Título: Iniciativa privada quer fim das incertezas
Autor: Fernando Lopes, Cibelle Bouças e Conrado Loiola
Fonte: Valor Econômico, 26/10/2005, Agronegóciois, p. B12

Crise sanitária Exportadores pressionam por definições sobre suspeitas de aftosa no PR e eventuais casos em SP

A demora do governo federal em confirmar ou negar as suspeitas de focos de febre aftosa no Paraná, aliada às "suspeitas de suspeitas" investigadas em São Paulo e à confusão no trânsito de produtos entre Estados brasileiros, começa a transformar a dor de cabeça dos exportadores de carne bovina em enxaqueca. Em virtude do ressurgimento da doença no Mato Grosso do Sul, grandes frigoríficos já adequaram seus mapas de abate de animais e de capacidades de unidades para contornar o problema no Estado, mas a eventual presença do vírus em territórios paranaense ou paulista certamente vão exigir novos ajustes. "O setor privado quer o fim das incertezas para conseguir se planejar", reclamou um exportador. "Com essas definições, e partindo do princípio de que a aftosa não está em São Paulo, poderemos inclusive pressionar pela reabertura da União Européia às exportações paulistas de carne bovina" observou outro. São Paulo responde por quase 60% das exportações brasileiras de carne bovina in natura, e a UE absorve mais de 20% dos embarques totais do produto do país. De janeiro a setembro, as vendas externas de carne bovina brasileira (in natura e industrializada) somaram 1,876 milhão de toneladas e renderam US$ 2,444 bilhões - altas de 29,26% e 29,82% sobre o mesmo período de 2004. Por conta da aftosa no Mato Grosso do Sul, o Bertin, segundo maior frigorífico exportador de carne bovina, já reduziu em 50% os abates nas plantas de Naviraí (MS) e Lins (SP) e redirecionou parte da produção para suas outras fábricas localizadas em Mozarlândia (GO), Ituiutaba (MG), Votuporanga (SP), Itapetininga (BA) e Marabá (PA). A empresa aguarda o desenrolar da crise para avaliar se voltará a mexer as peças de seu tabuleiro, e confirmou que uma carga que enviou à UE antes da confirmação do primeiro foco sul-mato-grossense, está retornando ao porto de Santos (SP). Sem citar nome de empresas, o despachante aduaneiro Luiz Sérgio Mantovani, de Santos, informou que há dois contêineres embarcados antes do embargo da UE voltando de Roterdã (Holanda), cada um com 50 toneladas de carne.

Barreiras à carne brasileira em diversos mercados reduziram o movimento de cargas no porto de Santos

Para a União Européia, que fechou as fronteiras para São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul (casos também de Moçambique e Noruega), as exportações de carne bovina via Santos estão paradas. O mesmo acontece com as cargas destinadas para países da América do Sul que proibiram a carne de todo o Brasil, como o Chile, e para a Argentina, que ontem estendeu suas barreiras para São Paulo e os Estados do Sul. Mas os embarques para destinos que não embargaram as vendas paulistas ou brasileiras seguem normalmente. Carne industrializada para os EUA, por exemplo, também. Especialistas ressalvam que o movimento com carne bovina em Santos vem caindo desde agosto, em razão do câmbio e da entressafra no mercado de boi. Segundo a Secex, a média das exportações diárias de carne bovina de todo o país caiu de 5,5 mil toneladas, em agosto, para 4,5 mil toneladas em setembro. Mas, já por conta também da crise, o valor dos embarques somou US$ 32 milhões na terceira semana de outubro, ante US$ 46,2 milhões na primeira semana do mês. Conforme fontes de terminais que operam em Santos, antes das suspeitas no Paraná os frigoríficos sinalizavam uma melhora para novembro, mas agora não há mais perspectivas de forte retomada nos próximos meses. Eduardo Assunção, diretor comercial da Localfrio, instalada no porto paulista, afirma que o único frigorífico que vinha mantendo o volume no terminal era o Friboi, mas que é difícil dimensionar a redução de cargas em geral. Pelo terminal da Santos Brasil, as exportações de carnes, anteriormente em 3 mil contêineres por mês (20 toneladas cada), estão hoje zeradas.

Friboi já pode usar mais sua operação argentina com a crise no Brasil, e está de olho em outra planta no país vizinho

Desde a eclosão da crise, no dia 10, o Friboi, que tem unidade em Campo Grande (MS), informou que passaria a produzir carne in natura na unidade apenas para o mercado local. Outras três plantas paulistas (Andradina, Presidente Epitácio e Barretos), continuam atendendo ao mercado interno e produzindo carne industrializada para exportação - embargada apenas pela Indonésia. Segundo a empresa, principal exportadora de carne bovina do país, seus embarques de carne in natura estão sendo alimentadas por unidades em Goiás, Mato Grosso, Minas e Rondônia. O Friboi informou que tem condições de comercializar carne produzida em duas plantas na Argentina após a aquisição do Swift Armour Argentina, que em 2004 exportou o equivalente a US$ 132 milhões. O Friboi exportou em 2004 US$ 520 milhões. O grupo também confirmou que pretende apresentar proposta de arrendamento de uma unidade do frigorífico argentino Cepa, no processo de licitação que será promovido pela Justiça do vizinho. O frigorífico Minerva, também um dos maiores do país no ramo, deu férias coletivas de 15 dias na unidade de José Bonifácio (SP), que abate de 800 a 850 cabeças por dia, e está compensando o abate na planta de Palmeiras de Goiás (GO), para mil cabeças, segundo o presidente Edivar Queiroz. Fábio Dias, diretor do Marfrig, disse que a unidade de Bataguassu (MS), que abate 900 cabeças/dia, ficou paralisada por uma semana e voltou a operar no dia 16. E o abate total de 1,1 mil cabeças/dia nas unidades de Tangará da Serra (MT), Paranatinga (MT) e Promissão (SP) se mantêm estáveis. "É cedo para definir como ficará o nível dos abates. É preciso esperar a confirmação desses focos no Paraná". (Colaborou José Rodrigues, de Santos)