Título: Afastamento de Azeredo da presidência do PSDB eleva tensão com o Planalto
Autor: Maria Lúcia Delgado
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2005, Política, p. A7

Na briga explícita e tensa pelo jogo sucessório de 2006, a cúpula do PSDB conseguiu negociar ontem o afastamento do senador Eduardo Azeredo (MG) da presidência da legenda, começou a recolher assinaturas para a CPI do Caixa 2 no Senado - que, se vingar, será um desdobramento da CPI dos Correios - e comunicou ao Palácio do Planalto, pelo ministro de Relações Institucionais, Jaques Wagner, que não terá boa vontade com o PT nem com votações de interesse do governo no Congresso. Eduardo Azeredo tomou a decisão de se afastar da presidência após reunião ontem ao final da manhã com os senadores Tasso Jereissati (CE), Arthur Virgílio (AM) e Sérgio Guerra (PE). Os dirigentes do partido concluíram que o episódio de caixa 2 em Minas, ao qual o nome de Azeredo foi envolvido, fragiliza o discurso da oposição contra o PT, e tentaram reverter o jogo com a tese de que não há comparação entre o episódio mineiro e o atual esquema de corrupção investigado. O prefeito de São Paulo, José Serra, volta à presidência do partido, da qual estava licenciado. Serra permanece no posto até 18 de novembro, data da convenção partidária, em que Tasso Jereissati assumirá a presidência da legenda. Um dirigente do PSDB definiu como será a curta gestão de Serra: "Ele assume, mas não atua". A ordem é evitar que recaia sobre o prefeito qualquer ônus político em função do envolvimento de tucanos em caixa 2 de campanhas. Em uníssono, os tucanos alegam que o "ataque planejado" do PT contra Azeredo tem o objetivo de desviar os focos centrais de apuração da CPI dos Correios, que são tráfico de influência, corrupção em estatais, lavagem de dinheiro, superfaturamento em contratos e desvio do dinheiro público. "Quem apedrejou o senador Eduardo Azeredo deveria estar pedindo neste momento o impeachment do Lula", comparou Tasso. "Sinto-me sendo usado como instrumento de uma grande farsa, quando tentam desviar a atenção da população brasileira dos escândalos envolvendo o governo e o PT. Não permitirei que usem o meu nome para encobrir a corrupção do governo. Escolheram a mim como alvo por estar exercendo a presidência do PSDB", disse Azeredo em discurso na tribuna ontem à noite. Segundo Azeredo, ele é alvo por "ser o contraponto a lideranças e parlamentares aliados do governo envolvidos na escabrosa e nunca vista prática de compra de votos". O discurso do tucano pode facilmente ser apropriado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e petistas. "Eu não tinha conhecimento de todo o que ocorria na administração de minha campanha", afirmou Azeredo. "Se alguma falha cometi, foi exatamente de tudo não saber". O tucano comparou os gastos de sua campanha à reeleição em 98 (R$ 8,5 milhões) com a declaração de gastos da campanha de Lula à Presidência, de apenas R$ 3 milhões. Os tucanos tentam estabelecer diferenças. "A verdade é que querem reduzir tudo a caixa 2. O PT levou para esse lado. Então é como se PC Farias fosse caso de caixa 2", enfatizou Tasso. Segundo o cearense, Azeredo é cortina de fumaça para o governo. "Querem encobrir um sistema de corrupção amplíssimo", afirmou. Os tucanos alegaram que todas as denúncias de caixa 2, inclusive as que envolvem Azeredo, devem ser investigadas nessa nova CPI. Jaques Wagner telefonou para Azeredo na tentativa de minimizar o clima de tensão entre petistas e tucanos no Congresso. O telefonema ocorreu no momento em que os tucanos estavam reunidos. O ministro disse que o PT não tinha nada contra o mineiro e que não trabalhava para o desgaste dele. O líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), pegou o telefone. Wagner continuou o discurso pacífico e moderado, e chegou a dizer que os dois partidos, PT e PSDB, "são primos". "Sim, são primos. Como os árabes e israelenses. E primos podem guerrear", avisou o líder tucano. Azeredo chegou indeciso em Brasília. Conversou por telefone com todos os principais dirigentes do partido, inclusive José Serra. Todos disseram a Azeredo que a decisão seria pessoal, mas o mineiro entendeu o recado e decidiu se afastar. O discurso, marcado para as 16h, só ocorreu após às 21h, por conta do acalorado debate entre senadores devido à cassação do registro e da posse de João Capiberibe (PSB-AP). O dia já começou tenso em Brasília. O estado de espírito dos tucanos era de guerra. A proposta do PSDB de criar uma CPI do Caixa 2 não dá sinais de que irá prosperar, apesar de no fim do dia já terem sido recolhidas 30 assinaturas, segundo Virgílio. "É um erro. Vão realimentar de novo a discussão da igualdade, de que o PSDB e a oposição são iguais ao PT. Perderam a visão sistêmica da crise", disse uma liderança do PFL. Os senadores pefelistas analisam hoje o cenário com o PSDB. O objetivo central do PSDB é investigar as campanhas eleitorais petistas e desgastar figuras petistas relevantes no cenário nacional, como o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). O empresário Marcos Valério, principal elo do setor privado com políticos do PT e outros partidos para esquema de caixa 2 e investigado pela CPI dos Correios, citou campanhas em que suas agências de publicidade atuaram em São Paulo, Minas, Santa Catarina, Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro. "Vamos investigar tudo", sugeriu Virgílio. Na reunião com correligionários, Azeredo deu detalhes do que ocorreu na campanha. Explicou que o tesoureiro da campanha, Cláudio Mourão, recorreu à Justiça para cobrar dívida de R$ 700 mil, para compra de carros. Alega que não sabia da dívida em 1998. Valério fez um depósito na conta de Mourão, em 2002. Oito dias depois, o empresário foi reembolsado em R$ 511 mil pelo PSDB, por empréstimo feito no Rural, em que Azeredo e o ministro Walfrido Mares Guia foram avalistas. Os outros R$ 200 mil restantes, segundo Azeredo, foram arrecadados entre amigos.