Título: Nova proposta européia ainda deve ser insuficiente
Autor: Assis Moreira
Fonte: Valor Econômico, 24/10/2005, Brasil, p. A3

A União Européia (UE) sinalizou ao Brasil e outros exportadores que uma nova oferta para cortar as tarifas de importação agrícola, esta semana, será bem inferior às exigências dos parceiros para desbloquear a Rodada Doha. "A UE já disse claramente que um movimento de sua parte não será suficiente", afirmou Luiz Carmona, do Ministério da Agricultura do Brasil. "Não vejo como pode se esperar acordo agrícola nessas condições", acrescentou. O G-20, liderado pelo Brasil, e o Grupo de Cairns, de 17 exportadores agrícolas incluindo o Mercosul, cobram de Bruxelas o dobro do corte de tarifas que foi proposto, de 24%, em média. "Uma redução média de 54% é a base", disse o embaixador brasileiro junto à Organização Mundial do Comércio (OMC), Clodoaldo Hugueney. A questão de acesso ao mercado é a mais difícil na negociação agrícola - e não apenas para a UE. A Suíça, com tarifa de 700% na importação de carnes, não quer nem ouvir falar de alíquota máxima de 100% no comércio agrícola mundial, que a UE já aceitou. Sob intensa pressão, Peter Mandelson, comissário europeu de comércio, não cessa de lamentar que a França tenha "tirado o tapete" de seus pés. Mas considera que ainda tem margem de manobra para colocar na mesa "uma oferta final". Ele ressalvou que só tomará a decisão após avaliar o apoio dos outros 24 países-membros da UE, em reação a feroz oposição francesa. Enquanto negociadores dizem que a rodada está "ameaçada", o agronegócio brasileiro pede ao governo para pressionar por concessões até o fim, em Hong Kong, em dezembro. Antonio Donizete, representante da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), avalia que a negociação agrícola está numa situação bem melhor do que em Cancun, há dois anos, quando EUA e UE tinham propostas contra interesses dos países em desenvolvimento. Hoje, os países estão próximos de acordos sobre data para eliminar subsídios à exportação e sobre o tamanho do corte nas subvenções domésticas. "Se a UE conseguir flexibilizar em acesso ao mercado, pode salvar a rodada", diz Donizete. "A conclusão de Doha nos interessa, porque senão vão proliferar acordos bilaterais, onde o Brasil não tem tido sucesso". Um importante negociador do G-20 conta que dentro desse grupo a briga também foi feroz para aprovar uma proposta há duas semanas. Em certo momento, diante da forte resistência da Índia por amplos cortes, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, avisou que naquela circunstância o Brasil passaria a coordenação a qualquer outro país, porque não era possível negociar. Os indianos se acalmaram, mas sua oposição à liberalização agrícola foi retomada pela Venezuela.