Título: Dinheiro do Noroeste é recuperado
Autor: Cristine Prestes
Fonte: Valor Econômico, 09/11/2004, Finanças, p. C-8

A fraude no banco Noroeste, descoberta em 1998 quando a instituição foi vendida ao Santander, é considerada a maior já encontrada no setor bancário do Brasil e um dos mais famosos casos de lavagem de dinheiro no mundo. Agora, o desvio de US$ 190 milhões do banco para fora do país pode entrar para a história por um outro motivo: mais da metade do dinheiro - mais precisamente US$ 102 milhões - já foi encontrado e recuperado ou bloqueado em uma operação que envolveu mais de 30 advogados no mundo e investigações em dezenas de países. O caso está sendo considerado um "leading case" na recuperação de ativos desviados ilegalmente do país e será contado hoje em São Paulo durante o seminário "Combate à Fraude, à Lavagem de Dinheiro e Recuperação de Ativos Ilícitos", organizado pela Secretaria de Estado da Justiça, Fundação Getúlio Vargas e o escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, que coordena a operação de resgate do dinheiro a serviço dos ex-controladores do banco - as famílias Cochrane e Simonsen. O caso do Noroeste ficou famoso pelo montante de recursos desviados - um total de US$ 242 milhões, a metade do patrimônio do banco - em uma época em que temas como lavagem de dinheiro ou fraude em operações contábeis ainda não faziam parte da rotina do setor empresarial. Soma-se a isso o fato de o desvio ter sido imputado ao ex-diretor do banco, Nelson Sakagushi, que, junto com uma equipe de subordinados, teria feito sumir a maior parte do dinheiro a partir de uma agência da instituição nas Ilhas Cayman. De 1995 a 1997, ele teria utilizado a agência do banco em Cayman - usada para captar dólares para as operações brasileiras que ficavam depositados em contas bancárias nos Estados Unidos - para fazer transferências ilegais de dinheiro. "Nosso trabalho foi descobrir o esquema de lavagem de dinheiro para recuperar os ativos", diz o advogado que coordenou a busca internacional dos recursos, Domingos Refinetti, do Machado, Meyer Advogados. Segundo ele, o dinheiro saía das Ilhas Cayman com destino a "lavadores" na Suíça, Reino Unido, Hong Kong e Cingapura e finalmente à Nigéria, onde dois nigerianos - que são acusados por Sakagushi de o terem enganado - recebiam os ativos desviados. Do total desviado do banco, de US$ 242 milhões, US$ 190 milhões foram remetidos para fora do país e são o alvo da busca dos ex-controladores, que acabaram recebendo a metade do valor de venda do banco ao Santander em função da fraude. O advogado partiu da auditoria realizada no Noroeste, que identificou a fraude, para garantir a documentação que serviria de base para a busca dos recursos desviados em outros países. Em 2000, de posse dos documentos, contratou advogados em outras jurisdições para pedir quebras de sigilo e buscas e apreensões. "O processo foi se auto-alimentando, é um grande quebra-cabeças", diz Refinetti. A operação, além de incluir advogados estrangeiros, contou com o trabalho de empresas de investigadores e programas de computador para processar as informações. O resultado até agora foi a recuperação de US$ 20 milhões, já gastos com honorários pelos ex-controladores do Noroeste, e o bloqueio de outros US$ 82 milhões, entre bens e dinheiro, em contas bancárias, na Suíça, Reino Unido, Estados Unidos e Nigéria. Além disso, Nelson Sakagushi teve a prisão preventiva decretada na Suíça, onde acabou sendo condenado e cumpriu pena de 25 meses de prisão por crime de lavagem de dinheiro. Os ex-controladores do Noroeste estão ainda acionando judicialmente os bancos City e Lloyds na Suíça por terem infringido a lei bancária ao deixar que quantias elevadas de dinheiro entrassem em suas contas - abertas por hindus de nacionalidade britânica, residentes na Nigéria e com negócios em Hong Kong - e lá permanecessem por apenas três meses, sem que o Banco Central do país tivesse sido comunicado. O advogado de Nelson Sakagushi, Alfredo das Neves Filho, afirma que o processo penal contra o ex-diretor do Noroeste ainda está tramitando na primeira instância da Justiça Federal de São Paulo. Inicialmente, havia sido distribuído para o juiz João Carlos da Rocha Mattos, acusado de suposta prática de venda de sentenças judiciais e preso pela Polícia Federal depois das investigações da Operação Anaconda. Agora está parado. "Ele já pagou pelo crime na Suíça, não pode ser apenado duas vezes pelo mesmo crime", diz o advogado.