Título: Parceiros voltam a criticar lista de "sensíveis" da UE
Autor: Assis Moreira e Tatiana Bautzer
Fonte: Valor Econômico, 04/11/2005, Brasil, p. A2

Durou pouco, e foi dominada por cobranças contra a União Européia, a teleconferência, realizada no feriado de quarta-feira, entre cinco dos principais países negociadores da rodada de abertura comercial da Organização Mundial do Comércio (OMC). Os parceiros criticaram principalmente a insistência dos europeus em manter uma lista indefinida de "produtos sensíveis", mercadorias agrícolas que continuariam sujeitas a fortes barreiras comerciais. A imposição dessa lista e de outras "condicionalidades" tornam difícil avaliar o impacto, sobre o comércio mundial, da proposta feita na semana passada, pela União Européia, de corte próximo a 40% nos subsídios que distorcem o mercado internacional de produtos agrícolas, disseram os participantes da conferência ao comissário europeu para o comércio, Peter Mandelson. A conversa durou apenas 15 minutos, a pedido de Mandelson, que alegou ter outros compromissos já marcados. O ministro do Comércio da Austrália, Marc Veile, por motivo de doença, mandou um representante. Participaram o representante comercial dos Estados Unidos, Robert Portman, o ministro de Comércio da Índia, Kamal Nath, e o ministro brasileiro de Relações Exteriores, Celso Amorim. Mandelson insistiu que a proposta européia é a mais ambiciosa já apresentada pelos países do bloco em uma negociação comercial, e disse não ter condições de modificá-la para atender às demandas dos parceiros na OMC. Amorim repetiu o argumento, já manifestados publicamente, de que as condições impostas pelos europeus (como o compromisso de abertura dos países em desenvolvimento nos mercados de serviços e produtos industriais) "relativizam" os ganhos potenciais da proposta européia. Para o ministro brasileiro, a UE não pode, como está fazendo, oferecer redução de apenas 39% nas próprias tarifas agrícolas e exigir redução de 75% nas tarifas de importação de bens industriais nos países em desenvolvimento. Tanto Amorim como o ministro indiano insistiram na necessidade de se definir os "produtos sensíveis" que a UE quer excluir dos compromissos de liberalização firmados para os demais produtos. Nath e Amorim cobraram dos europeus tratamento diferenciado para os países em desenvolvimento. Mandelson indicou aos interlocutores que poderá dar mais detalhes da proposta européia no próximo encontro de negociadores, nos dias 7 e 8, em Genebra. O representante da Austrália fez questão de lembrar ao comissário europeu que, mesmo se aceita a proposta da UE, permaneceriam em vigor cerca de US$ 35 bilhões em subsídios agrícolas, capazes de distorcer as condições de mercado. Portman, por sua vez, lembrou a necessidade de se manter um "alto nível de ambição", jargão comum na discussão da OMC para expressar maior compromisso com a redução das barreiras ao comércio. Portman se diz otimista, por acreditar que, embora não seja possível obter todos os resultados desejados da atual rodada de negociações na OMC, é possível ter avanços significativos. Apesar de seu isolamento, com a pressão dos demais participantes concentrada nas exigências de avanços na redução das barreiras em agricultura, Mandelson, respaldado pela resistência protecionista de países europeus, como a França, insiste que não tem muita margem de manobra para levar a Hong Kong, e, na teleconferência, não se limitou a ficar na defensiva. Ele insistiu que países como o Brasil têm de apresentar contrapartidas, como as reduções de proteção dos mercados domésticos para serviços e produtos industriais. A insistência européia tem eco entre negociadores dos países desenvolvidos e já se incorporou ao discurso do diretor-geral da OMC, o francês Pascal Lamy (antecessor de Mandelson no comando da Comissão de Comércio da UE). No mesmo dia em que Brasil, EUA, UE, Austrália e Índia tentavam discutir meios de avançar para garantir o sucesso da reunião de Hong Kong, Lamy pedia "flexibilidade" e exortava países, como o Brasil, a pôr na mesa ofertas também nos setores demandados pelos europeus.