Título: Veterinária aponta controle deficiente
Autor: Marli Lima
Fonte: Valor Econômico, 20/10/2005, Agronegócios, p. B12

Somente a entrada no Mato Grosso do Sul de gado bovino vindo de uma área de risco pode ter causado o surto de aftosa em Eldorado e Japorã, considerando-se que os produtores vacinaram o gado, conforme afirmação feita por eles a fiscais sanitários. A conclusão é de Maristela Pituco, médica veterinária doutora em Virologia e responsável técnica pelo Laboratório de Viroses de Bovídeos do Instituto Biológico - vinculado à Secretaria de Agricultura de São Paulo e habilitado pelo Ministério da Agricultura para testes sorológicos de controle de febre aftosa. Maristela, que trabalha com aftosa há 20 anos, diz que o vírus sobrevive pouco tempo fora do animal e que seria impossível a doença surgir naturalmente. "Certamente houve movimentação de gado para que o vírus se manifestasse lá". Pela legislação, o gado vivo transportado de regiões com status sanitário diferente (de área não livre para livre, ou livre com vacinação para livre sem vacinação, por exemplo) deve ser submetido a teste sorológico no local de origem e ficar em quarentena por 15 dias. Se não for detectado vírus, o criador recebe uma guia de trânsito de animais (GTA) que é verificada no local da entrega, onde novamente o gado é submetido a testes e fica em outra quarentena de 15 dias. Maristela observa que, nas regiões infectadas, o vírus se dissemina pelo ar, água, solo contaminado, secreções e excrementos do boi. "É um vírus altamente contagioso". O período de incubação no gado é de três ou quatro dias. O ser humano não adquire a doença, mas pode portar o vírus por até três dias. No gado, diz a pesquisadora, a doença não é mortal e, após 20 dias, o animal se recupera. "O problema é que o boi, mesmo após a cura, fica portador do vírus por até dois anos. Por isso a OIE recomenda o abate para países que querem obter o status de livres do vírus". Para Maristela, o fato de novos focos terem sido identificados dentro da região delimitada - a partir do primeiro caso de Eldorado - como de risco indica que a doença está sob controle. Ela observa, porém, que na Europa os cuidados para evitar a disseminação são mais rígidos. Os fiscais que inspecionam o gado, por exemplo, não visitam outra fazenda antes de três dias, para evitar uma possível disseminação. "No Brasil, esse tipo de cuidado não existe". Por conta do surto de aftosa, o Mato Grosso do Sul está proibido de enviar animais vivos para outras regiões, mas segue liberado o trânsito de carne maturada e desossada - que, segundo a pesquisadora, não contêm vírus. Outros Estados livres da doença estudam tornar obrigatórios os exames sorológicos e a quarentena no trânsito de animais dentro da área livre com vacinação. Pelas regras da OIE, o Mato Grosso do Sul deve abater os animais que estão no foco de emergência e submeter a região a um vazio sanitário de 30 dias. Se nesse período não surgirem novos focos em regiões próximas, são colocados animais sentinelas - geralmente bezerros - por 30 a 40 dias. E se esses animais não apresentarem o vírus, o local é repovoado. Os animais suscetíveis à aftosa são os que possuem dois dedos e casco - bovinos, suínos, ovinos e caprinos. Os principais sintomas são febre, salivação intensa, vesículas (aftas) na língua, gengiva, espaços entre os dedos e mamas, perda de peso e de produção de leite. Existem sete tipos de vírus da aftosa (O, A, C, SAT 1, SAT 2, SAT 3 e Asia 1), sendo que apenas os tipos O, A e C foram encontrados no Brasil. As vacinas produzidas no país oferecem proteção aos três tipos e têm duração de até um ano. Por isso, alguns Estados realizam duas vacinações por ano e outros, uma. A vacina deve ficar em local refrigerado e o animal precisa receber a dose completa (5 mililitros).