Título: Jaguaribe quer aproximar Serra das propostas de Lessa
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 28/10/2005, Especial, p. A14

Ex-ministro da Ciência e Tecnologia do governo Collor, o sociólogo Hélio Jaguaribe pretende apresentar ao prefeito de São Paulo, José Serra (PSDB), um esboço de proposta de campanha presidencial para lançar o que chama de "neodesenvolvimentismo". Segundo Jaguaribe, que já foi integrante do diretório nacional tucano no começo dos anos 90, Serra é o único presidenciável que poderia promover uma guinada econômica no país. "Ele pode mudar esta política neoliberal. Tem capacidade e competência para isso. Se tem convicção que este modelo brasileiro impede o desenvolvimento, não sei", afirmou. A idéia chave de Jaguaribe é propor o abandono de metas macroeconômicas de inflação e de superávit primário anuais, substituindo por metas cíclicas. Um novo presidente teria assim, compromissos de obter um ajuste público no fim de seu quadriênio. "O ano eleitoral, que no Brasil é o ano da gastança, ficaria sendo assim o ano do ajuste", explicou. Para Jaguaribe, o Brasil vive atualmente "uma ditadura do mercado financeiro", em que os compromissos assumidos pela equipe econômica impedem a execução de qualquer outro projeto de desenvolvimento: "Precisaríamos crescer anualmente 6%, o que é impossível". O ex-ministro afirmou ter grande identidade de posições com o ex-presidente do BNDES, Carlos Lessa, que elabora um projeto contrário aos paradigmas da atual equipe econômica para o PMDB. O plano de Lessa, que prevê o controle de capitais, está sendo apresentado pelo pré-candidato a presidente pemedebista Anthony Garotinho. "É uma excelente proposta que está carecendo de um excelente candidato, e não um antigo locutor de rádio, para divulgá-la". A idéia de Jaguaribe era poder desenvolver um trabalho semelhante para Serra, caso o prefeito paulistano se interesse e seja de fato candidato a presidente da República. O ex-ministro desvincula a sua posição nacionalista da abertura ao capital internacional ocorrida nos dois mandatos do presidente Fernando Henrique Cardoso. "A voz do PSDB foi nula durante seus oito anos de governo. Lamentavelmente, Fernando Henrique deixou-se levar pelo corrente neoliberal mundial", disse. O ex-tucano afirmou que votou em Lula em 2002, apesar de sua ligação com Serra, por entender que o petista poderia romper com a linha econômica do antecessor. "O que vimos foi uma cópia carbono de Fernando Henrique", disse. No projeto de poder de Jaguaribe, a política externa de Lula seria mantida em sua linha estratégica, com diferenças táticas. "A orientação do Itamaraty é ideologicamente correta, mas operacionalmente ineficiente. A prova disso foram as seguidas derrotas brasileiras ao tentar eleger presidentes de organismos internacionais, sem uma articulação adequada com os países vizinhos, sobretudo a Argentina", disse. Jaguaribe sugere que uma prioridade para um próximo presidente seria o estabelecimento de um "eixo Brasil-Venezuela-Argentina" para agir em bloco no cenário internacional. O ex-ministro elogiou ainda a política assistencial de Lula. "O Bolsa Família é um acerto do ponto de vista social e um grande trunfo do ponto de vista política. Trará a Lula muito mais votos do que o das 10 milhões de famílias que serão beneficiadas até o fim de seu governo. O que era preciso era deixar de agir como se esta bolsa fosse uma solução de longo prazo para o problema da exclusão social", disse. Jaguaribe foi homenageado como um dos conferencistas especiais da reunião anual da Anpocs. Há 50 anos, Jaguaribe foi um dos criadores do Iseb, um dos primeiros "think thanks" brasileiros. Proferiu uma palestra com o título "O Atual Problema do Desenvolvimento Brasileiro". Discorreu também sobre outros temas e defendeu até a descriminalização das drogas. "O mundo perdeu esta batalha, da mesma forma que os Estados Unidos perderam a batalha contra a proibição do álcool nos anos 30". Jaguaribe propõe a realização de uma conferência internacional, que culminaria em um acordo para a liberação das drogas leves. (CF)