Título: Emissoras vão propor padrão de TV digital ao governo em novembro
Autor: Eliane Sobral e Talita Moreira
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2005, Empresas &, p. B4
Mídia Expectativa é que haja apenas transmissões experimentais no Mundial da Alemanha
As emissoras de televisão aberta costuram um acordo para tentar influir diretamente no processo de escolha do padrão de TV digital que será adotado no país e encerrar, dessa forma, um debate que se arrasta há anos no governo. A expectativa das empresas é de chegar a um consenso numa reunião que será realizada em novembro e, em seguida, levar ao governo a proposta do setor. A decisão de buscar um entendimento foi tomada pelas emissoras na segunda metade deste ano. "Esse processo está demorando demais", afirma o presidente da Associação das Emissoras de Rádio e Televisão do Estado de São Paulo (Aesp), Edilberto de Paula Ribeiro. "Além disso, o governo não pode querer interferir nesse tipo de ação", diz. Com essa iniciativa, as TVs querem acelerar o processo de escolha e garantir que a tecnologia seja definida até o fim deste ano e possa começar a ser implementada na primeira metade de 2006. Anteontem, em Florianópolis (SC), o ministro das Comunicações, Hélio Costa reiterou que o objetivo do governo é definir o padrão até fevereiro e fazer "os primeiros testes" durante a Copa do Mundo. Inicialmente, a expectativa era de que o Brasil assistisse ao próximo mundial pela TV digital. Mas com a demora na definição do modelo essa possibilidade está descartada. "Estamos nos preparando para aproveitar a Copa e fazer o lançamento do novo padrão em caracter experimental. Para a transmissão comercial, não dá mais tempo", diz o diretor de tecnologia da TV Globo, Fernando Bittencourt. Para Roberto Franco, diretor de tecnologia do SBT, a transmissão no novo padrão no Brasil, em escala comercial, só será possível dentro de um ano ou um ano e meio. "É o período necessário para a importação dos equipamentos e para a adaptação da própria indústria de aparelhos", afirma. "As emissoras estão com quase tudo pronto em termos de produção, mas sem o padrão definido não podemos avançar muito", diz Franco. Segundo ele, testes já estão sendo realizados por meio de um canal piloto com algo entre dois e três mil receptores-pilotos instalados em São Paulo (ver matéria ao lado). De acordo com Ribeiro, da Aesp, as TVs descartaram o padrão europeu e, aparentemente, há uma preferência pela tecnologia japonesa, o ISDB, que é mais ágil e oferece mais mobilidade - capacidade de transmissão a diversos dispositivos na mesma faixa de freqüência. Bittencourt, da Globo, diz que o padrão japonês é o mais adequado para atender as aplicações que as emissoras pretendem adotar. "Queremos transmitir em alta definição para receptores fixos, móveis e portáteis em canal de 6 Mega Hertz o que só é possível na modulação no sistema japonês", explica ele. No entanto, o assessor da Casa Civil, André Barbosa - que integra o grupo de trabalho do governo para a TV digital - afirma que a tecnologia européia ainda não está fora de discussão. Segundo ele, o padrão japonês, embora permita a mobilidade, só serve para TVs de alta definição (HDTV, na sigla em inglês). "Isso criaria um produto só para a elite e tiraria a possibilidade de universalizar o serviço", destaca. Barbosa aponta duas vantagens do DVB, o padrão europeu: dispensa o pagamento de royalties, já que é uma solução aberta, e tem um sistema paralelo que permite a transmissão de TV (broadcasting) nos celulares. De acordo com o assessor o governo ainda não fechou questão. Pode optar pelo sistema japonês, pelo europeu ou ainda por um híbrido - dependendo do resultado das pesquisas sobre o assunto que estão sendo conduzidas por universidades brasileiras. Em dezembro, os pesquisadores terão de entregar um relatório final ao Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD). "O governo está fazendo o estudo deles e nós, o nosso. Se coincidirem, ótimo. Senão, vamos ver se a pesquisa do governo apontou alguma coisa que a nossa não apontou e por quê", diz Ribeiro. O presidente do Grupo Bandeirantes de Comunicação, Johnny Saad, no entanto, acredita que o debate entre governo e iniciativa privada em torno da questão esteja mais produtivo. "Até a chegada de Hélio Costa ao ministério das Comunicações, as emissoras estavam totalmente alijadas do processo que vinha sendo conduzido por pessoas estranhas à radiodifusão e com forte influência ideológica, inclusive com gastos de muitos milhões de reais, até hoje ainda não explicados", diz o presidente da Band. A discussão - política e técnica - sobre o padrão de TV digital que será utilizado pelas redes abertas no Brasil arrasta-se desde o governo de Fernando Henrique Cardoso. Quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiu o poder, em 2003, resolveu apostar no desenvolvimento de um sistema verde-amarelo, mesmo debaixo de críticas. No ano passado, o governo já havia sinalizado uma mudança de postura, que ficou ainda mais evidente depois que Costa chegou ao ministério. "Podemos até ter condições técnicas. Mas como vamos fazer um padrão com R$ 80 milhões?", questionou o ministro, em julho passado.