Título: CPI ameaça recorrer ao Supremo para ter acesso a sigilo em poder da Justiça
Autor: Cristiano Romero e Raymundo Costa
Fonte: Valor Econômico, 04/11/2005, Política, p. A6

Pressionada pelo tempo e pelo nítido esvaziamento dos depoimentos, a direção da CPI dos Correios culpa a falta de colaboração do governo, especialmente da Polícia Federal (PF) e da Secretaria da Receita Federal, pelo fato de até agora não ter dado uma resposta cabal sobre a origem do dinheiro do esquema que o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza montou para financiar o PT e partidos aliados. A CPI avalia recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para ter acesso a dados como os números da conta Dusseldorf, na qual o publicitário Duda Mendonça recebeu R$ 10 milhões de pagamento pela campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002. O governo conseguiu os dados dessa conta junto a autoridades americanas, mas não está autorizado a repassá-los à CPI. O presidente da CPI, senador Delcídio Amaral (PT-MS), diz que há uma falta de "sintonia" entre a comissão, a PF e a Receita, mas não descarta inteiramente a hipótese desses órgãos atuarem partidariamente. Por isso, já fala que a investigação pode se estender até março. Já o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP) reconhece as dificuldades, mas não acredita que sejam de natureza partidária: "Não é político. É administrativo e corporativo. Esses órgãos historicamente tiveram dificuldades para se comunicar entre si e com os outros". Delcídio e outros integrantes da CPI andam irritados com o comportamento do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Na sua avaliação, o ministro tem prejudicado os trabalhos da CPI ao dificultar o acesso da Comissão a informações que a PF vem levantando em suas investigações. Os parlamentares acreditam também que Bastos está atuando para tornar a investigação a mais morosa possível, de forma a impedir que a apuração ocorra dentro do prazo de funcionamento da CPI, que expira em pouco mais de um mês. O publicitário Duda Mendonça informou à CPI, no fim de agosto, que recebeu no exterior pagamentos de Marcos Valério, referentes a serviços prestados ao PT nas campanhas eleitorais de 2002. Ocorre que, apenas no início de outubro, o Departamento de Recuperação de Ativos Ilícitos (DRCI) do Ministério da Justiça solicitou informações sobre a movimentação financeira de Duda no exterior. Além disso, fez o pedido apenas em nome da PF e do Ministério Público Federal - a previsão era que os dados chegassem esta semana. A CPI considera essas informações cruciais. São elas que deverão revelar, segundo expectativa dos integrantes da Comissão, os verdadeiros financiadores do esquema de corrupção montado pelo PT para financiar campanhas eleitorais e comprar votos no Congresso. Criado pelo governo Lula, o DRCI é o órgão encarregado de negociar acordos internacionais que facilitem o acesso ao sigilo bancário de empresas e pessoas físicas brasileiras no exterior. O acordo fechado com os Estados Unidos é restritivo. Só permite o acesso de autoridades policiais e judiciárias às informações levantadas lá fora. O DRCI sustenta, por meio de sua assessoria de imprensa, que somente no dia 18 de outubro a CPI dos Correios solicitou formalmente o compartilhamento das informações bancárias de Duda Mendonça. Antes, no dia 5 do mês passado, Vanine Lima, coordenadora-geral do DRCI, teria solicitado verbalmente ao promotor do distrito de Nova York, Adam Kauffman, autorização para compartilhar as informações com a CPI. Na ocasião, o sub-relator da CPI, Gustavo Fruet (PSDB-PR), teria participado de teleconferência promovida pela cúpula do DRCI com Kauffman, com o objetivo de explicar a necessidade do acesso às informações. No dia 14 de outubro, o promotor negou o acesso e sugeriu que o pedido fosse feito diretamente ao Departamento de Justiça do governo americano. No dia 18, o senador Delcídio Amaral protocolou pedido formal das informações junto à Secretaria Nacional de Justiça, à qual o DRCI está vinculado. Seis dias depois, o Ministério da Justiça encaminhou o pedido ao Departamento de Justiça. Diante da falta de resposta, no último dia 28, o presidente da CPI decidiu fazer nova solicitação ao ministério de Márcio Thomaz Bastos. Dessa vez, pediu que sejam agendadas reuniões de integrantes da CPI com o promotor Kauffman em Nova York e, em Washington, com Mary Helen Wallow, chefe do Escritório de Negócios Internacionais da Divisão Criminal do Departamento de Justiça. Até o momento, segundo informa a assessoria de Thomaz Bastos, não houve resposta por parte dos americanos.