Título: Havana volta a ser nome de cachaça
Autor: Ivana Moreira
Fonte: Valor Econômico, 31/10/2005, Empresas &, p. B5

Bebidas Há quatro anos, Pernod Ricard, dona do rum Havana, reivindica na Justiça direito de propriedade da marca

Os fabricantes da cachaça Havana, uma das marcas mais famosas e caras de aguardente artesanal de Minas Gerais, recuperaram na Justiça o direito de comercializar a bebida com o rótulo original, criado em 1945. A cachaça, considerada uma das melhores do país, vinha sendo vendida sob a marca Anísio Santiago há quatro anos, desde que os mineiros perderam o direito de propriedade da marca para a Pernod Ricard. A multinacional francesa de bebidas registrou seu rum Havana Club no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) em 1989, mas só em 2001 conseguiu tirar do mercado a tradicional cachaça produzida em Salinas. Na semana passada, o juiz Evandro Cangussu Melo, da Justiça Estadual em Salinas, concedeu tutela antecipada da marca aos fabricantes da cachaça. A decisão garante a comercialização das garrafas com a marca Havana até o julgamento do processo administrativo que os advogados de Anísio Santiago, criador da bebida, instauraram contra a decisão do Inpi. Cabe recurso contra a decisão judicial de primeira instância. Procurada pelo Valor, Pernod Ricard não comentou o assunto. "A perda da marca causou queda de cerca de 40% na receita da cachaça", contou João Ramos, genro de Santiago que está hoje à frente dos negócios. "Com o resgate da marca Havana, nosso poder de comercialização será muito maior." Segundo os fabricantes, colecionadores de cachaça chegam a pagar até R$ 1 mil pela garrafa antiga com o rótulo Havana. No site de leilão Mercado Livre, uma garrafa de 1985, estava sendo leiloada por R$ 1 mil. A mesma aguardente engarrafada com a marca Anísio Santiago é encontrada no mercado com preços entre R$ 150,00 e R$ 200,00. Impetrado há quatro anos por Anísio Santiago, o processo administrativo no Inpi, pedindo a revisão da análise sobre o direito de uso da marca, ainda não foi julgado. "Só nos restou recorrer à Justiça", diz o advogado Cláudio Luiz Gonçalvez de Souza. A ação declaratória com pedido de tutela antecipada contra o Inpi e a Pernod Ricard foi impetrada no início do mês. O advogado alega que ninguém compraria uma cachaça pensando estar adquirindo rum, como argumenta a fabricante do Havana Club. E atesta que há um registro de Santiago, de 1967, no extinto Departamento Nacional de Propriedade Industrial (DNPI). Há, ainda, um registro de patente, de 1946, na também extinta Coletoria Federal em Salinas. O advogado levantou ainda registros da cachaça no Conselho Regional de Química, em 1963, e no Ministério da Agricultura, em 1980. "É evidente que a marca Cachaça Havana já era comercializada há várias décadas antes do registro de marca feito pela multinacional", diz o advogado, referindo-se à dona da marca, a Pernod Ricard. Mineiros influentes, como o vice-presidente José Alencar, tentaram interceder pela marca de Santiago junto ao INPI, apelando para o fato de que a cachaça é um símbolo da produção artesanal de aguardente no país. Deputados mineiros chegaram a promover uma audiência pública na Assembléia Legislativa, em Belo Horizonte, em defesa da manutenção da marca com o alambique de Salinas. Os apelos, no entanto, não surtiram efeito até agora. Os fabricantes da Havana informaram que já estão tomando as medidas para distribuir no mercado a garrafa com o rótulo original, embora ainda caiba recurso contra a decisão da Justiça de Salinas. "Foi uma primeira vitória", diz o advogado Souza. "Mas sabemos que será uma batalha judicial." Segundo ele, não está descartada a possibilidade de, no futuro, os fabricantes da cachaça mineira pedirem na Justiça indenização pelas perdas que tiveram depois de tirar a marca Havana do mercado. A produção artesanal da aguardente mineira, de acordo com Souza, está em torno de 15 mil litros por ano.