Título: Denúncia favorece estratégia da oposição
Autor: Raymundo Costa e Cristiane Agostine
Fonte: Valor Econômico, 31/10/2005, Política, p. A7

Crise Dificuldade de obter provas sobre financiamento cubano não impede que Lula dispute 2006 na defensiva

Uma conversa entre os presidentes do PSDB, José Serra, e do PFL, Jorge Bornhausen, deve definir hoje em São Paulo a estratégia da oposição em relação à denúncia de que o caixa de campanha do PT teria recebido, em 2002, uma remessa de US$ 3 milhões enviados de Cuba para ajudar na eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Tucanos e pefelistas voltaram a falar em impeachment de Lula, mas o objetivo das duas siglas, na realidade, é levar o presidente a disputar a reeleição, em 2006, sob a ameaça do impedimento, na defensiva e tendo de se explicar o tempo todo. A denúncia, publicada na última edição da revista "Veja", atinge o governo e o PT num momento em que ambos tentavam retomar a iniciativa política. A reportagem da revista diz que dois assessores da Prefeitura de Ribeirão Preto durante a gestão do atual ministro da Fazenda, Antonio Palocci, teriam confirmado a remessa dos dólares - Rogério Buratti e Vladimir Poleto, que teria transportado o dinheiro de Brasília a Campinas, em caixas de bebida. Nenhum dos dois viu os dólares, dizem que foram informados do conteúdo das caixas por outro assessor de Palocci à época, Ralf Barqueti, já morto. A própria oposição admite que será difícil provar a denúncia. "Faltam o recibo, que eles não deram, e o dinheiro, que eles gastaram", diz o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM). Mas crê também que será possível reunir informações que dêem credibilidade à acusação, "como comprovar se realmente houve o vôo do avião Seneca que teria transportado as caixas levadas por Vladimir Poleto", diz o líder tucano na Câmara, Alberto Goldman (SP). O prefeito de São Paulo e presidente do PSDB, José Serra, considerou a denúncia "verossímil". De imediato, a oposição vai requerer a convocação, pelas CPIs dos Bingos e dos Correios, de todos os envolvidos no suposto transporte do dinheiro de Brasília a Campinas. Arthur Virgílio pretende convidar às CPIs o antigo conselheiro político da embaixada de Cuba no Brasil, Sérgio Cervantes, que teria entregue as caixas de bebida. Na área jurídica, há mais de uma alternativa em análise, tanto que Bornhausen convocou os advogados do PFL para uma reunião hoje em São Paulo, para "avaliar o que pode e deve ser feito", disse. Na semana passada, PFL e PSDB já haviam decidido fazer uma representação no Ministério Público para que sejam investigadas as supostas irregularidades nas contas de campanha de Lula, como o pagamento do publicitário Duda Mendonça em uma conta no exterior. Essa representação deve ser apresentada. Outra opção é fazer a representação diretamente no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A denúncia sobre os dólares cubanos pode ser agregada a esta representação, mas os dois partidos avaliam a possibilidade de primeiro fazer os depoimentos nas CPIs, para depois recorrer às medidas judiciais. Tanto num caso como no outro é certo que um eventual pedido de impeachment do presidente levaria pelo menos um ano. É o que a oposição quer. Os partidos não podem fazer o pedido diretamente à Mesa da Câmara, só eleitores em pleno exercício de seus direitos políticos - no caso de Fernando Collor, os presidentes da OAB e da ABI assinaram o requerimento na condição de pessoas físicas. O presidente Lula não comentou a denúncia, mas o ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, classificou a reportagem de "fantasia". Membro da CPMI dos Correios, o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP) analisa como "frágil" a ligação apresentada pelos ex-auxiliares de Palocci. "Os fatos apresentados, caso sejam comprovados, são graves e exigem investigações rigorosas. Mas existe uma fragilidade em relação à sustentação dos fatos: as duas fontes ouvidas são contraditórias e não viram o dinheiro. Dizem que ouviram a história de uma pessoa que já morreu". Para Cardoso, Poleto e Buratti deveriam ser ouvidos antes pela Polícia Federal, "para evitar especulação política". "Se houver indícios, acho que tem que chamar todo mundo na CPMI", defende.