Título: Revolução pacífica dentro das escolas
Autor: Paulo Saab
Fonte: Valor Econômico, 21/10/2005, Valor Especial / EMPRESA & COMUNIDADE, p. F1

"A população jovem é a que tem mais capital social para promover as mudanças necessárias ao país."

Educação para a cidadania. Cada vez mais a sociedade se dá conta de que esta é uma condição para se promover uma efetiva transformação social, onde cidadãos mais conscientes podem contribuir de forma participativa e direta nos rumos do país. Ainda que seja o caminho mais longo, é indubitável que a educação é a única via para se realizar essa reforma pacífica e de desenvolvimento através da cidadania. Tal compreensão avança em todo o Brasil e, inclusive, na América Latina. E o avanço ocorre exatamente no berço onde tais idéias devem ser desenvolvidas: as escolas. E junto à parcela da população que tem mais capital social para promover essa mudança: os jovens. Com pouco alarde, estudantes do ensino médio vêm participando, diretamente, de centenas de projetos de cidadania em dezenas de municípios do Estado de São Paulo. É uma mobilização formidável que vem ocorrendo no setor educacional, com o envolvimento não só dos alunos, mas também dos professores, diretores, coordenadores e comunidades, com o apoio de organizações da sociedade civil de interesse público, do governo estadual e da iniciativa privada. Os educadores, especialmente, vêm desempenhando um papel fundamental nesse processo de discernimento, sensibilização, conhecimento e ação. É um processo de evolução da cidadania no país cujos resultados são visíveis junto às comunidades onde esses jovens vivem, e que, paulatinamente, ajuda a mudar a realidade brasileira, ainda que, para isso, faltem políticas públicas bem definidas e apoio político para a resolução dos problemas. Em países da América Latina como México e Colômbia o mesmo acontece. Em todos os casos, surpreende o nível de conscientização que toma conta dos jovens e seu interesse em atuar como cidadãos socialmente responsáveis. Há centenas de histórias exemplares coletadas ao longo dos cinco anos de existência do Prêmio Construindo a Nação. No município de Carapicuíba, dezenas de alunos e professores da Escola Estadual Padre Antônio Godinho mobilizaram a comunidade local em torno de ações para a melhoria de qualidade de vida da região. Realizaram campanhas de racionalização do consumo de água e luz, estimularam a doação de sangue, bem como a realização de atividades de conscientização e participação política por meio do voto. Na Escola Estadual Gabriel Ortiz, em São Paulo, os jovens engajaram-se em um projeto para promover a cidadania por meio da educação política. Já em Matão, cerca de 560 estudantes da Escola Estadual Professor Henrique Morato prestaram serviços às comunidades dos bairros da região, com a participação dos professores. Estes são apenas alguns exemplos entre mais de 620 mil alunos do nível médio, de escolas públicas e privadas, que participaram nos últimos cinco anos, juntamente com os seus professores, de ações em prol da educação política, do meio-ambiente, da capacitação de deficientes ou de trabalhos de cunho assistencial, entre outras, com resultados surpreendentes. O envolvimento de estudantes brasileiros em projetos que visam soluções práticas em benefício da coletividade, para o aprimoramento da educação e o aprendizado vivenciado na ação coletiva, traz um gigantesco grau de amadurecimento desses jovens - no momento de suas vidas em que suas personalidades e destinos estão sendo forjados. E leva a uma participação efetiva no encaminhamento das questões que afetam a vida do país, que se refletirá em pouco tempo em prol do próprio Brasil. Tais iniciativas possuem tanto mais importância quanto o nível de carência, pobreza e violência das regiões onde são realizadas. Na Colômbia, por exemplo, um país onde 60% da população local é formada por pessoas pobres, 40% vivem quase na miséria absoluta e onde o narcotráfico e o sexo livre são problemas de grande extensão, alunos de diversas escolas estão buscando diretamente soluções para alguns dos problemas que os afligem. Eles vêm se conscientizando, e às pessoas da população, por exemplo, sobre a necessidade de se realizar mobilizações em prol dos direitos humanos. Algumas dessas iniciativas desenvolvem-se no âmbito do Projeto Cidadão, que começou nos Estados Unidos, por iniciativa do Center of Civic Education, e hoje se estende a 35 países. São ações nas salas de aula onde os estudantes discutem questões relativas à comunidade e analisam soluções para um determinado problema a fim de levá-los às autoridades públicas e propor parcerias em busca de soluções. No México, por exemplo, os estudantes têm participado de debates sobre como escolher seus governantes. O interesse dos jovens em participar dos rumos políticos - não apenas por meio do voto - é cada vez mais evidente. Esse é um processo que permitirá formar uma nova geração de brasileiros, uma nova geração de lideranças, de mentalidades, comprometidas, através do conhecimento, da ação prática e da consciência lúcida, com a construção de um país mais justo e equilibrado.