Título: Oferta de vinho cresce e abarrota estoques
Autor: Sérgio Bueno
Fonte: Valor Econômico, 24/10/2005, Especial, p. A14

Vitivinicultura Sobram produtos finos nacionais e o câmbio continua a favorecer as vendas de importados

O forte crescimento da produção de vinhos finos no país por conta da expansão das duas últimas safras de uvas viníferas, associado à progressiva retração das vendas do produto nacional no mercado doméstico entre 1999 e 2004, está abarrotando os estoques das vinícolas brasileiras. Segundo Carlos Paviani, presidente do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), no fim de agosto, o volume estocado chegava a 72,6 milhões de litros, o equivalente a três anos e meio de vendas - quase o dobro do prazo considerado ideal. Para a qualidade dos vinhos tintos, repousar por dois a três anos nas garrafas ou em barris de carvalho antes de ir ao mercado é até um bom negócio, mas para o caixa das empresas os níveis atuais de estoques já começam a se transformar em um problema. Conforme Paviani, o produto acumulado, sem impostos, vale pelo menos R$ 350 milhões, que precisam ser financiados com o capital de giro das vinícolas. "A situação põe todo o setor em risco", incluindo 16 mil pequenos produtores gaúchos de uvas que abastecem as indústrias, afirma Hermes Zanetti, presidente da Câmara Brasileira do Vinho e da Cooperativa Vinícola Aurora, que sozinha carrega um estoque de 12 milhões de litros de vinhos finos. Segundo Zanetti, as empresas brasileiras são prejudicadas pelo câmbio, pela excessiva facilidade de importação, pelo contrabando e falsificação de produtos e por uma carga tributária "criminosa" que chega a 53% do preço final dos produtos. Na Argentina, afirma, o peso dos impostos é de 22%. Com tudo isso, mesmo sendo insuficientes para suprir o mercado doméstico, os vinhos finos brasileiros estão perdendo a batalha contra os importados, que aumentaram sua participação de 41,7% da demanda de 63,3 milhões de litros, em 1999, para 64,6% dos 55,8 milhões de litros consumidos no ano passado. Com o real apreciado em relação ao dólar - e as vantagens tributárias na origem -, produtos de boa qualidade de Chile e Argentina, que respondem por 38% das importações brasileiras, podem ser encontrados em supermercados brasileiros por entre R$ 15 e R$ 20 a garrafa, mais baratos que muitos nacionais de nível similar, encontrados até por R$ 30. Nos oito primeiros meses de 2005, a situação dos vinhos brasileiros na disputa com produtos de fora melhorou um pouco. A fatia dos importados diminuiu para 61%, enquanto o consumo total no país aumentou 3,6% em relação ao mesmo período do ano passado, para 33,7 milhões de litros. Com isso, as vendas dos produtos nacionais deram um salto de 18,2% sobre o intervalo de janeiro a agosto de 2004 e alcançaram 13,1 milhões de litros. Segundo o presidente da União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra), Danilo Cavagni, esta melhora reflete um acordo firmado no fim de maio com vinícolas argentinas. Na época, ficou definido que o vizinho deixaria de exportar para o Brasil vinhos com preços inferiores a US$ 8 a caixa de 9 litros. Até então, afirma ele, entravam no país produtos de até US$ 4,25, que apesar da qualidade mais baixa, tinham apelo de preço e origem. O acerto deverá valer até o fim deste ano, quando as duas partes farão uma avaliação dos resultados. Até agosto passado, a importação de vinhos argentinos praticamente se estabilizou. Foram 6,2 milhões de litros, 2,5% mais do que no mesmo período de 2004, depois de ter pulado de 5,7 milhões de litros, em 2003, para 10,2 milhões no ano passado. "A questão é que estamos brigando por um mercado que é muito pequeno", explica Cavagni. Por causa disso e do fato de que as exportações brasileiras ainda engatinham (foram menos de 178 mil litros de janeiro a julho deste ano), as indústrias brasileiras trabalham com escalas de sete a oito vezes menores do que as argentinas e três vezes inferiores às das chilenas, informa o presidente da Uvibra. Assim, analisa, o custo fixo pesa mais e a competitividade cai.