e Celebra e os deixou à disposição dos médicos. "Mas não tivemos muitos pedidos", diz o diretor de marketing da Pfizer no Brasil, Mariano García-Valiño. As indústrias alegam que os inibidores da Cox-2 trouxeram grandes benefícios sobre a geração anterior de antiinflamatórios. Os inibidores bloqueiam uma enzima que contribui para inflamação e dor. Seu diferencial foi reduzir os efeitos colaterais de irritação no estômago, e os laboratórios dizem que, passado o problema do Vioxx, as vantagens continuarão. "O problema não é na classe, mas particular do Vioxx", diz Valiño. Para o executivo, a recuperação do mercado dependerá do ciclo normal iniciado da visita do paciente aos médicos. Nos tratamentos de longo prazo, os inibidores de Cox-2 são usados geralmente por pacientes que sofrem de problemas agudos de artrite. "O mercado vai se recuperar porque a inflamação precisa ser tratada", diz Valiño. "Quanto tempo vai demorar é difícil hoje saber." Por enquanto, o mercado tem olhado com desconfiança para as ações tanto da Merck como da Pfizer no mercado americano. Enquanto o índice que mede o desempenho das indústrias farmacêuticas evoluiu 0,27% desde a retirada do Vioxx do mercado, as ações da Pfizer caíram 4,6% e a das Merck, 41,8%. Os investidores parecem preocupados em saber o que os próximos estudos e pesquisas clínicas mostrarão sobre a segurança dos antiinflamatórios.